Título: União recorre contra saída do Exército
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2008, Política, p. A7

ais do que recorrer da decisão da juíza da 18ª Vara Federal do Rio, Regina Coeli Medeiros de Carvalho, que obriga a retirada das tropas do Exército do Morro da Providência e a sua imediata substituição pela Força Nacional de Segurança, o governo se preocupa com os desdobramentos políticos posteriores à crise no Rio de Janeiro.

O Ministério da Defesa, que acionou a Advocacia Geral da União para reverter a sentença da juíza através de um recurso, mantém a postura de que, sem o Exército no local, a obra fica inviabilizada.

Mas desde a eclosão da crise, no final de semana, agentes que comandam a Força Nacional no Rio Janeiro conversam informalmente com o governo fluminense para traçar estratégias de ação conjunta.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, lembrou ontem que um contingente da FNS já atua no Rio - ele se concentra ao longo da Linha Vermelha, da Linha Amarela, na orla da Zona Sul Carioca e nas imediações do Complexo Alemão.

Para não comprar uma briga política com seu colega da Defesa, Nelson Jobim, Genro foi diplomático. "A FNS não pode ser utilizada como força policial, ela age como força complementar às tropas estaduais. Essa questão do Rio de Janeiro não é uma questão do Ministério da Justiça", despistou.

Mas agentes do Gabinete de Gestão Integrada (GGI) iniciaram conversas preliminares - embora a Secretaria de Segurança Pública do Rio negue que isso tenha acontecido de maneira institucional - com o governo fluminense assim que foi descoberto que militares do Exército entregaram três adolescentes do Morro da Providência para serem assassinados por traficantes do Morro da Mineira.

Com a extensão do Pronasci - programa de segurança pública e cidadania do Ministério da Justiça - aos Complexos da Maré e de Manguinhos, cogitou-se a hipótese de estender um braço operacional até o Morro da Providência.

Esse gesto, contudo, esbarra em algumas questões legais. A primeira é que, de acordo com o estatuto da Força Nacional de Segurança, ela só pode agir como força auxiliar de tropas estaduais. No plano federal, ela poderá atuar como suporte da Polícia Federal, como ocorre na Operação Arco de Fogo, que combate o desmatamento na Amazônia. No caso do Morro da Providência, é o Exército que está atuando. Uma alternativa para que ela fosse ao morro é que a Polícia Militar local fosse destacada para fazer a segurança dos moradores locais e, aí sim, a Força servisse de tropa auxiliar.

Outro imbróglio é que a Força Nacional só poderá agir se for solicitada pelo governo estadual. Fontes ligadas ao Palácio da Guanabara lembram que, diante da insistência do Exército em permanecer no local, não há qualquer espaço para que tropas policiais estaduais atuem no Morro da Providência. O Exército voltou a alegar ontem que não está fazendo serviço de policiamento no morro mas, apenas, "dando segurança aos militares que atuam no projeto Cimento Social e ao canteiro de obras".

Se existe uma possibilidade - ainda que remota - de a Força passar a atuar no Morro da Providência, por que o governo resolveu recorrer da decisão da juíza exatamente nesse sentido? Segundo fontes do Executivo Federal, a intenção é evitar que "uma juíza de primeira instância tenha poderes para decidir onde o Exército pode ou não entrar". Da mesma maneira, a Força Nacional de Segurança só pode ser convocada a pedido de um governante estadual. Por isso, a avaliação de fontes ligadas à segurança pública, é "completamente inadequada a postura da juíza determinando que a FNS deve deslocar-se imediatamente para o Morro da Providência".

No recurso movido pela procurador-regional da União na 2ª Região, Daniel Levy, a justificativa dada pela AGU é que a decisão da juíza "configura grave lesão à ordem pública, uma vez que não se trata de questão envolvendo segurança pública, mas sim de apoio fundamentado a um projeto social". O texto diz ainda que o apoio do Exército "se limita à construção e fiscalização técnica das obras de engenharia sob a responsabilidade da Comissão Regional de Obras da 1ª Região Militar, e a segurança dos locais de trabalho e dos trabalhadores envolvidos no projeto".

O texto elaborado pela AGU explicitou as ações que podem ser feitas pela Força Nacional de Segurança, como: policiamento ostensivo; cumprimento de mandados de prisão; cumprimento de alvarás de soltura; guarda, a vigilância e a custódia de presos; serviços técnico-periciais, qualquer que seja sua modalidade, registro de ocorrências policiais, ações que, segundo a Advocacia-Geral da União, não estão sendo feitas pelo Exército no Morro da Providência.

O recurso da União, elaborado pelo procurador Daniel Levy, será apreciado hoje pelo presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª região, o desembargador Joaquim Castro Aguiar. (Colaborou Ana Paula Grabois, do Rio)