Título: Investimento federal cresce, mas ainda é baixo em relação ao PIB
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Fonte: Valor Econômico, 30/06/2008, Brasil, p. A2

O governo federal passou a investir com mais força desde o ano passado, quando foi lançado o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas os valores ainda são bastante modestos. De janeiro a maio deste ano, a União investiu R$ 7,431 bilhões, o equivalente a 0,65% do Produto Interno Bruto (PIB), 23,9% a mais que no mesmo período de 2007, quando as inversões corresponderam a 0,6% do PIB. Os números são do Tesouro Nacional. Para analistas, o volume elevado de despesas correntes e a falta de flexibilidade no Orçamento ajudam a explicar o baixo volume de investimentos da União.

Para o economista Celso Toledo, sócio da E2 Economia, dada a atual estrutura fiscal, não há muito o que fazer para elevar o nível do investimento público. "Há uma rigidez muito grande", diz ele.

Toledo nota que o governo tem três grandes despesas (incluindo aí as financeiras) - juros, aposentadorias e pessoal - que oferecem pouquíssima margem de manobra para o administrador público. Nesse cenário, o PAC pode ajudar a aumentar um pouco as inversões públicas, diz ele, mas não é possível uma elevação significativa. De 2007 até o dia 21 deste mês, os investimentos do PAC com recursos do orçamento federal totalizaram R$ 11,1 bilhões, o equivalente a apenas 34,2% dos recursos já empenhados para esse fim, segundo a ONG Contas Abertas.

O resumo da história é que o consumo do governo deixa pouco espaço para o investimento público, como nota a analista para a América Latina da Economist Intelligence Unit (EIU), Érica Fraga. Ela chama a atenção para o fato de que o consumo público no Brasil - equivalente a 19,7% do PIB em 2007 - é elevado para padrões internacionais. De uma lista de 145 países, o nível de consumo do governo no Brasil é o 34º. Ao mesmo tempo, o investimento (tanto o público como o privado) fechou 2007 em 17,6% do PIB, o que faz o Brasil aparecer na 122ª colocação da lista de 145 países.

É um quadro muito diferente do dos outros Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). A China investe 40,4% do PIB e o consumo do governo é de 14,1% do PIB. Segundo analistas, o nível elevado de investimento é um dos motivos que explicam a sustentabilidade do crescimento da China taxas superiores a 10% por tantos anos seguidos.

Para Érica, como o Brasil tem um governo que consome demais, "o setor público e o setor privado disputam recursos disponíveis na economia", o que "pressiona o custo do dinheiro". Uma das conseqüências negativas desse processo é que pioram as condições de financiamento para as empresas, com "impacto negativo sobre as decisões de investimento".

Joaquim Elói de Cirne de Toledo, diretor de Gestão de Recursos de Terceiros da Nossa Caixa, diz que o consumo do governo no Brasil é de fato elevado e limita o espaço para o investimento público, mas observa que ele tem registrado até ligeiras quedas nos últimos anos. Depois de bater em 19,9% do PIB em 2005, caiu para 19,8% do PIB em 2006 e para 19,7% do PIB em 2007. "No primeiro trimestre deste ano, o consumo do governo cresceu 5,8%, o mesmo ritmo de expansão do PIB (na comparação com o mesmo período de 2007."

Para Cirne de Toledo, também seria importante uma desaceleração na velocidade de crescimento do consumo privado, que avança a taxas robustas. Com o investimento e o consumo (privado e público) crescendo bastante, as contas externas têm se deteriorado rapidamente - o superávit em transações correntes registrado de 2003 a 2007 tem se transformado em déficits cada vez maiores, principalmente por causa do aumento das importações. Com isso, para preservar a alta do investimento sem deterioração abrupta das contas externas, a saída é fazer uma política fiscal mais restritiva e colocar um freio na expansão do consumo privado, com medidas que façam o crédito crescer menos.

Cristina Reis, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tem uma visão diferente do processo. Para ela, o investimento público segue baixo porque está "engessado por um regime macroeconômico baseado em superávit fiscal, câmbio flexível e metas de inflação". "É importante e necessário que, como na maioria dos países civilizados, o governo discuta política fiscal no sentido amplo e não apenas persiga uma meta de superávit primário isoladamente, que acaba sendo ajustada à custa do investimento", diz. Segundo ela, a análise do período de 1950 a 1979 mostra que inversões públicas levaram ao crescimento das inversões privadas.