Título: Governança de estatais é tema mundial
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 16/06/2008, EU & S.A., p. D8

A governança de estatais é uma preocupação mundial. Desde 2005, a internacional Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) possui diretrizes para auxiliar as companhias na adoção de boas práticas de administração.

Os princípios gerais visam preservar desde a isonomia competitiva no mercado de atuação das estatais até a transparência da administração e o tratamento eqüitativo a todos os acionistas.

No Brasil, o governo aprovou, em janeiro de 2007, um decreto lei que institui a criação da Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias (CGPAR). No entanto, desde então, não se tem qualquer notícia sobre as atividades do órgão.

O objetivo do CGPAR é implementar diretrizes semelhantes às defendidas pela OCDE. O comitê deve ser composto pelos ministérios do Planejamento, da Fazenda, Casa Civil e setoriais relacionados a cada pasta. Além de atuar para defender a boa governança, o órgão nacional também tem entre suas competências a defesa dos interesses da União como acionista e a aquisição e venda de participações.

O debate no Brasil é relevante dada a forte presença do poder público como controlador de companhias abertas, seja pela esfera federal, seja pela estadual. Das 57 companhias cujas ações compõem o Índice Bovespa, nove pertencem ao poder público. As empresas do principal indicador da praça paulista somam um valor de mercado de R$ 1,8 trilhão. Desse total, 33% referem-se às estatais. Mesmo na comparação com o valor total da bolsa (397 companhias), de R$ 2,4 trilhões, as estatais são relevantes: representam 25%.

Alexandre Di Miceli, coordenador executivo do Centro de Estados em Governança (CEG) e professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), destaca que é essencial que as companhias controladas pelo governo tenham políticas claras e divulgadas para conviver com a dicotomia de uma empresa de economia mista: maximizar os lucros e, ao mesmo tempo, ter atuação de cunho social.

Mas os padrões de excelência em governança criados pela Bovespa não são tão disseminados entre as estatais. Das cem empresas do Novo Mercado, o poder público contribui com apenas quatro. Somente companhias em que o governo possui grande fatia do negócio podem migrar para esse espaço, pois a conversão de ações preferenciais em ordinárias poderia representar a perda do poder majoritário. Há também uma estatal no Nível 2 e cinco no menos exigente de todos os segmentos especiais de governança, o Nível 1.

O passo mais recente foi o da elétrica paranaense, a Copel, que aderiu ao Nível 1 em maio. A companhia viveu, em 2003, as conseqüências do dilema apontado por Di Miceli. Por dois anos seguidos, a estatal se recusou a repassar os reajustes definidos pelo órgão regulador do setor, a Aneel. O argumento era de que sua função era fornecer energia à população, e não gerar lucros.

Na época, depois de assistirem a forte baixa no valor de suas ações por conta dessa decisão, minoritários, incluindo estrangeiros, foram à CVM se queixar, mas não obtiveram respaldo para seus dilemas. "O controlador da Copel, assim como outras empresas controladas pelo Estado, estava no seu direito constitucional de agir no benefício da população local, que era o propósito de sua criação", respondeu a autarquia.