Título: Caixa negocia com governo a primeira emissão de CRI
Autor: Travaglin , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 26/06/2008, Finanças, p. C3

Uma das apostas dos bancos para que o financiamento imobiliário deslanche é a securitização das operações de crédito. Esse modelo, baseado na emissão de certificados de recebíveis imobiliários (CRI) já está na pauta da Caixa Econômica Federal.

A instituição negocia com a equipe econômica do governo uma forma para montar sua primeira emissão sem comprometer a exigência do Conselho Monetário Nacional (CMN) de destinação de 65% da caderneta para o financiamento de imóveis. "A expectativa é que no segundo semestre seja encontrada uma solução. A modelagem ainda não está definida, mas estamos empenhados na discussão", afirma Márcio Percival Alves Pinto, vice-presidente da Caixa.

Segundo ele, a área imobiliária é um dos pilares do crescimento econômico e alternativas de financiamento são muito bem-vindas, mas o cumprimento da meta do CMN é a grande dificuldade para a securitização. Isso porque, em uma emissão de CRI, os créditos que lastreiam a operação saem do balanço e deixam de ser computados no cálculo. Se não cumprem a meta de 65%, mesmo que tenham concedidos os créditos, os bancos são penalizados.

Por outro lado, as instituições entendem que esse mercado é importante para substituir os recursos da poupança com fonte de recursos. Isso porque, apesar do histórico de estabilidade da caderneta, esse investimento tem característica de curto prazo, enquanto os empréstimos da habitação estão cada vez mais longos e já chegam a 30 anos.

A Caixa não descarta o direcionamento do crédito, por entender que é um instrumento do governo para estimular setores estratégicos da economia, mas avalia que a poupança seria mais compatível com o financiamento das construtoras, mais curtos, enquanto a emissão de títulos securitizados como o CRI serviria para financiar o cliente por prazos mais longos.

Além disso, a poupança já começa a atingir o limite, segundo análise da Link Corretora. Em relatório, a corretora avalia que o crescente interesse demonstrado pelos bancos pode ficar comprometido caso não haja novas fontes de recursos. Com o aumento da demanda, disse a corretora, o sistema de poupança começa a dar sinais de em menos de dois anos estará sobrecarregado.

Os bancos já deram início às emissões, mas ainda de forma tímida. No ano passado, o Banco Real fez a primeira oferta pública, estruturada pela Brazilian Securities, no valor de R$ 86,4 milhões.

Neste ano, em maio, a Cibrasec, empresa securitizadora controlada pelos grandes bancos, realizou duas emissões privadas que totalizam R$ 250 milhões, sendo a maior parte lastreada por ativos de operações de crédito fora do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), ou seja, que não utilizam recursos da poupança (imóveis acima de R$ 350 mil ou compra de um segundo imóvel).

Foram duas séries, compradas por bancos. A primeira delas, de R$ 22,529 milhões, pagou juros de 12% ao ano mais taxa referencial (TR) e teve prazo final de 297 meses, sendo o prazo médio no fluxo de amortizações de 82 meses. A segunda foi de R$ 222,9 milhões, com taxa de 10% ao ano mais TR, prazo final de 252 meses e prazo médio de 146 meses.

O mercado de CRI está aquecido neste começo de ano, mas a maior parte das emissões ainda é composta pelos chamados recebíveis comerciais, ou seja, de operações estruturadas (built-to-suit) ou de títulos lastreados em aluguéis de imóveis corporativos. O volume CRI lançado neste ano atingiu R$ 2,1 bilhão no primeiro semestre, 36% superior ao total do ano passado.

A expectativa dos bancos é que mercado de títulos residenciais deva crescer mesmo em 2009. Em recente entrevista ao Valor, Norberto Barbedo, vice-presidente do Bradesco, afirmou que a aceleração das concessões deve fazer com que os empréstimos superem as exigências de direcionamento de 65% dos recursos da caderneta de poupança já no próximo ano, permitindo que os grandes iniciem a securitização por meio de CRI.

Roberto Zanré, gerente da Cibrasec, concorda que as emissões devem começar a aparecer no meio do próximo ano. "Há um grande volume de lançamentos imobiliários programados para o próximo ano e talvez o volume de empréstimos possa suplantar oferta de credito imobiliário e a diferença de fluxo ser canalizada para a securitização".

Esse caminho já começou a ser seguido pelos bancos médios, conta Glauber Santos, diretor da RB Capital (antiga Rio Bravo Crédito). "Tem havido uma demanda grande e crescente de pequenos bancos com carteira hipotecaria que estão nascendo nesse mercado e não têm o funding correto". A securitizadora tem feito acordo com essas instituições para adquirir os créditos por taxas que variam de 8% a 10% mais a variação da inflação.

Outro movimento que começa a se intensificar no mercado é a venda de créditos residenciais por parte das construtoras para estruturação de CRI. "Há uma necessidade de financiamento maior no mercado imobiliário", afirma André Bergstein, diretor da Brazilian Securities.