Título: Alta do petróleo faz superávit comercial do Brasil com países árabes virar déficit
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Fonte: Valor Econômico, 09/07/2008, Brasil, p. A2

A explosão dos preços do petróleo virou novamente o jogo na balança comercial entre o Brasil e os países árabes. Apesar do incremento das exportações - resultado de um esforço diplomático de aproximação das duas regiões -, o país voltou a registrar déficit nas trocas com os árabes.

O superávit de US$ 590 milhões entre o Brasil e os 22 países da Liga Árabe no primeiro semestre de 2007 foi revertido em déficit de US$ 1,15 bilhão de janeiro a junho deste ano, conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), elaborados pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira (CCAB).

O petróleo é o principal vilão. As importações de combustíveis vindas dos árabes atingiram US$ 4,3 bilhões no primeiro semestre, 87% acima de igual período de 2007. Boa parte é conseqüência da evolução dos preços, já que, em quantidade, a alta foi de apenas 12% no período.

Em compensação, o preço médio do petróleo tipo Brent saltou de US$ 66,64 no primeiro semestre de 2007 para US$ 109,75 no primeiro semestre de 2008, alta de 72,4%. Desde então, a cotação do petróleo subiu ainda mais. O barril fechou a US$ 136,43 ontem na Bolsa de Londres.

"A balança entre o Brasil e os árabes estava equilibrada. Este ano, por conta da extrema valorização do petróleo, o déficit vai voltar", disse Antônio Sarkis Jr., presidente da câmara árabe. Segundo o empresário, as exportações de produtos agrícolas brasileiros para os árabes devem aumentar no segundo semestre em função do feriado religioso do Ramadã, mas a tendência aponta para déficit em 2008.

O Brasil chegou a registrar superávit de US$ 1,3 bilhão com os árabes em 2006, por conta do bom desempenho das exportações e do enfraquecimento das importações. No ano passado, o saldo já havia encolhido para US$ 516 milhões. Com o aumento da produção nacional, o Brasil reduziu um pouco sua dependência do petróleo importado. No entanto, os árabes possuem um petróleo leve, que é mais adequado para as refinarias instaladas no Brasil do que o óleo pesado produzido no país.

No primeiro semestre do ano em relação a janeiro e junho de 2007, as importações brasileiras procedentes da Liga Árabe subiram quase 100%, atingindo US$ 5,3 bilhões, incentivadas pelos preços do petróleo. O valor é igual as compras externas de todo o ano de 2006 e já se aproxima dos US$ 6,45 bilhões de 2007. Em 2001, o volume de importações da região era bem menor: US$ 2,3 bilhões.

Por outro lado, as exportações brasileiras para os países árabes mais do que triplicaram nos últimos anos, saindo de US$ 2,2 bilhões em 2001 para quase US$ 7 bilhões no ano passado. Os principais destaque são os produtos agrícolas, como carnes ou açúcar, mas os manufaturados também conquistaram mercado, caso de aviões, móveis, materiais de construção, entre outros.

A aproximação entre as regiões - com o início de um vôo direto entre São Paulo e Dubai pela companhia Emirates Airlines - também colaborou para os negócios. O esforço diplomático culminou, em 2005, com a a primeira cúpula entre os chefes-de-Estado do países da América do Sul e da Liga Árabe, realizada em Brasília. Nessa reunião, o Mercosul iniciou negociações para um acordo de livre comércio com os países do Conselho de Cooperação do Golfo (CGC).

Desde então, as relações esfriaram um pouco. Uma nova cúpula só deve acontecer, provavelmente, no primeiro trimestre de 2009, ou seja, quatro anos depois. As negociações entre o Mercosul e o CGC emperraram, devido à resistência da indústria petroquímica brasileira em abrir o mercado para os maiores produtores de petróleo do mundo.

Segundo o diretor do Departamento de Negociações Internacionais do Itamaraty, Evandro Didonet, o Brasil continua empenhado nas discussões com os países do Golfo, mas também abriu duas novas frentes de negociação de acordos de livre comércio com a Jordânia e o Marrocos.

Apesar das dimensões reduzidas da Jordânia, o embaixador avalia que há espaço para ganhos, pois é um mercado relativamente fechado. O país cobra, por exemplo, 21% de tarifa de importação para frutas, 70% para bebidas e tabaco, e 10% para equipamentos de transporte.

Enquanto a petroquímica resiste, outros setores empresariais brasileiros estão animados com um acordo de livre comércio com o CGC, caso de autopeças, siderurgia, material de construção e agronegócio. O países do Golfo são o segundo maior importador líquido de alimentos do mundo. Em 2007, o Brasil exportou US$ 1,5 bilhão para a Arábia Saudita e US$ 1,2 bilhão para os Emirados Árabes Unidos. Os outros mercados são menos significativos: Bahrein (US$ 113 milhões em exportações), Catar (US$ 135 milhões), Kuait (US$ 230 milhões) e Omã (US$ 93 milhões.

Para Sarkis, o comércio caminha para consolidação, porque "os árabes conhecem o potencial do Brasil" e vice-versa. Ele acredita que o maior potencial está nos investimentos. Com a alta do petróleo, os árabes dispõem de recursos abundantes. Em 2007, o superávit da Liga Árabe com o mundo chegou a US$ 250 bilhões. Ele informou que duas empresas visitaram recentemente o Brasil e confirmaram que vão abrir unidades: a Cofat, de cabos elétricos para automóveis da Tunísia, e a HTM, de produtos e higiene pessoal da Jordânia. Os árabes também estão interessados no setor de açúcar e álcool.