Título: País pode voltar a ter saldo negativo em 2009
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Fonte: Valor Econômico, 24/06/2008, Brasil, p. A3

Governo e analistas privados já prevêem que as importações devem superar as exportações no Brasil a partir do ano que vem, gerando os primeiros déficits na balança comercial do país desde 2001. Um estudo do Ministério do Desenvolvimento, ainda sob sigilo, alerta que o ritmo da corrente de comércio do país com o exterior pode levar a um déficit entre US$ 2 bilhões a US$ 3 bilhões em 2009. O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior Brasileiro (AEB), José Augusto Castro, não arrisca números, mas concorda: "Mesmo que se produza mais, não temos como escoar a produção; vamos ter déficit em 2009".

Mesmo analistas mais otimistas reconhecem que o país poderá até chegar ao fim do ano com um pequeno superávit comercial, mas terá meses com importações superiores às importações. As vendas do país ao exterior vêm crescendo ao ritmo de 20% aproximadamente, enquanto as compras de fornecedores externos já se aproximam dos 50% mensais. Se as exportações seguirem no mesmo ritmo, e as importações, com a queda nos preços das commodities, crescerem em torno de 35% ao mês, o descompasso será suficiente para gerar déficit no comércio do Brasil com o exterior.

"Poderemos ter alguns meses com déficit, como janeiro e fevereiro, mas deve se compensar esse resultado em meados do ano", acredita o economista Fernando Ribeiro, da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), que divulga hoje o boletim mensal da instituição, com avaliação do desempenho das contas comerciais do país.

Ribeiro lembra que parte considerável do bom desempenho das exportações pode ser atribuída não à venda de maiores quantidades, mas ao aumento do preço das mercadorias exportáveis. O "efeito-preço" é similar também para as importações, nota ele: até maio, o aumento dos preços médios das exportações foi de 23%, e o das importações, 22%, o que significa, segundo o economista, que uma correção nos preços das commodities poderá desacelerar no mesmo ritmo tanto as vendas quanto as compras externas.

Para 2008, a Funcex prevê exportações de US$ 193 bilhões e importações de US$ 172 bilhões, estimativa semelhante à da AEB, que resultaria em um superávit comercial, neste ano, próximo a US$ 20 bilhões, metade do realizado no ano passado. Há fatores adicionais, porém, que poderão sacrificar proporcionalmente mais as exportações, lembra Castro, da AEB.

Os fretes, por exemplo, aumentaram sensivelmente, não só pelo aumento do preço dos combustíveis, mas também pelo crescimento do comércio internacional. No Brasil, os produtores de soja pagam, hoje, em torno de US$ 100 para levar os grãos de Mato Grosso ao porto de Paranaguá, no Paraná, custo absorvido com o grande aumento do preço da tonelada de soja, de US$ 500 por tonelada. "Há dois anos atrás o preço da soja era de US$ 250 por tonelada; se o frete fosse o mesmo não haveria condições de exportar", comenta o vice-presidente da AEB, preocupado com os efeitos de um provável ajuste nos preços da commodity.

Tanto Castro quanto Ribeiro comentam que é difícil prever com segurança o comportamento do comércio exterior, dependente de incógnitas como o ritmo de crescimento das economias dos Estados Unidos e China, e a cotação do real em relação às moedas dos parceiros comerciais do Brasil. Há um consenso, porém, que as importações continuarão crescendo mais rapidamente que as exportações.

No estudo preparado pelo Ministério do Desenvolvimento, que circulou pela equipe econômica em novembro de 2007 e foi atualizado no primeiro trimestre, estimava-se que as importações reduziriam o ritmo de crescimento e as exportações se estabilizariam no mesmo patamar do início do ano. As exportações, surpreendentemente, continuaram mostrando aumento o que levou à redução nas previsões de déficit para 2009, mas foi insuficiente para imaginar equilíbrio ou superávit na balança comercial.

"Deve haver déficit até 2011, ou 2012, quando o petróleo do pré-sal começará a ter efeitos na balança comercial", imagina José Augusto de Castro. O secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, não confirma a existência do estudo do governo apontando o déficit, mas indica que uma melhoria no desempenho da balança depende de iniciativas oficiais. "Espero que haja bons resultados com as medidas adotadas na política de desenvolvimento produtivo nacional", diz ele, em referência ao pacote de medidas de política industrial, divulgado em maio. "Vamos trabalhar com o setor privado na análise de novas medidas", anuncia o secretário.