Título: Estados ainda devem unificação à Previdência
Autor: Watanabe,Marta ; Bueno,Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2008, Especial, p. A14
Dos oito Estados que no início do ano estavam em situação pendente frente ao Ministério da Previdência porque não unificaram a gestão dos seus regimes previdenciários - Alagoas, Amapá, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia e Santa Catarina - três ainda não têm a lei aprovada. O Distrito Federal aprovou sua lei ontem à noite. O prazo para essa unificação - prevista na emenda constitucional que reformou a previdência em 2003 - acaba em 30 de junho, e a sanção é o bloqueio de transferências de verbas voluntárias da União para o respectivo Estado.
Entre os retardatários (RN, AL, MS), apenas dois estão em situação mais complicada: Alagoas e Rio Grande do Norte. O primeiro informa que não conseguirá cumprir o prazo e o segundo ainda não enviou seu projeto de lei de unificação para a Assembléia Legislativa. O Mato Grosso do Sul espera aprovar a lei esta semana ou antes que expire a validade de seu certificado de regularidade previdenciária.
Os demais Estados já aprovaram os projetos de lei para unificar a previdência do Estado, colocando sob o mesmo regime os funcionários dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Apesar da aprovação, Rondônia e Rio de Janeiro ainda não possuem todos os dados necessários para fazer a conta básica de qualquer sistema previdenciário: qual o gasto atual e o do futuro, qual o volume de contribuições de hoje e o de amanhã. No Amapá alguns cenários já chegaram a ser traçados, mas não se sabe ainda como evitar o déficit que deverá surgir em alguns anos. O Rio Grande do Sul já tem déficit representativo e ainda não conseguiu aprovar um projeto de aposentadoria complementar.
O Ministério da Previdência estabeleceu prazo até 30 de junho para que os governos estaduais e o DF aprovassem leis próprias reunindo a gestão e o pagamento dos aposentados e pensionistas. Quem não cumprir o prazo deixará de renovar o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP). Emitido pelo Ministério da Previdência, o documento é necessário para receber recursos voluntários da União.
Alagoas entrou na justiça - e por enquanto tem uma liminar que lhe é favorável - enquanto o Rio Grande do Norte espera enviar esta semana o projeto de lei à Assembléia. A situação do Estado é crítica porque a validade de seu certificado expira em 30 de junho, informa Nereu Batista Linhares presidente-substituto do Ipern, instituto de previdência potiguar. Segundo ele, os repasses voluntários federais são significativos para o Estado. "Nossa rede de saneamento é mantida com os recursos de convênios com a União."
Alagoas ainda não tem sequer projeto de lei para a unificação. Mesmo assim, Ortegal Jucá, presidente da AL Previdência, instituto de previdência do Estado, defende que o descumprimento do prazo não deverá impedir o envio de recursos voluntários pela União. Segundo ele, o Estado mantém o CRP com base em liminar judicial. "Temos o certificado com validade até dezembro de 2008."
Atualmente, a AL Previdência unifica apenas os funcionários dos três poderes aposentados a partir de 2005. Os anteriores têm os benefícios pagos separadamente e Jucá não sabe informar quantos aposentados estão nesse grupo e nem o déficit atual. Os pensionistas estão todos unificados e Jucá alega que o Estado ainda fará o recadastramento dos inativos.
No Rio Grande do Norte o pagamento dos aposentados dos três poderes é unificado, mas a gestão é separada. "A concessão das aposentadorias e controle do tempo de trabalho é feita separadamente. Inclusive cada poder arrecadada a contribuição e depois repassa os valores para o instituto de previdência", diz Nereu Linhares. Ele conta que um projeto de lei chegou a propor a unificação de gestão em 2005, mas foi questionado pelos magistrados e ainda não há decisão judicial definitiva. Segundo Linhares, o Estado possui 24 mil aposentados e um déficit mensal em torno de R$ 4 milhões.
Em muitos Estados, a mudança no regime previdenciário é importante para sanear as contas do Estado. Considerado pelo governo do Rio Grande do Sul como fundamental para o reequilíbrio das finanças públicas, ainda que num horizonte de longo prazo, o projeto de criação do regime de previdência complementar ainda espera pela apreciação da Assembléia. Até o fim de março governo ainda pretendia colocar o regime complementar na pauta em maio ou junho, mas com a crise política enfrentada pela governadora Yeda Crusius (PSDB) a partir de uma CPI sobre desvios de recursos do Detran já não há prazo previsto.
O projeto gaúcho determina um novo regime previdenciário. Hoje os servidores gaúchos recebem aposentadoria integral e a proposta do Executivo limita os benefícios dos que forem contratados após a aprovação da nova lei ao teto do regime geral de previdência social, de R$ 3.096. Quem quiser ganhar mais terá que contribuir com um adicional.
Os cálculos do governo indicam que mesmo com o novo regime o déficit da previdência gaúcha vai crescer até 2020, para só então iniciar uma trajetória descendente. Em 2007, a diferença entre benefícios pagos e contribuições recebidas pelo sistema chegou a R$ 4,6 bilhões, o equivalente a 18 vezes os investimentos públicos.
O tamanho do déficit ou a forma de resolvê-lo ainda continuam sendo incógnitas em outros Estados com previdência unificada. No Rio a lei foi aprovada em 11 de junho, mas segundo o presidente do RioPrevidência, o fundo de pensão do Estado, Wilson Risolia, os números só devem estar de fato unificados em 2009. Até o momento, o Estado do Rio paga os servidores do Tribunal de Contas, Ministério Público, Judiciário e Legislativo estaduais sem ter os dados abertos. O Estado só tem os valores dos salários, idade e tempo de serviço dos funcionários do poder Executivo. "Os demais poderes nos passam apenas o valor da folha. Não tínhamos como fazer o cálculo atuarial das aposentadorias futuras de todo do funcionalismo", diz.
Com a lei, Risolia prevê que até o final do ano terá todos os dados em separado, o que permitirá a realização da previsão dos gastos futuros com aposentadorias. Atualmente, o déficit atuarial do RioPrevidência corresponde a R$ 15 bilhões, mas Risolia diz que a diferença deve aumentar.
Em Santa Catarina, cuja lei de unificação foi aprovada neste mês, também já há um déficit. As contribuições previdenciárias somam R$ 40 milhões por mês enquanto as despesas chegam a R$ 120 milhões, com déficit de R$ 80 milhões coberto pelo Tesouro. Com a unificação, Santa Catarina terá dois regimes. Um deles é o fundo financeiro onde ficarão os servidores que hoje já trabalham e contribuem, além dos inativos. Outro é um fundo previdenciário para os que ingressarem no serviço público a partir da publicação da lei.
Em Estados mais novos, como Rondônia e Amapá, não há déficit ainda porque a quantidade de aposentados e pensionistas é baixa em relação aos funcionários ativos. A preocupação é com o futuro, quando crescer o número de inativos. Em Rondônia, onde já há lei de unificação aprovada, o cálculo atuarial com todos os inativos já unificados deve ser feito até o fim de julho. Os três poderes rondonienses reúnem hoje cerca de 4,5 mil aposentados e pensionistas. Com o desconto de 11% pago pelos servidores e 11% patrocinado pelo Estado, a receita do Iperon, fundo de previdência do Estado, é de R$ 12 milhões ao mês para uma despesa mensal de R$ 8 milhões com os benefícios.
Cálculos atuariais preliminares mostram, contudo, que será necessário aumentar a participação patronal e contar com outras fontes de financiamento para a previdência porque dentro de um ano e meio ou dois a receita gerada estará empatada com as despesas. Segundo César Licório, presidente do Iperon, a idéia é que o Estado aumente sua contribuição paulatinamente. O financiamento do déficit futuro é também um dos pontos em estudo no Amapá, Estado no qual os inativos já estão considerados unificados embora falte agregar ao regime único 32 funcionários que se aposentaram antes de 1999, quando foi criado o sistema com a união dos três poderes.
Segundo Ivana Contente Gonçalves, diretora de benefícios e fiscalização da Amprev, na previdência amapaense ainda há espaço para fazer caixa com a arrecadação de 23% sobre os salários - 11% dos servidores e 12% do Estado. O Estado paga R$ 587 mil mensais a 418 aposentados e pensionistas. Ivana diz que hoje a arrecadação cobre perfeitamente as despesas, mas deverá haver déficit em cerca de 30 anos. O governo já estuda formas de cobrir a diferença no futuro.