Título: Consolidação afeta preços e margens do leite
Autor: Rocha , Alda do Amaral
Fonte: Valor Econômico, 04/07/2008, Agronegócios, p. B16

O movimento de consolidação no setor de lácteos alterou o comportamento dos preços do leite no país e tem reflexos negativos nas já apertadas margens das indústrias.

Nos Estados que registraram operações importantes de aquisições, como Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo, os preços do leite pagos ao produtor ficaram mais firmes que em outras regiões brasileiras. Agora, por exemplo, quando as cotações já começam a arrefecer em bacias leiteiras como Goiás, os valores ainda estão estáveis ou até sobem nessas regiões onde aumentou a disputa por matéria-prima.

Outro efeito da consolidação - iniciada no segundo semestre de 2007 - é uma oferta elevada de lácteos atualmente, o que deixa as indústrias estocadas. Segundo fontes do setor, algumas empresas que foram vendidas ampliaram a captação de leite para "fazer faturamento" e ficarem mais valorizadas na hora da negociação.

Maurício Nogueira, especialista em leite da Scot Consultoria, afirma que antes da onda de aquisições, os preços eram praticamente iguais em São Paulo, Goiás e Minas Gerais. Isso mudou depois que empresas começaram a comprar unidades em outros Estados para "equilibrar o mix". "[O preço em] Goiás foi o primeiro que caiu. São Paulo e Minas estão mais caros".

Esse movimento das empresas para garantir matéria-prima beneficia os produtores de leite, observa Nogueira. Mas do lado das indústrias de lácteos, que têm as margens tradicionalmente pequenas, o novo quadro não agrada. Um empresário paulista diz que os preços ao produtor hoje estão "artificialmente" altos.

Segundo ele, diante do cenário de oferta elevada de matéria-prima no Brasil e mercado internacional menos aquecido que no ano passado, os preços pagos aos produtores não deveriam estar tão mais altos que em 2007.

Levantamento da Scot mostra que em Minas Gerais, o valor pago em junho passado - pelo leite entregue em maio - é 22,5% superior ao de igual mês do ano passado. Isso apesar de a produção de leite estar em alta. Segundo o IBGE, no primeiro trimestre deste ano, os laticínios sob inspeção sanitária federal, estadual ou municipal adquiriram 4,893 bilhões de litros de leite, aumento de 9,2% sobre o mesmo período de 2007.

Os preços ao produtor mais aquecidos em São Paulo também são resultado do decreto do governo paulista, que elevou de 7% para 18% o ICMS do leite longa vida proveniente de outros Estados e zerou o ICMS do produto processado em São Paulo. Isso valorizou os preços do leite ao pecuarista do Estado.

"Há empresas trabalhando com margens muito baixas ou negativas", comentou o empresário. Um executivo da indústria em Minas diz que a margem líquida das empresas do setor "em anos bons" alcança 5%. Hoje está na casa dos 2% a 3%. As margens também estão mais apertadas porque a alta dos preços do leite longa vida no varejo já faz o consumidor se retrair. Com isso, as indústrias perdem poder de barganha nas vendas às redes e ao atacado. Em junho, segundo a Scot, os preços no atacado paulista recuaram 0,7%.

Diante do quadro menos favorável para a indústria de lácteos - e quando a capacidade de fazer caixa de uma empresa como a Parmalat é colocada em xeque -, há quem acredite que a euforia das aquisições dará lugar a uma postura mais cautelosa por parte das empresas. De qualquer forma, dificilmente o ritmo de operações de 2007 e do primeiro semestre deste ano se repetiria. Uma das mais agressivas em aquisições nesse período foi a Perdigão, que comprou a Eleva, com unidades no Rio Grande do Sul e Goiás, e a Cotochés, em Minas Gerais. Já a Parmalat comprou a paulista Só Nata, a Ibituruna em Governador Valadares (MG), além do negócio Poços de Caldas, da Danone.

Outra atuação agressiva teve a gaúcha Bom Gosto, que desde julho de 2007 já fez quatro aquisições. A empresa comprou em Minas a DaMatta e o Laticínios Santa Rita. No Rio Grande do Sul, adquiriu a Nutrilat e a Coorlac. Além disso, o Bertin comprou a Vigor em outubro passado, a Nilza ficou com a mineira Montelac, numa disputa com a Parmalat este ano e a GP Investimentos, adquiriu o goiano Morrinhos.