Título: Ciro abandona conselho de Lula e provoca o PT
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2008, Política, p. A10

O acirramento da campanha municipal levou o deputado Ciro Gomes (PSB-PE) a abandonar um conselho dado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado: evitar brigas com o PT para não dificultar alianças futuras na sucessão presidencial. Nos últimos meses, Ciro atacou duramente o partido do presidente em pelo menos três oportunidades. Na primeira, chamou de "míopes" aqueles que não enxergavam na aliança a favor de Márcio Lacerda (PSB) para a Prefeitura de Belo Horizonte um passo adiante na política nacional. Depois, disse não saber se concorrerá em 2010, mas que não tem qualquer obrigação de apoiar um nome do PT, por causa de Lula. Por fim, classificou Fortaleza, governada pela petista Luizianne Lins, de "puteiro a céu aberto".

A declaração mereceu nota de esclarecimento do deputado que disse ter sido uma forma de alerta sobre o crescimento da prostituição na cidade. "Tentei alertar para o fato de que, com uma natureza exuberante, nosso Estado, e em especial nossa capital, pode estar se firmando como um destino preferencial do turismo sexual", disse Ciro.

Ano passado, quando a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ainda não era vista como um nome forte no PT, Ciro conversou com Lula. O presidente, que respeita Ciro pelo apoio prestado no segundo turno em 2002 e, acima de tudo, pela lealdade demonstrada durante o primeiro mandato - "ele me defendeu durante o mensalão quando muitos petistas não tinham coragem para fazê-lo", elogiou o presidente a mais de um interlocutor - disse-lhe que ele seria um bom nome para sucedê-lo. Mas que, por conta dos ciúmes que essa parceria gerava no PT, evitasse comprar brigas com os petistas e construisse essa "candidatura por dentro".

Ciro então calou-se, viajou pelo país defendendo suas propostas, mas sem atacar o PT. A trégua rompida agora é vista, contudo, tanto por integrantes do bloquinho de esquerda, quanto pelo PT, como uma questão específica ligada à sucessão municipal. "Ciro sempre foi conhecido por sua verborragia. Essas intervenções são contumazes, mas pontuais", afirmou um integrante do diretório nacional do PT. Para ele, não significa que uma aproximação para 2010 esteja inviabilizada. Mas também não há garantias que ela aconteça. "Todo mundo tem o direito de apoiar quem bem entender. O PSB age legitimamente ao lançar o nome de Ciro, que já disputou duas eleições. E nós temos o direito de apresentar um candidato do PT", afirmou o dirigente.

Dentro do bloco de esquerda, os arroubos do deputado cearense são vistos como comuns, decorrentes de um estilo pessoal de Ciro. Una-se a isso os interesses pessoais nos três quadros políticos relatados, está pronta a mistura explosiva que potencializa as críticas agressivas do pessebista. Em Minas Gerais, Lacerda, além de correligionário, é amigo de Ciro. O deputado viajou à Belo Horizonte para defender a aliança entre o PSDB de Aécio Neves e o PT de Fernando Pimentel, uma parceria reprovada diversas vezes pelo diretório nacional do PT. "É engraçado ele atacar o governo Fernando Henrique e ser amigo de um tucano, como o Aécio, que foi líder do PSDB e presidente da Câmara durante o período em que a agenda neoliberal foi implantada", criticou um petista.

Líder de Ciro na Câmara, o deputado Márcio França (PSB-SP) afirmou que a questão de Fortaleza é ainda mais específica, já que a adversária de Luizianne é a senadora Patrícia Saboya (PDT-CE), ex-esposa de Ciro. "Não há como ele não declarar apoio. Não podemos esquecer que Luizianne foi atacada e abandonada pelo PT, não por nós, em 2004". Na época, a direção nacional do PT defendia o apoio ao comunista Inácio Arruda (CE).

Para integrantes do bloquinho de esquerda, apesar das diversas queixas quanto à intransigência do PT em fechar alianças municipais, os gestos de Ciro são vistos como isolados - ele não seria, dessa forma, um porta-voz das insatisfações do grupo. No último Congresso do PSB, Ciro fez um forte discurso contra as elites, enalteceu os ganhos do governo Lula, mas não bateu no PT. Em São Paulo, apesar de não ter trabalhado ativamente - as articulações foram conduzidas pelo presidente do PSB, Eduardo Campos (PE) - Ciro não se opôs à indicação de Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para vice da petista Marta Suplicy.