Título: BIS teme estouro da meta de inflação
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2008, Finanças, p. C1

O Banco de Compensações Internacionais (BIS) alerta para aceleração mais rápida nas economias emergentes do que nas industrializadas e aponta temores de que no Brasil a "brusca aceleração" dos preços supere o teto da meta de inflação fixada pela autoridade monetária para 2008.

A instituição também destaca a deterioração das contas correntes do país. Segundo cálculos do BIS, elas devem passar de um saldo de US$ 3 bilhões no ano passado para um déficit de US$ 22 bilhões este ano, diante do cenário financeiro global mais conturbado.

O banco dos bancos centrais projeta crescimento de 4,8% do Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil este ano, abaixo dos 5,4% de 2007. Isso enquanto as turbulências no sistema financeiro mundial e desaceleração do crescimento nos Estados Unidos "ensombrecem" as perspectivas econômicas dos emergentes em geral.

A inflação projetada para o Brasil é de 5,1%, maior que os 4,5% de 2007. O BIS nota que a meta de inflação para este ano já foi superada em 15 dos 17 maiores emergentes. As previsões também estão em alta, refletindo aumentos salariais, antecipação de novas altas de preços dos alimentos e de energia, e tensões ligadas à demanda.

Na América Latina, a taxa de inflação pulou de 4,1% para 5,7% em um ano e na Ásia dobrou de 3% para 6%.

Na visão do BIS, outro complicador é o numero de emergentes que resistem à apreciação de suas moedas. Com a redução das taxas de juros americanas, a diferença de custo do capital aumentou em relação ao dólar. Isso atraiu novas entradas de capitais, tornando mais difícil o endurecimento monetário para controlar a aceleração da inflação.

Em abril, a diferença das taxas médias de juros aumentou a 7,5 pontos para a América Latina e 1,1 ponto para a Ásia. Além disso, a forte desvalorização do dólar provocou para boa parte dos emergentes perdas de valorização sobre suas reservas cambiais. O BIS nota que a progressão das reservas foi particularmente forte na China e no Brasil.

De acordo com o texto, o aumento dos preços dos produtos de base mostra o dinamismo da demanda mundial, e subvenções sustentam a demanda de petróleo, cuja oferta é limitada. Nesse cenário, estima que fatores estruturais vão manter altas as cotações dos produtos de base.

Em países como o Brasil e a Austrália, a moeda valorizada tem sido apoiada pelas robustas exportações de commodities e melhoras nos termos de comércio, diz o BIS. Numa perspectiva de longo prazo, estima que muitas moedas estão em níveis significativamente diferente de suas médias históricas em termos reais.

Também a América Latina tem contração do excedente. As turbulências globais até agora não tiveram efeito sobre o fluxo de capitais privados para os emergentes. As entradas líquidas de capitais privados (entrada bruta menos saída bruta sob forma de Investimento Direto Estrangeiro, investimento de portfólio e outros) aumentaram 2,75% na América Latina (2,9% do PIB).

As entradas brutas também foram ainda mais importantes. Ao mesmo as saídas brutas na América Latina atingiram recordes históricos de 4,5% do PIB.

O banco dos bancos centrais alerta para três fontes de vulnerabilidade dos emergentes. Primeiro, suas exportações dependem ainda em boa parte dos EUA e a China pode compensar apenas parcialmente uma queda de importações americanas.

Segundo, a baixa das exportações pode afetar a demanda interna. Considera que a margem é às vezes limitada nos países para um impulso orçamentário, e a alta do endividamento privado poderia trazer problemas.

Enfim, persiste o risco de virada dos fluxos de capitais. Isso pode acontecer ainda mais se os grandes bancos tiverem problemas nas matrizes.

A situação é ligeiramente diferente na América Latina, onde o credito bancário ao setor privado aumentou 7% em termos reais, mas em grande parte foram financiadas pelos depósitos locais.

Durante as reuniões das principais autoridades monetárias, em Basiléia, houve consenso de que a causa fundamental dos problemas atuais da economia mundial foi o prolongado crescimento de credito "de forma excessiva e imprudente".

Malcolm Kignith, diretor-geral do BIS prestes a deixar o cargo, alertou que a saúde dos bancos na Europa e nos EUA continua a preocupar. Isso não exclui que alguns bancos precisam fazer mais depreciação de ativos. E nesse cenário, restará aos emergentes se preparar para um crescimento vigoroso, mas "ligeiramente enfraquecido".