Título: Óleo de soja mais caro faz brasileiro comprar azeite
Autor: Cunha, Lílian
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2008, Empresas, p. B4

A culinária do brasileiro está mudando graças a uma salada de números: o preço do óleo de soja subiu 63%; o de girassol, 54% e o de milho, 33%. Tudo isso durante os últimos 12 meses, segundo o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). Nesse mesmo período, o preço dos azeites de oliva caíram 6%. Os óleos compostos, aqueles que misturam óleo de soja com oliva, caíram ainda mais: o preço chega a estar 50% menor do que há um ano, segundo o Instituto Euromonitor. O resultado dessa matemática foi parar na cozinha do consumidor, onde o azeite conquista o espaço do óleo de soja.

"Tradicionalmente e culturalmente acreditávamos que o azeite serve só para tempero e não como óleo para fritura ou ingrediente de pratos", diz o vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas), Martinho Paiva Moreira, lembrando que o preferido do consumidor há décadas é o óleo de soja.

"Mas hoje, por motivo de preço e também de preocupação com a saúde, muito consumidor já usa só o azeite, substituindo os óleos na cozinha", diz Paula Gordilho, responsável pelos negócios de marketing da Aceite Cocinero, distribuído pela multinacional holandesa Bunge, segunda maior empresa do setor de óleos de cozinha no Brasil.

A conta é a seguinte: o litro do óleo de soja custa hoje R$ 5,50 em média, nos supermercados de São Paulo. O composto sai por dois reais a mais. Já o preço do litro do azeite fica em R$ 15,20, em média, levando em conta as marcas mais populares. "Na ponta do lápis, mesmo custando mais, o azeite traz mais benefício e por isso o consumidor faz a troca pelo azeite ou pelo composto", diz Marcel Motta, analista de pesquisas sênior da Euromonitor.

O instituto apurou que, há 12 meses, o óleo de soja tinha 90% das vendas do mercado brasileiro. Hoje, está com 89%. O recuo parece pequeno, mas em um segmento que vende 962 milhões de litros ao ano, ou R$ 2,9 bilhões, um ponto percentual corresponde a quase R$ 30 milhões.

O curioso é que o consumo de óleos de cozinha, seja de soja ou de oliva, continua o mesmo: em 2006, cada lar no país consumiu 25,1 litros. Em 2007, a quantidade permaneceu a mesma, segundo pesquisa da Latin Panel. Isso, segundo o analista, confirma a tendência de migração do consumo para o azeite. Essa mudança foi acompanha de outro movimento: o dos produtores de soja e óleos vegetais.

"Nos últimos anos, o produto vinha caindo de preço devido às grande safras do grão", diz Motta. Mas com o real valorizado, caíram as exportações e como saída, os agricultores encontraram o biodiesel, cuja composição é 90% soja. "Grande parte dos produtores estão deixando o óleo doméstico de lado para entrar na área de combustíveis", explica o analista. "Isso faz o preço subir."

Na contra-mão, o azeite perdeu preço com a queda do dólar e ganhou consumidores. O volume de azeite vendido no Brasil em 2007 ficou em 23.580 toneladas. Cresceu 8% em 2005, 9% em 2006 e 10% no ano passado, diz o português Luis Santos, diretor de marketing do grupo Sovena, ao qual pertence a marca de azeite Andorinha. "O mercado cresce agora a 15% ao ano", acrescenta.

Nesse ritmo, a Andorinha, segundo ele, baterá seu recorde de venda no Brasil, com 4 milhões de litros neste ano. O mesmo otimismo contamina a argentina Cocinero, que há um ano tinha 2% do mercado e agora comemora seus 4%, graças ao novo consumidor.

Mas quem são os novos adeptos do azeite? "A maior parte ainda pertence à classe A ou B, que além de querer uma melhor relação entre custo e benefício, deseja um produto mais saudável", diz Paula Gordilho.

A classe C, entretanto, também está dando um toque mediterrâneo aos seus quitutes. Isso graças ao óleo composto, aquele 80% soja, 20% oliva. "Há dois anos, esse produto custava três vezes mais que o óleo de soja. A diferença agora é só de 30%", diz Motta.

A popularidade do composto está tão em alta que a marca líder, o azeite Maria, que pertencia à Vida Alimentos, foi comprada por US$ 24,7 milhões há pouco mais de um ano pela Cargill, a maior companhia do setor, dona das marcas Liza e Soya.

A concorrente Bunge não ficou atrás: lançou o azeite Delícia, no segundo semestre de 2006. Também incluiu o composto Salada, em 2006, na sua linha de produtos.

"Nos últimos dois anos, o número de marcas de azeite nas prateleiras dos supermercados mais que dobrou", diz o analista da Euromonitor. Isso, segundo ele, confunde o consumidor. "A Bunge, lançando azeites com rótulos de marcas já conhecidas como Delícia, da margarina, e Salada, com quase 80 anos de mercado, ganha a confiança do comprador. A Cargill, adquirindo uma marca tradicional, como Maria, também dribla esse fator", avalia Motta.