Título: Cenário para a inflação será mais benigno no 2º semestre
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2008, Brasil, p. A3

O cenário para a inflação neste ano continua nublado, mas a expectativa dominante no momento é de que o segundo semestre será menos desagradável do que o primeiro. Os alimentos devem perder um pouco de fôlego, e o arrefecimento da atividade econômica também tende a dar algum refresco para os índices inflacionários.

Os analistas destacam, porém, que há um elevado grau de incerteza nas projeções, principalmente por causa das dúvidas quanto ao comportamento das commodities. Além disso, os preços administrados (como tarifas públicas) ficarão mais pressionados, por terem como uma das referências para o reajuste os Índices Gerais de Preços (IGPs), que em 12 meses acumulam altas próximas de 15%.

Mesmo com a perspectiva de um período de preços mais comportados daqui para frente, vários bancos e consultorias já prevêem que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) vai superar 6,5%, o teto da banda de tolerância da meta perseguida pelo Banco Central (BC). O Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco projeta alta de 6,75% para o indicador em 2008.

Para os economistas do banco, a boa notícia é que a inflação vai ser mais baixa no segundo semestre. Considerando um IPCA de 0,83% em junho (o número oficial será divulgado na quinta-feira), o Bradesco estima que os alimentos subirão 3,75% entre julho e dezembro, bem abaixo dos 8,8% registrados de janeiro a junho. "Há uma expectativa melhor para os preços de algumas commodities agrícolas, e alimentos in natura como o tomate não devem ter um segundo semestre tão ruim como o primeiro", dizem os economistas do banco. De janeiro a junho, o tomate subiu mais de 100%. Já as perspectivas para as carnes seguem negativas, segundo o Bradesco.

O economista-chefe da SLW Corretora, Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, também espera uma moderação na alta dos alimentos. Ele estima que os produtos não duráveis do IPCA (dos quais os alimentos são 82%) devem ter alta no segundo semestre de 9,3% em termos anualizados, um recuo forte em relação aos 17% do primeiro (tambem anualizados).

A grande questão é que há muita incerteza quanto a essas previsões, como reconhecem tanto Gomes Filho como os economistas do Bradesco. No primeiro semestre, o índice CRB, que reúne 19 commodities (não apenas agrícolas), subiu 29%. A economista Basiliki Litvac, da MCM Consultores Associados, diz que houve uma quebra de padrão no comportamento dos preços das commodities, tornando incertas as previsões para esses produtos. "Quem acertar para onde vão as commodities vai acertar a inflação do ano, mas há muita incerteza quanto ao que vai ocorrer com esses preços", resume ela.

Basiliki prevê um IPCA de 6,6% em 2008. Para que esse número seja factível, o indicador tem que subir a uma média mensal de 0,45% entre julho e dezembro, abaixo do 0,61% do primeiro semestre (considerando aí um IPCA de 0,8% em junho). Nessa previsão está embutida uma desaceleração significativa da inflação de alimentos, de 1,38% ao mês do primeiro semestre para 0,65% no segundo.

Outra commodity cujo comportamento é incerto é o petróleo. Por enquanto, não está no radar dos analistas um novo reajuste dos preços dos combustíveis, mas a escalada das cotações pode mudar esse quadro. Gomes Filho acredita que, se o petróleo ficar nos atuais níveis, uma alta de 10% na gasolina e de 15% no óleo diesel pode se materializar. Ele lembra que um aumento de 10% da gasolina na refinaria tende a provocar uma elevação direta de 0,44 ponto percentual no IPCA e indireta de 0,16 ponto. "Se isso ocorrer, a minha projeção para o IPCA no ano subiria de 7,1% para 7,7%." No primeiro semestre, a Petrobras reajustou a gasolina e o diesel, mas reduziu a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para tentar neutralizar o aumento.

Com o ciclo de alta dos juros em curso, a expectativa é de que a pressão de demanda diminua um pouco nos próximos meses. Para o Bradesco, o núcleo do IPCA calculado pela exclusão de alimentos e preços administrados - um bom termômetro da inflação de demanda - atingirá uma taxa anualizada de 6% no segundo semestre, abaixo dos 7,06% do primeiro.

Gomes Filho projeta uma alta mais modesta dos preços de serviços (aluguel, condomínio, cabeleireiro, conserto de automóvel) no segundo semestre, de 6,2% em termos anualizados. No primeiro, a alta ficou em estimados 7,9%, refletindo a demanda mais aquecida.

Que fique claro que o cenário deverá ser mais róseo para a inflação ao longo do segundo semestre, mas não no curtíssimo prazo. A taxa do IPCA de junho, que sai na quinta-feira, deve ficar entre 0,8% e 0,9% e a de julho pode ser de 0,7%, de acordo com o Bradesco. Para o IGP-M deste mês, o banco aposta numa alta de 1,5%.

Os preços administrados deverão mostrar trajetória inversa à dos alimentos e serviços. Comportados no primeiro semestre, com alta anualizada de 2,9%, devem subir 5,1% de julho a dezembro, nessa base de comparação, segundo Gomes Filho. Influenciados em maior ou menor medida pelos IGPs, os administrados já começam a subir com mais força. A energia elétrica na região metropolitana de São Paulo, por exemplo, subiu em média 8,12%, a partir da sexta-feira.

Com incertezas sobre os preços das commodities, há o risco de altas ainda mais salgadas dos IGPs. Gomes Filho prevê um IGP-M de 14,5% no ano. O Bradesco é mais otimista, acreditando que, depois de bater em 14,84% no acumulado em 12 meses até agosto, o IGP-M deve recuar um pouco, fechando o ano em alta de 12%. Nessa conta está a expectativa de uma trajetória mais benigna para os preços de commodities. Basiliki aposta num IGP-M entre 11% e 12% neste ano.

Para o IPCA, o pior momento do acumulado em 12 meses deverá ser em novembro, quando o indicador mostrará alta de 7,1% na conta do Bradesco. Isso tende a ocorrer porque a inflação do segundo semestre de 2008 será mais alta do que na maior parte do mesmo período de 2007, com exceção de dezembro. O Bradesco espera um IPCA de 0,45% no último mês deste ano, bem abaixo do 0,74% de dezembro de 2007. Com isso, o IPCA deve fechar o ano em 6,75%.