Título: Gasto maior com juros da dívida deve anular superávit primário adicional
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2008, Brasil, p. A2

O aumento no gasto com juros da dívida publica deverá consumir praticamente todo o superávit primário adicional anunciado pelo governo para este ano. O Banco Central aumentou em 0,4 ponto percentual (p.p.) do Produto Interno Bruto (PIB), de 5,4% para 5,8%, a projeção oficial para os gastos com juros. A despesa adicional representa 80% do aumento na meta de superávit primário do ano, que foi de 3,8% para 4,3% do PIB.

Os gastos com juros vão subir, em boa medida, devido ao atual ciclo de aperto monetário. Na suas projeções, o BC não discrimina a magnitude desse fator. Mas a política monetária contracionista tem impacto direto nos juros pagos em títulos indexados pela taxa Selic. Também aprofunda a valorização da taxa de câmbio, reduzindo a remuneração do governo em seus ativos em dólar - o setor público é credor em moeda estrangeira.

Estatísticas divulgadas ontem pelo BC mostram que o governo já fez uma parcela importante do esforço fiscal necessário para entregar um superávit primário de 4,3% do PIB neste ano. O superávit primário acumulado pelo setor público nos 12 meses encerrados em maio chegou a 4,34% do PIB, ou R$ 116,529 bilhões.

Os resultados de maio, em particular, foram bastante positivos. O superávit primário somou R$ 13,207 bilhões, o valor nominal mais alto já registrado para um mês de maio desde o início da atual série estatística do BC, de 1991. O governo central deu uma contribuição menos expressiva que nos meses anteriores, com R$ 4,916 bilhões, ante R$ 16,861 bilhões em abril. As estatais, que vinham apresentando resultados mais fracos, fizeram um superávit de R$ 4,586 bilhões.

Os governos regionais também se saíram bem, com um superávit primário recorde para maio, de R$ 3,704 bilhões. O destaque foram os governos estaduais, com superávit de R$ 3,535 bilhões.

O forte primário feito pelos Estados surpreende porque em meses recentes eles vinham apresentando um resultado fiscal um pouco menos favorável. Os governadores estariam ampliando os gastos para ajudar aliados políticos nas eleições municipais. Os dados divulgados ontem, porém, ainda não permitem afirmar que houve mudança nessa expansão eleitoral de despesas. Pelo que tudo indica, os Estados continuam gastando, mas as receitas, que já vinham se expandindo fortemente graças ao aumento da arrecadação com o ICMS, ganharam novo impulso com a transferência de "royalties" do petróleo. Não há estatísticas sobre os "royalties" de maio, mas se sabe que, até abril, essas transferências somaram R$ 8,7 bilhões.

Ao mesmo tempo em que o esforço fiscal aumentava, porém, subiam os encargos com a dívida pública, que chegaram a R$ 16,173 bilhões em maio. É a primeira vez desde fevereiro que os gastos mensais com juros ficam acima do superávit primário. A despesa supera em 8,7% os R$ 14,870 bilhões gastos em abril, mas houve uma queda de 3,42% em relação aos R$ 16,747 bilhões observados em maio de 2007.

O aumento da despesa com juros em maio é explicada principalmente pela valorização de 3,43% na taxa de câmbio no mês. A perda do BC em contratos de "swap" cambial, em que a autoridade monetária assume posição comprada em dólar, foi de R$ 2,014 bilhões. A aceleração da inflação medida pelo IPCA, de 0,55% para 0,79% entre abril e maio, também teve impacto importante. O gasto com a dívida indexada ao IPCA subiu de R$ 3,072 bilhões para R$ 3,726 bilhões entre abril e maio.

A aceleração inesperada da inflação, porém, causa mais benefícios do que custos para o governo, já que melhora o principal indicador de solvência fiscal, a dívida líquida do setor público. A inflação aumenta o valor do PIB nominal e reduz o valor relativo da dívida. De abril para maio, a dívida líquida do setor público recuou, de 41% para 40,8% do PIB. A projeção do BC é que, no fim deste ano, o indicador fique em 40,5% do PIB, o que significará uma queda de 2,2 pp. em relação aos 42,7% do PIB verificados em 2007. Se o governo fizer um superávit primário de 3,8% do PIB em vez dos 4,3% do PIB recentemente anunciados, a dívida terminará o ano em 41% do PIB. Em maio, foi registrado um déficit nominal de R$ 2,966 bilhões. Mas, no período janeiro a maio, ainda há um superávit nominal, de 0,34% do PIB.