Título: Espanhóis dão o tom, outra vez, no leilão de transmissão
Autor: Capela , Maurício
Fonte: Valor Econômico, 30/06/2008, Empresas, p. B6
As construtoras espanholas dominaram o leilão de linhas de transmissão do governo federal, realizado na última sexta-feira na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Sozinhas ou por meio de consórcios, Isolux, Abengoa e Elecnor arremataram quase dois terços dos cerca de 3 mil quilômetros que foram colocados em licitação. "Foi uma repetição do quadro dos pregões anteriores", afirma a Ativa Corretora.
Além da expressiva participação, a vitória dos grupos espanhóis traz outras responsabilidades. Isso, porque caberá a eles conectar uma parcela significativa do Brasil ao Sistema Interligado Nacional de energia. Hoje, algumas partes do país, principalmente as situadas na região Norte, pertencem ao chamado sistema isolado e só tem energia por meio da geração térmica a óleo combustível. Essa forma, inclusive, de prover o insumo sai da conta de luz de cada um dos brasileiros que estão conectados ao sistema interligado. É por meio da Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC) que o restante do país financia a luz de algumas outras regiões.
Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a previsão de arrecadação da CCC para esse fim é de R$ 3 bilhões neste ano. E espera-se que com a entrada em operação dessas linhas, que poderá variar entre 15 e 36 meses, a conta da CCC caia para R$ 1,8 bilhão ao ano, usando como parâmetro o orçamento de 2008.
Só para se ter uma idéia do tamanho da CCC, a capital amazonense de Manaus drena R$ 1,5 bilhão atualmente dessa conta. E com a implantação das linhas do lote C, que vão levar energia até Manaus, o consumo dessa cidade cairia para R$ 300 milhões por ano, tendo como base o orçamento da CCC para 2008.
Foi justamente o lote C, arrematado pelo consórcio Amazonas, que deu mais trabalho no processo de licitação. Primeiro, porque o bloco não teve interessados no momento da venda, já que o Amazonas somente voltou à disputa depois de obter recurso judicial. Sendo assim, o C foi ao pregão, após as negociações dos 11 lotes anteriores. E foi até por isso que o Amazonas ficou com a obra praticando um deságio pequeno, de 7%, enquanto o desconto médio do leilão foi de 20,1%. O consórcio tem na sua formação a espanhola Abengoa (30%), as estatais Eletronorte (30%) e Chesf (19,5%), além do Fundo de Investimentos em Participações Brasil Energia (20,5%).
Mas o C sozinho não é capaz de diminuir drasticamente a conta da CCC. Essa taxa somente vai ser reduzida em R$ 2,1 bilhões no futuro, porque o governo licitou os blocos A e B, que tiveram como único vencedor a Isolux. A construtora espanhola ficou com o empreendimento, praticando um deságio médio de 21%.
No entanto, há boas chances de a Isolux avançar sobre o lote C. Isso, porque o diretor-presidente da Eletronorte, Jorge Palmeira, admitiu que poderá firmar parcerias com a vencedora dos lotes A e B. O C é uma continuação das linhas do A e B. Juntos, eles completam um linhão de 1,829 mil quilômetros. "De fato, há uma complementaridade entre o A, B e o C", destaca o relatório da Ativa Corretora.
A estratégia de buscar alianças é algo que também não é descartada pela colombiana ISA, que controla a Cia. de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (Cteep) no Brasil. Por meio da Cteep, a empresa ficou com cinco blocos, que somam 174,5 quilômetros de extensão. O deságio médio praticado pelo grupo colombiano foi de 33,7%.
"O resultado foi neutro para a Cteep. A empresa, novamente, praticou descontos significativos e adquiriu concessões próximas à região de atuação", afirma o relatório da Ativa Corretora. A companhia levou os empreendimentos ao aceitar uma Receita Anual Permitida (RAP) de R$ 29,3 milhões por todos eles. A RAP é uma espécie de faturamento.
Mas acordos entre grupos não deverão ser exceção nessa licitação. Recentemente, a Cteep admitiu que sua estratégia para o pregão de sexta-feira poderia passar por alianças com construtoras, desde que o projeto desejado apresentasse complexidade técnica ou grande extensão. Procurada, a empresa não comentou o leilão.
Mas a Cteep já tem alguma experiência na formatação de parcerias. No início de junho, a controlada do grupo colombiano fechou um acordo com as construtoras espanholas Isolux e Cymi para colocar de pé 720 quilômetros de linhas de transmissão, que vão conectar as cidades brasileiras de Colinas (TO) e São João do Piauí (PI). Esse trecho foi adquirido no leilão realizado pelo governo federal em novembro do ano passado e o custo da obra é estimado em R$ 533,6 milhões. A entrada desses grupos espanhóis, contudo, ainda depende do sinal verde da Aneel.
A espanhola Elecnor também não saiu de mãos vazias do leilão. Arrematou uma linha de 72 quilômetros de extensão, ligando municípios dos estados de Goiás e Minas Gerais. E também conquistou o bloco L, que reúne uma subestação no Estado do Rio de Janeiro. (colaborou Rafael Rosas, do Valor Online, do Rio)