Título: Sob o sol do Nordeste
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/06/2008, Investimentos, p. D1

Há dois anos, o administrador baiano Marcos Luguori de Aragão resolveu investir R$ 5 mil em ações de grandes empresas como Petrobras, Gerdau e Vale por meio do banco onde tinha conta. Meses depois, mais interessado no mercado de capitais, passou a pesquisar taxas de custódia e corretagem e trocou o banco onde investia por uma corretora de valores. Por meio do home broker, sistema de negociação de ações via internet, ele conseguiu aumentar sua rentabilidade - no ano passado, seus ganhos foram de 35%. Agora, Aragão já pensa em chegar ao sonhado R$ 1 milhão em cinco e não mais em dez anos.

Pessoas como ele têm atraído corretoras de valores sediadas na região Sudeste para os estados nordestinos. Essas instituições, assim como as grandes empresas varejistas e construtoras, vêem na região um mercado ainda pouco explorado e com forte potencial de crescimento. A maioria delas aposta na parceira com agentes locais para conquistar novos clientes e fazer com que mais pessoas se familiarizem com ações, fundos e outros tipos de investimentos.

A paulista SLW Corretora chegou a Salvador há seis anos por meio de uma parceria com um agente autônomo. Só no ano passado, porém, resolveu expandir o modelo de negócio para outras capitais nordestinas, começando por São Luís, no Maranhão. "Fechamos neste ano com um agente em Fortaleza e estamos em negociação em Recife", conta Robson Queiroz, diretor comercial da empresa.

Segundo Queiroz, o mercado de capitais esteve durante anos muito restrito ao eixo Rio-São Paulo e a alguns lugares da região Sul. Com a estabilidade econômica, controle da inflação e forte melhora da renda no Nordeste, abriu-se um novo filão para as corretoras. "Por enquanto, a concorrência não é grande, nem predatória. É a hora de se firmar por lá", avalia o diretor.

A região Nordeste conta hoje com 28,8 mil investidores que têm ações na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), ainda bem atrás do Sudeste, com 348,470 mil investidores e da região Sul do país, com 78,768 mil. Pelos dados da bolsa, o Nordeste representa pouco mais de 4% do número de contas de pessoas físicas. O crescimento, no entanto, tem sido expressivo. Entre 2000 e abril de 2008, a quantidade de pessoas do Nordeste na bolsa subiu 30%, acima do ritmo visto no Sudeste (25%) e no Sul (27%).

"O efeito renda tem melhorado a possibilidade de se poupar. Isso começou a ser sentido nos estados que já tinham nível de vida melhor, como os do Sudeste, e agora chega a outros cantos do país", diz Fábio Feola, diretor da corretora Banif, que firmou parceira com a Futura Investimentos, outro agente autônomo que detém a exclusividade da representação da corretora no Nordeste e já atua em Fortaleza, Recife e Salvador. Caso quisesse vender ações diretamente aos clientes, a Futura, comandada por cinco jovens empresários baianos, teria de se transformar em corretora, o que elevaria o custo do investimento. Com a parceria, ela utiliza a estrutura do Banif e ganha comissões.

Se os números são animadores e a oportunidade parece imperdível, por que não aproveitá-la sozinho? Cada lugar tem suas especificidades, diz Queiroz, da SLW Corretora. "Estamos lidando com pessoas e não só com números. Ter um parceiro significa ter alguém que fala a mesma língua do cliente, sabe sobre suas necessidades e entende os costumes de cada Estado. Isso dá segurança ao investidor". No modelo de negócio da SLW, a corretora oferece o suporte tecnológico em São Paulo. No final do mês, metade do faturamento é do parceiro e metade da SLW.

A opção pelo parceiro local economiza tempo e dinheiro. "Quem tem conhecimento da praça não somos nós, são eles. Se optássemos por abrir um escritório em cada cidade fora de São Paulo teríamos que mandar um funcionário e leva tempo para ele conhecer pessoas, se relacionar e dominar a área", diz Manuel Lois, diretor de novo negócios da Spinelli. A corretora já está presente em três estados nordestinos: Bahia, Ceará e Pernambuco. A primeira parceria ocorreu há dois anos, em Recife, e a mais nova deve ser fechada em João Pessoa, na Paraíba. "Estamos em contato com várias pessoas. A idéia é que o processo de expansão continue. De fato, todos os Estados brasileiros têm grande potencial", afirma Lois.

Já as empresas de capital aberto, que estão buscando ampliar a presença de investidores pessoas físicas, também têm como estratégia serem conhecidas fora do eixo Rio-São Paulo. Em fevereiro deste ano, a paulista CPFL realizou a primeira reunião da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de (Apimec) no Nordeste, mais especificamente em Salvador. "Ficamos surpresos com a quantidade de pessoas presentes e com o alto nível das perguntas", conta José Antônio de Almeida Filippo, vice-presidente financeiro e de relações com investidores da CPFL. "O pessoal já está bem familiarizado com o tema e querendo saber cada vez mais detalhes."

Aragão, que é cliente da Futura Investimentos, foi um dos presentes ao encontro. "Se você quer fazer seu dinheiro crescer, precisa arriscar e apostar em investimentos mais lucrativos, como a bolsa de valores, mas, é claro, precisa se informar antes", diz ele que, hoje, encara suas ações como mais um de seus negócios, junto com três estacionamentos e um quiosque de sorvete espalhados por Salvador.