Título: Temporão se enfraquece sem apoio do PMDB
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 24/06/2008, Política, p. A7

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, perdeu o apoio do PMDB, embora a cúpula do partido afirme que não há nada que o desabone. Indicado pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva e apadrinhado pelo governador do Rio, Sérgio Cabral, Temporão é criticado por ter pouca flexibilidade no trato das demandas políticas e por abraçar temas polêmicos, como o do aborto, por exemplo, que nem sempre estão nas prioridades do governo. "Ele é muito auto-suficiente. É verdade que se aproximou mais do Congresso durante a epidemia de dengue no Rio. Mas isso é muito pouco", criticou um pemedebista. Segundo interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Saúde já estaria perdendo o apoio do próprio Palácio do Planalto.

Um eventual processo de distanciamento do PMDB da figura de Temporão não significa, necessariamente, que o ministro esteja com o cargo por um fio. "Se todo ministro de quem Lula reclamar for demitido, não vai sobrar nenhum. O presidente quer resultados, sempre", declarou um governista acostumado a decifrar os sinais políticos emitidos pelo presidente da República. "Lula só vai mudar seu ministério após as eleições de outubro. Será o ajuste final para encerrar o mandato em 2010", apostou um petista.

Há quase um ano e meio no cargo, Temporão foi uma escolha pessoal do presidente. Para acomodar as pressões do PMDB, que insistia com o Planalto para ampliar sua fatia de poder no governo, Lula convenceu Cabral a adotá-lo como afilhado político. "Foi uma barriga de aluguel autêntica. Mas o PMDB cansou dessa barriga", afirmou um deputado da legenda, que acrescentou: "Se o Temporão deixar o governo, ninguém vai chorar por ele".

Temporão queixa-se a interlocutores no governo de que essas notícias têm remetente certo: a bancada fluminense de seu partido, mais especificamente o deputado Eduardo Cunha (RJ).

O ministro sempre se orgulhou do discurso de que não cederia a pressões políticas para nomear os cargos que compõem a sua pasta. Entretanto, segundo a avaliação que se faz de seu trabalho no governo, não fez este princípio de não ceder aos políticos se acompanhar de resultados concretos na administração da saúde.

Mas há explicações diferentes para o eventual enfraquecimento do ministro da saúde. Uma é que o desgaste decorreria mesmo da falta de resultados práticos apresentados ao longo desse período. Temporão era ministro quando a CPMF foi derrotada pelo Congresso, em dezembro do ano passado. Alguns governistas acham que se o titular da Saúde tivesse sido mais eficaz na negociação, abandonando outras bandeiras políticas pelo caminho, talvez o governo não tivesse perdido a batalha para a oposição.

Vem dessa época, inclusive, o início dos atritos com Eduardo Cunha. Relator da matéria na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Cunha protelou ao máximo o seu relatório para garantir a nomeação de Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas. Cunha nega que tenha sido empecilho e afirma que o governo foi inábil na negociação com o Congresso, especialmente com o Senado.

Mas não foi apenas a CPMF que Temporão amargou como revés. Durante sua gestão, o Rio de Janeiro viveu a pior crise de dengue da história, superando a crise de 2002, na qual haviam morrido 91 pessoas. A febre amarela também voltou a assombrar o país, embora o ministro tenha defendido que a epidemia era fruto de um ciclo de reprodução do vírus.

Temporão também propôs a legalização do aborto, apontado por ele como uma questão de saúde pública. Foi criticado pela comunidade católica, já que suas primeiras intervenções foram feitas às vésperas da visita do Papa ao Brasil. O debate acabou sendo interditado pela Conferência Nacional de Saúde, com a ajuda da CNBB.

Na semana passada, Temporão conseguiu vitória em outro tema polêmico. A Comissão de Trabalho da Câmara aprovou o projeto de lei que autoriza a criação de Fundações para administrar hospitais públicos. O relatório, no entanto, está longe de ser apreciado pelo plenário da Casa.

"Ele faz muito barulho e, de resultado prático, pouco apresentou", criticou um parlamentar do PT, partido que já tem, inclusive, nomes para indicar caso a agonia do ministro se prolongue: o atual presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia. Mas, para isso, não adianta mudanças bruscas: Chinaglia é presidente da Casa até fevereiro do ano que vem e não abriria mão de seu cargo para ser ministro de Lula. Se a reforma ministerial vier a ocorrer em novembro - depois das eleições municipais - tudo fica mais fácil pois, na prática, com o recesso parlamentar de janeiro e as eleições para a presidência da Câmara previstas para o início de fevereiro, o tempo de poder que Chinaglia abriria mão seria mínimo.