Título: CCJ analisa projeto que prevê troca de informações tributárias entre Brasil e EUA
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2008, Política, p. A9

A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara começa a debater na próxima semana um acordo bilateral entre Brasil e Estados Unidos que permite a troca de informações tributárias sigilosas de pessoas físicas e jurídicas. O projeto de decreto legislativo enviado pelo Poder Executivo tramitava de forma veloz até que alguns deputados se debruçaram sobre o conteúdo do texto e optaram por frear o ímpeto do governo.

O projeto prevê a troca de informações sobre o recolhimento de diversos tributos dos dois países. Se o acordo for ratificado pelo Congresso, o Brasil deixará à disposição das autoridades americanas os dados do Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), do Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (IPTR), da Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) e das contribuições sociais para o Programa de Integração Social (PIS) e para o financiamento da Seguridade Social.

Dados inclusive sigilosos poderão ser repassados às autoridades dos dois países. Se fiscais dos Estados Unidos quiserem, poderão pedir permissão ao Brasil para vir ao país investigar empresas em território nacional. As autoridades poderão "obter livros, documentos e registros originais e não alterados, e outros elementos materiais, inclusive informações de posse de bancos, outras instituições financeiras e qualquer pessoa", diz o texto do projeto.

O acordo foi firmado em março de 2007 pela Receita Federal e a Embaixada dos Estados Unidos. O projeto começou a tramitar em outubro do ano passado. "Não entendo essa pressa toda para um acordo tão importante. Precisamos analisar isso direito. Que tipo de conseqüências esse acordo trará para os brasileiros que moram nos Estados Unidos? E para as empresas brasileiras aqui e lá?", diz o deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC).

O texto seria votado pela CCJ na próxima semana. Mas por iniciativa de Bornhausen, a comissão realizará audiência pública com diversos especialistas para debater a questão. O requerimento da audiência pública deverá ser votado na terça-feira.

"A proteção ao sigilo não está clara para mim no texto do projeto. Não tenho juízo de valor sobre o acordo, mas queremos discuti-lo profundamente", diz o parlamentar. O presidente da CCJ, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é ainda mais incisivo ao falar da proposta. "Eu acho esse acordo estranho. Na minha opinião, o projeto invade a soberania do país", diz.

"Como podem as empresas brasileiras ficarem à disposição da Receita dos Estados Unidos? As empresas daqui vão ter de atender fiscais americanos?", questiona Cunha. Bornhausen lembra que os dois países debatiam, no ano passado, um acordo bilateral para evitar a bitributação no comércio entre os dois países. "Seria bom para o país. Mas me parece que só sobrou esse acordo de abertura de sigilo, que interessa mais aos americanos", diz.

Para Ciro Gomes (PSB-CE), relator do texto na Comissão de Finanças e Tributação, o acordo em debate faz parte de um processo maior, com vistas ao fim da bitributação: "É um importante passo na celebração de um futuro acordo para evitar a dupla tributação internacional", justifica, ao defender o relatório aprovado no colegiado.

Na Comissão de Relações Exteriores, o relator do texto foi o deputado João Almeida (PSDB-BA). Na opinião do tucano, o texto não apresenta problemas. "Quando analisamos a proposta, tivemos a percepção de que o Itamaraty resolvera bem a questão", afirma. O Código Tributário Nacional prevê o intercâmbio de informações com Estados estrangeiros.

Ainda em seu relatório, João Almeida classifica o texto de "relevante instrumento" de "combate a evasão fiscal, bem como outros crimes contra as respectivas ordens tributárias". Com a polêmica na CCJ, o deputado promete analisar o texto novamente para avaliar se as desconfianças dos colegas têm pertinência.