Título: CSS é o primeiro teste de governismo de Marina
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 16/06/2008, Política, p. A8

A volta de Marina Silva (PT-AC) ao Senado, após mais de cinco anos no Ministério do Meio Ambiente, muda a composição política da bancada petista na Casa e fortalece uma ala mais independente. Isso deve exigir do Palácio do Planalto mais diálogo com setores do PT, na busca de apoio a propostas legislativas polêmicas que sejam do seu interesse. Para sorte do governo, a previsão é de pauta fraca no Congresso por causa do período eleitoral, além da recriação da Contribuição Social para a Saúde (CSS). Essa proposta divide os senadores petistas e será discutida pela bancada amanhã.

A ex-ministra não pretende ser rebelde em relação ao governo, embora tenha afirmado no discurso de estréia, em 4 de junho, que deixou o cargo por ter perdido o "acolhimento" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na questão ambiental. Mas Marina demonstra que não exercerá o mandato com alinhamento automático, sem questionamentos de mérito e sem se posicionar. "Descobri que a melhor forma de ajudar os governos não é simplesmente fazendo política de governo, mas fazendo política de país", avisou no mesmo discurso.

O suplente de Marina, Sibá Machado (PT-AC), que ocupou a vaga nesses cinco anos, seguia fielmente as orientações da líder Ideli Salvatti (PT-SC), afinadíssima com o Planalto. Durante os processos por quebra de decoro parlamentar contra o então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) - aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - Sibá foi designado pelo partido para a função estratégica de presidente do Conselho de Ética da Casa, responsável pela condução da investigação.

Ele acabou não resistindo às pressões e renunciou. A saída de Sibá representou uma baixa na tropa governista preparada para atuar, por exemplo, em Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). Sem Sibá, o grupo que costuma votar com o governo sem dar muito trabalho caiu para cinco (incluindo a líder), numa bancada de 12 senadores. São eles: João Pedro (AM), Fátima Cleide (RO), Serys Slhessarenko (MT) e Augusto Botelho (RR), além da própria Ideli. Desses, apenas a líder tem interlocução direta - e freqüente - com Lula.

Na bancada, há um grupo que costuma contrariar interesses do governo ou apenas causar constrangimentos ao Planalto, como Eduardo Suplicy (SP), Paulo Paim (RS) e Flávio Arns (PR). Os quatro restantes - Marina, Aloízio Mercadante (SP), Tião Viana (AC) e Delcídio Amaral (MS) - têm canais diretos com o Planalto, não estando sujeitos à intermediação da líder. "Pela capacidade de formulação política e credibilidade de Marina, a bancada cresce com ela e, evidentemente, vai exigir diálogo mais freqüente com o Planalto", afirmou Delcídio. Ele destaca que a ex-ministra é "agregadora".

Marina está em no segundo mandato de senadora. Do primeiro (1995 a 2002), ficou a amizade com Suplicy, um dos senadores que costumam colocar suas convicções pessoais à frente dos interesses do governo, segundo colegas. O retorno de Marina tira Suplicy de um quase isolamento na bancada.

Suplicy admite total entrosamento com Marina, mas nega o "sentido de competição" da volta da amiga ao Senado. "Ela é figura de primeira grandeza no partido, do qual foi uma das fundadoras. Tenho muita afinidade com ela. Mas meu espírito é de cooperar com Ideli e todos da bancada", disse.

Amanhã, a ex-ministra participa da primeira reunião da bancada. O principal assunto a ser discutido é o projeto de lei complementar que cria CSS. Os 12 senadores foram convocados pela líder, numa tentativa de retomar as reuniões semanais que estavam esvaziadas. Delcídio, Tião, Arns e Paim têm resistências à aprovação, que representa a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Suplicy anunciou que votará a favor. Marina não decidiu e diz que precisa estudar o assunto. Quando a CPMF foi criada, em 1996, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, ela votou a favor, contra a posição majoritária do PT à época, principalmente na Câmara dos Deputados.

Diferentemente de Ideli, belicosa na defesa dos interesses do governo, Marina adota discurso conciliador com a oposição. Amanhã, ela se reúne com a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), ruralista, indicada relatora setorial para o Meio Ambiente na proposta orçamentária de 2009. Depois de alfinetadas mútuas, por divergências em relação à política ambiental, Kátia propôs a reunião, em busca de orientação na relatoria.

Ideli avalia a chegada de Marina ao Senado como positiva, principalmente pela experiência acumulada no governo e pela relevância de seu papel político. "Ela vem para a briga. Eu estou muito feliz, porque é mais gente para riscar a faca", disse a líder. Perguntada se a presença de Marina não reduz sua força na bancada, Ideli suspira e responde que "ninguém segue à risca" as orientações da liderança.