Título: Nogueira busca oposição na disputa com Temer pela presidência da Câmara
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2008, Política, p. A8

Há quase dois anos, o deputado Michel Temer (PMDB-SP) é candidato oficial à presidência da Câmara para o biênio que se inicia em fevereiro de 2009. Com acordo por escrito fechado com o PT e promessas de apoio do governo, o pemedebista não pode se considerar eleito. A razão atende pelo nome de Ciro Nogueira (PP-PI), deputado habilidoso, representante maior de um grande grupo de parlamentares pouco expressivo na Casa. Nos últimos meses, o piauiense tem viajado a alguns Estados e conversado pessoalmente com cada um de seus possíveis eleitores.

A disputa com Temer será duríssima. O pemedebista é presidente do maior partido da Câmara, o que lhe dá forte poder de barganha nas conversas com as demais bancadas. Com o PT, Temer possui acordo, firmado por escrito, segundo o qual o apoio do PMDB ao petista Arlindo Chinaglia em 2007 seria recompensado em fevereiro de 2009.

Enquanto as relações de Temer são mais institucionais, em reuniões periódicas com grupos de 20 deputados e tratativas com as lideranças, Nogueira aposta no trabalho de formiguinha. Em seu gabinete no térreo do Anexo I, onde fica a Segunda Secretaria da Câmara, cargo ocupado pelo parlamentar, Nogueira já conversou com centenas de colegas. Sempre em diálogos tête-à-tête.

Mas o deputado também tem viajado. Quando pode, aparece em algum evento de colega nos Estados. Há poucas semanas, esteve em São Paulo para o aniversário do deputado João Paulo Cunha (PT-SP). No jogo da Seleção Brasileira contra a Argentina, em Belo Horizonte, Ciro Nogueira teria a oportunidade não só de conversar com o governador Aécio Neves (PSDB), como com vários colegas congressistas.

Mas o trabalho de Nogueira não se restringe ao Congresso Nacional. O deputado esteve no gabinete do ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro (PTB). Anunciou que será candidato à sucessão de Chinaglia e ensaiou um pedido de apoio. O petebista não tergiversou: "O governo já tem candidato", disse. Mas o deputado do PP deixou o encontro com a garantia de que o Palácio do Planalto apoiaria Temer mas não sabotaria seu pleito.

Múcio, então, chamou Temer rapidamente em seu gabinete e reiterou o apoio do governo a sua candidatura. O ministro sabia do desastre que seria ao bom convívio da base aliada na Câmara se uma informação truncada chegasse aos ouvidos do presidente do PMDB por meio de terceiros. Temer sentiu-se prestigiado.

Mas Ciro Nogueira aposta em outras frentes. O DEM é uma delas. "Eles são oposição. Sabem que, nesse tipo de embate, quanto pior para o governo, melhor para a oposição. Apoiar Michel Temer é jogar o papel de oposição no lixo", diz um forte aliado de Nogueira. Embora Temer aposte na boa relação que tem com os democratas, é bem provável que a maioria dos votos do partido migrem para o candidato do baixo clero.

No PSDB, a briga de Nogueira será mais complicada. Os tucanos têm dado especial atenção às conversas com o PMDB na Câmara. Tudo para tentar trazer os pemedebistas para uma coligação com o partido para a disputa da Presidência da República em 2010. "Olhamos para o PMDB como um virtual parceiro em 2010. Trair Michel Temer está fora de cogitação", diz um influente tucano na Câmara. Ele reconhece, no entanto, que alguns dissidentes poderão ficar com Nogueira.

A argumentação de 2010, curiosamente, também leva o PT para o lado de Temer. Uma possível quebra do acordo firmado com o PMDB poderia ter uma reação irreversível da bancada pemedebista. "E a governabilidade ficaria complicada. O PMDB voltaria a rachar como acontecia no primeiro mandato de Lula", diz um deputado do PT de São Paulo. Os petistas sabem que uma coligação envolvendo PSDB, PMDB e DEM em 2010, com nomes como Aécio e José Serra na cabeça, seria quase imbatível, mesmo com toda a popularidade do presidente Lula.

A esperança do grupo de Nogueira é que a articulação pela presidência do Senado vire o jogo de ponta à cabeça na Câmara. Alguns petistas têm dito, nos bastidores, que só cumprirão o acordo com Temer se o PMDB apoiar um nome do PT para comandar a outra Casa. Os pemedebistas dizem que não há qualquer relação entre as duas Casas. O acordo escrito, de fato, não cita essa troca de gentilezas. Uma celeuma nesse entendimento poderá levar alguns votinhos petistas ao candidato do PP.

Entre os partidos médios, fundamentais para qualquer disputa na Câmara, Ciro Nogueira aposta todas as suas fichas. No PP, ninguém cogita trair um dos correligionários mais influentes da sigla. O líder do PR, Luciano Castro (RR), já reiterou que poderá ficar com Temer. Mas dissidentes já são esperados. E é bem possível que o PTB do líder Jovair Arantes (GO) desembarque na campanha do deputado do PP. O goiano ainda não se pronunciou.

Nesses partidos médios, o apoio de Chinaglia a Temer poderá levar votos a Ciro Nogueira. O pavio curto do presidente da Câmara, que não resiste em dar pequenas "patadas" em alguns colegas em sessões do plenário, poderá levar alguns deputados a preferir o candidato do PP por motivações pessoais.

Enquanto a briga não esquenta publicamente, Temer e Nogueira mantêm bom relacionamento. Já conversaram sobre as candidaturas. Nos bastidores, porém, na hora de ganhar votos de deputados indecisos, a cortesia fica de lado. Temer costuma dizer que Nogueira é o novo Severino, em referência ao ex-presidente que se elegeu a partir de uma sigla pequena - aliás, o mesmo PP de Nogueira, que faz de tudo para não associar sua imagem com a do folclórico deputado. Nogueira não deixa por menos. Diz aos colegas que Temer tem o apoio do ex-governador Anthony Garotinho e de seu não muito bem quisto grupo na Câmara.