Título: ALL negocia expansão com Constran
Autor: Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2008, Empresas, p. B1

A América Latina Logística (ALL) está em negociações adiantadas com um consórcio formado pela Constran e dois fundos de investimento voltados à infra-estrutura para a construção de 262 quilômetros na malha da antiga Ferronorte, concessão que passou ao controle da ALL na compra da Brasil Ferrovias, concluída há dois anos.

A obra é estimada em R$ 710 milhões. O consórcio já apresentou proposta para construir o trecho, que vai se estender de Alto Araguaia até Rondonópolis, no Mato Grosso. O projeto irá criar um corredor ferroviário com 1,4 mil quilômetros de extensão para o escoamento da soja do Centro-Oeste até o porto de Santos (SP).

O presidente da ALL, Bernardo Hess, disse na sexta-feira, sem citar nomes, que, na verdade, há dois grupos interessados na construção. "Estamos avançados e devemos ter novidades em breve", limitou-se a dizer Hess após falar na reunião anual dos conselheiros da Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, na Costa do Sauípe, município de Mata de São João (BA).

Uma fonte do setor interpretou a declaração de Hess de que ainda há dois grupos na disputa pela obra da Ferronorte como "estratégia de negociação", uma vez que o contrato com a Constran e os fundos não foi assinado. Não se pode descartar, no entanto, segundo a fonte, que a ALL desconsidere proposta de outros investidores.

O diretor financeiro e de novos negócios da Constran, Adriano Stringher, confirmou a oferta para a construção do trecho ferroviário e disse que a construtora está em fase final de negociação com os fundos para a definição das participações da sociedade de propósito específico (SPE) que pretende executar a obra. "A decisão sairá em semanas. Não devemos ter o controle, que será dividido com os fundos", acrescentou o executivo.

A expectativa da ALL é colocar em operação o trecho Alto Araguaia-Rondonópolis até 2011, se iniciada em 2009. "Há potencial para transporte de cargas agrícolas além de combustível e produtos frigorificados", afirmou Hess.

Hoje, a ferrovia se estende por 512 quilômetros entre Aparecida do Taboado, na divisa do Mato Grosso do Sul com São Paulo, até Alto Araguaia (MT). Parte da produção agrícola do Mato Grosso segue via caminhão até o terminal de Alto Araguaia, onde há estrutura de armazenagem. São cerca de 7 milhões de toneladas anuais de grãos que chegam por caminhão. No local, a produção agrícola é embarcada nos trens da Ferronorte, que seguem, via Ferroban (outra concessão da ALL), em direção ao porto de Santos, onde a empresa tem participação no Terminal de Granéis do Guarujá (TGG).

Caso se confirme, o contrato será o maior da Constran nos últimos cinco anos - a construtora divide com a Odebrecht as obras do Rodoanel paulista (R$ 500 milhões); constrói um ramal do metrô de São Paulo (R$ 100 milhões), além de dois trechos da ferrovia Norte-Sul (R$ 430 milhões).

A construtora foi fundada por Olacyr de Moraes, ex-rei da soja, que planejou a Ferronorte nos anos 80 e iniciou sua construção em 1992. Segundo interlocutores, o fundo Infra Brasil, cujo gestor é o ABN Amro, e o fundo de investimentos formado por recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) devem se juntar a Constran no projeto de expansão da Ferronorte.

O modelo de construção prevê que o consórcio faz a obra e recebe o pagamento em contrato de longo prazo (25 anos), de acordo com um volume variável de transporte da ferrovia. Dos R$ 710 milhões estimados para o projeto, o BNDES deve financiar 80% e a Constran e os fundos de investimento, 20%.

As fontes disseram que o BNDES (sócio da ALL via BNDESPAR), apóia a expansão da Ferronorte. Mas a instituição de fomento só deverá receber o projeto depois que a ALL feche o acordo com Constran e os fundos. Os fundos precisarão aprovar o projeto em seus respectivos comitês de investimento. O BNDES deverá financiar o empreendimento via project finance, modalidade pela qual o banco corre parte dos riscos.

O Valor apurou com o banco que no momento só estão ocorrendo conversas sobre o projeto. Mas, por se tratar de um projeto do PAC, o BNDES tem interesse, podendo financiar até 85% do valor da obra.

O custo total da obra ainda precisará ser confirmado por estudos mais detalhados do projeto. Segundo uma fonte, a ALL poderia tocar outros projetos com investimentos da ordem de R$ 700 milhões. Mas como a Ferronorte é uma concessão, válida por 90 anos a contar de 1989, a ALL é obrigada a fazer a obra sob risco de ter de devolvê-la ao Estado. Trata-se de uma concessão não onerosa, que não exige pagamento de arrendamento ao governo, por ter sido construída com capitais privados.

Além da autorização do projeto pela ANTT, a agência do setor, o consórcio precisará da aprovação de licença ambiental. "Dos quase 270 quilômetros, 200 quilômetros já possuem licença prévia, que precisa apenas ser renovada", disse o diretor da Constran. Ele não vê ameaças por parte de ambientalistas: "Essa é uma região onde a soja já está consolidada." (Colaboraram Vera Saavedra Durão, do Rio, e André Vieira, de São Paulo)

O repórter Francisco Goés viajou a convite da Previ.