Título: No Rio, Crivella prega liberdade religiosa
Autor: Grabois, Ana Paula
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2008, Política, p. A10
Numa tentativa de vencer a resistência do eleitorado devido ao viés religioso de sua candidatura a prefeito do Rio, o senador e bispo licenciado da Igreja Universal Marcelo Crivella (PRB) abriu ontem a campanha eleitoral com uma entrevista à imprensa onde leu a "Carta ao Povo do Rio de Janeiro", idealizada pelo marqueteiro Duda Mendonça e nos moldes da "Carta ao Povo Brasileiro", compromisso da campanha presidencial de 2002 do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
A diferença entre as duas cartas é que enquanto Lula se comprometia com a estabilidade econômica, Crivella foca a liberdade religiosa, tentando desvincular-se da identidade evangélica e diminuir a rejeição que possui em grande parte do eleitorado carioca. Na carta, Crivella, do mesmo partido do vice-presidente José Alencar, se compromete a defender a tolerância religiosa, a repudiar qualquer manifestação homofóbica e a formar um secretariado técnico, sem a participação de nenhum membro da Igreja Universal. "O que pretendo é dar uma demonstração clara e inequívoca de que não serei de forma alguma o prefeito de uma instituição religiosa. Mas sim de todas as crenças, de todas as religiões, de todos os cariocas."
Foi a primeira entrevista de Crivella após o caso do envolvimento de 11 militares do Exército na morte de três jovens do Morro da Providência, onde ele mantinha o projeto Cimento Social, executado pelo Exército com recursos repassados pelo Ministério das Cidades. As obras do projeto foram embargadas pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ).
O candidato, que foi militar do Exército durante oito anos, defendeu a participação das Forças Armadas no apoio às obras de caráter social e de infra-estrutura, como o Cimento Social. Ele negou qualquer viés eleitoral no projeto do Morro da Providência e disse que a burocracia do governo atrasou as obras e "coincidiu com o período eleitoral". Também afirmou que a distribuição de panfletos sobre a obra com a sua foto foi apenas uma prestação de contas à sociedade como senador. "Fui candidato a partir da minha convenção. Eu não era candidato. O folheto não traz o meu número."
Além da carta, Duda Mendonça tenta relacionar Crivella a Lula no jingle de campanha, com o refrão "Crivella lá". O senador se colocou radicalmente contra o uso de drogas: "Não sei como se pode defender caminhada pela liberação da maconha", disse. Apesar de repudiar a discriminação aos homossexuais na carta, ele disse que é uma opção que discorda. "Discordar não quer dizer discriminar".
Em pesquisa divulgada ontem pelo Datafolha, o senador do PRB manteve liderança sobre os demais dez candidatos, com 26% das intenções de voto, mesmo após o episódio no Morro da Providência. Crivella, entretanto, tem a maior taxa de rejeição, de 29%. A ex-deputada federal Jandira Feghali, da coligação PCdoB-PTN-PHS-PSB, aparece em segundo lugar com 17% das intenções de voto e índice de rejeição de 13%.
Segundo o levantamento, feito no dia 3 de julho, estão empatados tecnicamente os candidatos Solange Amaral (DEM-PTC-PMN), com 10%, Eduardo Paes (PMDB-PP-PSL-PTB), com 9%, e Fernando Gabeira (PV-PSDB-PPS), com 7%. O candidato do PT, Alessandro Molon, tem 3%, mesmo percentual de Chico Alencar (PSOL-PSTU). Paulo Ramos (PDT) ficou com 1%.
Ontem, a maioria dos candidatos começou a disputa nas ruas da zona sul e do subúrbio. Jandira Feghali, Fernando Gabeira e Solange Amaral iniciaram o dia na orla da zona sul. Jandira, em caminhada em Copacabana, pediu rigor na fiscalização dos candidatos ligados a máquinas de governo. A candidata disse esperar alianças no segundo turno com os partidos da base do governo federal. Dos 11 candidatos a prefeito no Rio, 6 são de partidos da base governista.
Antes de caminhar em Copacabana, Gabeira fez uma "bicicleata" pela orla da zona sul sobre um patinete elétrico e defendeu o aluguel de patinetes como alternativa de transporte.
Solange Amaral disse que chegará ao segundo turno. "Não será com o herdeiro do bispo Macedo", afirmou em referência a Crivella, sobrinho de Macedo. Ela disse não se importar se os concorrentes tentarem vincular sua candidatura ao prefeito Cesar Maia (DEM), que termina seu terceiro mandato desgastado politicamente. "Cesar Maia é pessoa importante, com um ciclo de realizações pela cidade. Serei a prefeita pós-Cesar Maia."
Eduardo Paes começou o dia em uma missa na Igreja de São Jorge, em Quintino, no subúrbio. "Vim pedir a proteção de Deus antes de caminhar, de pedir votos", disse Paes, antes de seguir para Padre Miguel. O deputado federal Chico Alencar foi ao Aterro do Flamengo, onde deu uma aula de história da cidade. Depois, encontrou-se com o presidente do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile. O deputado estadual Alessandro Molon caminhou em Santa Teresa e em Bangu, bairro onde também esteve o deputado estadual Paulo Ramos." (Com agências noticiosas)