Título: Denúncias de corrupção trazem presidente da multinacional ao país
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2008, Empresas, p. B7
A repercussão das acusações de que ex-representantes do grupo multinacional francês Alstom teriam pago propinas para obter contratos em países como Brasil, Venezuela e Cingapura levou o presidente mundial da companhia, Patrick Kron, a aterrissar em São Paulo na semana passada. "Vim dizer que a Alstom não tem uma doença vergonhosa, não corrompe agentes públicos e deveria ser tratada de forma justa e equilibrada, com base em fatos e não em alegações", disse na sexta-feira.
Em uma visita de pouco mais de 24 horas, entre quinta e sexta-feira, Kron repetiria a declaração de forma exaustiva, para funcionários, clientes e vários jornalistas. O temor da Alstom é de que as investigações que estão sendo feitas pela Justiça suíça, com o apoio da Justiça francesa, possam acabar prejudicando os negócios da multinacional no Brasil. Um dos maiores interesses do grupo hoje é a licitação do trem de alta velocidade.
As investigações envolvendo a Alstom se tornaram públicas há dois meses, quando a imprensa publicou que documentos encontrados na Suíça indicavam que a companhia poderia ter pago propina para obter contratos na Ásia e na América Latina entre 1995 e 2003. Até agora, foram mencionadas negociações envolvendo executivos da Cegelec, companhia adquirida pela Alstom em 1998 e revendida em 2001.
"Estamos falando de negócios da década de 90, de empresas que foram revendidas, de pessoas que eu não conheço e que já saíram da empresa", explica Kron, que chegou à presidência da Alstom em 2003. Segundo ele, cabe à Justiça se encarregar da investigação. "A Justiça tem todos os meios de descobrir tudo o que quiser. Eu não tenho como. Não posso telefonar para essas pessoas, fazer perguntas."
A Suíça investiga ex-representantes da Alstom desde 2004. Naquele ano, o Ministério Público suíço investigava ligações de um banqueiro com o cartel de Medellín quando descobriu dossiês na casa de uma secretária do banco indicando ligações entre o banqueiro e funcionários da Alstom. A companhia não fazia parte do processo da Justiça suíça, e, segundo Kron, foi iniciativa da Alstom entrar como litisconsorte (parte no processo). "Fizemos isso, por um lado, para termos acesso aos dossiês dos processos e, por outro, para defendermos o nome da nossa companhia", afirmou Kron. O inquérito sobre o caso deve ser concluído em agosto.
O presidente da Alstom informou que tomou a iniciativa de realizar uma auditoria interna e que "os resultados não confirmam, de forma alguma a história de que a Alstom teria montado um esquema de corrupção". Kron não deu detalhes sobre a auditoria.
Na imprensa, surgiram até agora operações suspeitas em dois contratos, com a Eletropaulo e com o Metrô. Documentos em poder do Ministério Público da Suíça indicam que representantes da Alstom estariam dispostos a pagar 7,5% para obter um contrato de R$ 110 milhões com a Eletropaulo em 1998, durante a gestão de Mário Covas (PSDB) em São Paulo. Claudio Mendes, amigo do ex-governador Orestes Quércia, tem negado que seja ele o Claudio Mendes que aparece em comunicados em poder das autoridades suíças. José Geraldo Villas Boas, ex-presidente da Cesp, admitiu que recebeu na Suíça US$ 1,4 milhão da Alstom entre 1998 e 2001, mas alegou que ficou com apenas 17,5% desse dinheiro e que o pagamento se referia a consultoria realizada.
Patrick Kron não quis comentar nada sobre os envolvidos. Perguntado se as acusações poderiam ter alguma relação com a política brasileira, o presidente da Alstom limitou-se a dizer que percebe que a tensão na mídia é muito maior no Brasil do que nos outros países (que são alvo das investigações). "Se alguém tem interesse nisso, não posso saber." (RB)