Título: BC reforça eficácia do juro para combater a inflação
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2008, Finanças, p. C3

O Banco Central (BC) voltou a reeditar sua "cartilha" que mostra que a política monetária continua eficaz para esfriar a economia e controlar a inflação. O documento, cuidadosamente preparado dentro da estratégia de comunicação do BC, procura conter a deterioração das expectativas inflacionárias e a crescente descrença do mercado financeiro na política juros.

A cartilha é um texto publicado no relatório de inflação de junho, com o título "Impactos da estrutura a termo da taxa de juros sobre a economia". Didaticamente, ele descreve como as decisões de política monetária chegam à atividade econômica e aos índices de preços. Números e gráficos sustentam a tese de que, no atual ciclo de aperto monetário, esses mecanismos estão operando dentro do esperado.

Duas outras cartilhas semelhantes foram publicadas no passado recente, quando, de forma parecida, analistas econômicos duvidavam que os movimentos então feitos na taxa básica de juros seriam eficazes para estimular a economia (em 2003) ou controlar a inflação (2005).

De um mês para cá, o mercado financeiro passou a cobrar uma postura mais dura da política monetária para conter a inflação. Analista econômicos, que inicialmente acreditavam que o ciclo de aperto monetário iria ser de apenas 2 pontos percentuais, passaram a projetar alta de 4 pontos ou mais nos juros básicos.

A cartilha do BC busca fazer o mercado financeiro considerar nas suas projeções que as decisões de política monetária não têm efeito instantâneo - elas levam algum tempo para chegar à atividade econômica e à inflação.

O texto reforça alguns pontos essenciais sobre a política monetária. Primeiro, que o BC só determina a taxa básica de juros, e o mercado determina as demais taxas. As demais taxas podem se desviar da taxa básica, antecipando a reação do BC à aceleração da inflação. No atual ciclo de aperto monetário, isso aconteceu, diz o BC. Ou seja, mesmo antes de o BC aumentar os juros de fato, já estava em curso uma política monetária contracionista, com repercussões sobre o crédito e a demanda.

O BC diz, na cartilha, que os juros cobrados pelos bancos nas operações de crédito mais longas - como crédito pessoal e financiamentos de veículos - já subiram, refletindo a alta dos juros do mercado financeiro, que, por sua vez, já incorporam nos seus preços a perspectiva de aumento nas taxas básicas de juros.

A cartilha diz ainda que não há nada que leve a crer que a política monetária em curso não vai bater na atividade econômica. "Não há evidência que sustente qualquer padrão de anormalidade", afirma o documento. O BC diz que, nos últimos dois anos, os juros reais, deflacionados pela inflação esperada, chegaram a atividade econômica com seis meses de defasagem. "Nota-se que a política monetária implementada nesses últimos anos tem permitido adequar o crescimento do produto ao ritmo de crescimento da economia", afirma o texto.

A primeira vez que o BC divulgou a cartilha foi em setembro de 2003, quando havia dúvidas se a economia iria reagir aos cortes de juros feitos a partir de junho daquele ano. O BC divulgou dados semelhantes aos da edição atual, lembrando que entre 2001 e 2002 a política monetária foi eficaz para estimular a economia.

Em março de 2005, quando havia dúvidas se o aperto monetário seria capaz de debelar a inflação, a cartilha foi reeditada pela primeira vez. Naquela ocasião, a autoridade monetária registrou que, assim como havia ocorrido no início de 2001 e no segundo semestre de 2002, o mercado antecipou o aperto monetário. Dentro do prazo esperado, a inflação de fato recuou.

Hoje, a situação é parecida com a de março de 2005. Uma diferença é que, agora, a curva de juros futuros teve uma forte reação, antecipando um severo aperto monetário. Entre 2004 e 2005, o mercado duvidava que o BC iria, de fato, subir os juros. Em 2004, houve eleições municipais, e parte do governo se opunha ao aperto. monetário, fazendo a curva de juros futuros recuar. Os ataques do governo arranharam a credibilidade do BC, obrigando este a aplicar uma dose mais forte na taxa básica.