Título: EUA admitem possibilidade de negociar tarifas de importação
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 02/02/2005, Brasil, p. A4

Os Estados Unidos sinalizaram pela primeira vez a possibilidade de flexibilizar a negociação de produtos industriais e bens de consumo na Organização Mundial de Comércio (OMC), o que poderá levar o Brasil, Índia, Malásia e outros emergentes a cortar menos suas alíquotas de importação do que as nações ricas. Washington também reconheceu a impossibilidade de países em desenvolvimento de terem participação obrigatória em outro componente da negociação: a eliminação de tarifas em determinados setores industriais, que vem sendo combatida com vigor por Brasília. Como não existe almoço grátis, Washington indicou que os países em desenvolvimento vão ter de pagar por essa flexibilização com concessões adicionais em outras áreas da Rodada Doha. As sinalizações americanas foram dadas durante reunião de 26 ministros em Davos, na Suíça, no fim de semana, por Robert Zoellick, principal negociador comercial americano. Eles discutiram redução de tarifas de importação e outras barreiras para bens industriais. Até agora, os participantes das reuniões têm tentado superar a divisão Norte-Sul sobre a fórmula a ser usada para cortar as alíquotas. Os países em desenvolvimento, que têm as tarifas mais altas, querem assegurar "reciprocidade menos que total", ou seja, cortar menos, como previsto no próprio mandato da Rodada Doha. Os EUA, União Européia e outros industrializados insistiam em que as nações em desenvolvimento deveriam fazer os maiores cortes nas tarifas altas "para permitir um significante acesso ao mercado". A flexibilização apontada por Zoellick foi no sentido de sugerir que os membros da OMC usem a "fórmula suíça de harmonização tarifária" com dois coeficientes, um para os industrializados e outro para as nações em desenvolvimento. Significa que ambos terão de cortar as tarifas altas substancialmente mais que as tarifas baixas. Mas países como o Brasil e outros emergentes poderão manter um teto tarifário maior. Se os EUA cortarem uma tarifa de 25% para 10%, o Brasil deveria cortar só de 25% para 15%, por exemplo. Tudo depende do coeficiente a ser negociado. O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, que participou do encontro de Davos, destacou essa flexibilização como eventual avanço, sem porém dar detalhes. Reiterou que o Brasil está pronto a melhorar ofertas para abrir o mercado à entrada de produtos industriais e fornecedores de serviços estrangeiros, mas menos do que exigem americanos e europeus. Como o que se negocia na OMC é a redução da tarifa consolidada (média de 35% no Brasil) e não a realmente aplicada (média de 12% no país), Brasília tem boa margem de manobra nessa negociação. O risco era a aprovação de negociação obrigatória, não para cortar, mas para eliminar alíquotas de determinados setores. Em Davos, Zoellick admitiu que não dá para fazer isso de maneira obrigatória. Mas voltou com o conceito de "massa crítica" para determinar quem participa "voluntariamente". Assim, um país que tem alta participação no comércio de um produto ou setor e nível de produção, seria "estimulado" a participar para zerar a tarifa. A discussão continua. Washington tem mencionado setores que, argumenta, já teriam sido admitidos pelos próprios países em desenvolvimento, como pesca, químicos, equipamentos elétricos, equipamentos médicos, pedras preciosas e joalheria e produtos de couro.