Título: Varejo busca opção às altas taxas dos cartões de crédito
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Fonte: Valor Econômico, 16/06/2008, Finanças, p. C1

Lojistas insatisfeitos com as altas taxas cobradas pelas transações com cartão e o aumento da reclamação de consumidores, que colocou os plásticos na liderança de queixas nos Procons (ultrapassando o setor de telefonia) estão provocando reações no mercado. Algumas lojas incentivam outras formas de pagamento, como o boleto bancário, oferecendo descontos de 5% a 25% para pagamento à vista nas compras pela internet. Outras, de menor porte, reduzem prazos do parcelamento no cartão e incentivam o uso do cheque.

O setor de cartões reage e começou há alguns dias a compartilhar as máquinas leitoras do cartão nos pequenos estabelecimentos e prepara um código de auto-regulação que vai punir os bancos que violarem as regras.

O forte aumento das compras parceladas sem juros (também conhecidas como "parcelado lojista"), que já respondem por mais de 50% das operações com cartão, reacendeu a velha briga entre estabelecimentos comerciais e bancos pelas taxas cobradas nas transações.

Só em abril, o estoque dos créditos em aberto nas faturas de cartão de crédito (que inclui o parcelado sem juros) subiu 67% em relação ao mesmo mês de 2007, segundo os dados mais recentes do Banco Central. Do total de crédito concedido com cartão, 65% são parcelados sem juros, dez pontos percentuais a mais que há dois anos. O restante está divido entre o parcelado com juros e o crédito rotativo (financiamento da fatura).

A bandeira MasterCard aumentou a remuneração dos bancos nas transações parceladas sem juros, por pressão das próprias instituições financeiras, que assumem o risco da operação. Com isso, houve aumento para alguns estabelecimentos que ameaçaram não mais aceitar os cartões da bandeira.

Roberto Medeiros, presidente da Redecard, empresa que credencia estabelecimentos para a MasterCard, diz que o aumento das taxas foi localizado e restrito ao parcelado sem juros. O parcelado, diz ele, aumenta a venda de produtos e traz novos clientes às lojas. Segundo Medeiros, as taxas são negociadas caso a caso e o aumento afetou menos de 1% da base de clientes da bandeira.

"As empresas querem aumentar as taxas que já são as mais altas do mundo", diz Emerson Kapaz, diretor do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV). Segundo ele, o IDV prepara um amplo estudo sobre o assunto. "O cartão deveria ser aliado do varejo."

No parcelado sem juros, a loja dá o crédito e o banco assume o risco. Se o consumidor não pagar a fatura, a loja continua recebendo o valor das transações. O prazo médio é de três meses, mas em alguns lojas eletrônicas, como Submarino, Ponto Frio e Fast Shop, é possível encontrar financiamento sem juros em até 12 vezes. Por mais que as lojas digam que o financiamento é sem juros, ele não é. Há custos embutidos no preço, que vão desde as taxas dos cartões aos gastos com telefonia e aluguel das leitoras.

Algumas destas grandes redes também fecharam acordos exclusivos com grandes bancos para desenvolverem cartões em parceria, com condições diferenciadas. Estes plásticos oferecem prazo maior de financiamento (de até 24 vezes, com juros) e em alguns casos, preços menores.

Algumas redes maiores, como Ponto Frio e Saraiva, oferecem a possibilidade de pagamento à vista pelo boleto bancário com descontos que podem chegar a 25%. Na Saraiva, o preço é 5% menor no pagamento com boleto. Outras lojas virtuais, como Submarino e a Americanas, também oferecem a opção do boleto, mas sem o desconto no preço.

O pagamento via boleto é uma forma de o estabelecimento receber o valor do bem à vista. No parcelado sem juros, a loja recebe o valor do produto no mesmo número de vezes em que foi financiado. O parcelado lojista só existe no Brasil e surgiu no final dos anos 90 como uma alternativa ao cheque pré-datado.

Nas vendas à vista com cartão, a loja também recebe o valor do produto em 30 dias. Segundo Kapaz, esta é outra queixa recorrente. O senador Adelmir Santana (DEM/DF) apresentou um projeto de lei no Senado para reduzir este prazo. O argumento das empresas de cartão é que o consumidor só consegue os famosos 40 dias sem juros para pagar a compra por causa disso.

O setor de cartões é um dos que mais crescem no país há vários anos. Com expansão anual de 20%, o setor deve movimentar este ano quase R$ 200 bilhões e ultrapassar os 100 milhões de cartões de crédito em julho. De 2000 a 2007, o crescimento foi astronômico. O número de cartões subiu 232%, as transações cresceram 243% e o volume movimentado aumentou 263%.

Em meio ao forte crescimento, o setor acaba de ultrapassar as operadoras de telefonia em queixas nos diversos Procons estaduais. Os cartões já são os líderes em queixas, conforme foi anunciado no Ciab na semana passada, o principal congresso dos bancos. As taxas de juro mensal chegam a 16% (ou 494% ao ano), segundo a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). A taxa média está em torno de 10% ao mês (214% ao ano).