Título: Operação atinge poupados na lista dos 40 do mensalão
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 09/07/2008, Brasil, p. A5

A Operação Satiagraha, deflagrada ontem pela Polícia Federal, mostra que as investigações do esquema do "mensalão" foram muito além dos 40 denunciados ao Supremo Tribunal Federal (STF), atingindo o banqueiro Daniel Dantas e o investidor Naji Nahas. Ambos, no entanto, assim como outras pessoas ligadas a Nahas, foram poupados da lista dos 40 do mensalão, apresentada ao STF pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, em 30 de março de 2006.

Isso ocorreu por que o procurador-geral preferiu remeter parte da investigação para procuradores da República que atuam na 1ª instância da Justiça. Ele avaliou que não possuía indícios fortes contra Dantas e Lúcio Bolonha Funaro, doleiro apontado como operador de Nahas. O risco era o de o STF não aceitar a denúncia contra eles, o que enfraqueceria o Ministério Público. Por isso, o procurador-geral concentrou seu foco apenas nos personagens com claros indícios de crimes, e acabou convencendo o STF a aceitar a denúncia contra os 40.

Antonio Fernando também se deparou com um impedimento no próprio STF: a ministra Ellen Gracie manteve em sigilo discos rígidos apreendidos na sede do Opportunity , de Dantas, durante a Operação Chacal, em 2004. Com isso, as investigações contra o banqueiro não tiveram prosseguimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). A solução foi deixar a 1ª instância abrir nova investigação sobre o caso.

Dantas e Funaro foram bastante citados no relatório da CPMI dos Correios. Dantas utilizou as empresas Telemig Celular e Amazônia Celular, controladas pelo grupo Opportunity, para contratar as agências de publicidade de Marcos Valério - a SMP&B e a DNA. Segundo o relatório da comissão, que dedica um capítulo ao grupo Opportunity, os contratos eram milionários e com grandes evidências de superfaturamento. As duas teles pagaram mais de R$ 152 milhões às agências de Valério.

Após checar as ligações das empresas controladas por Dantas com Valério, a CPMI requisitou cópia dos discos apreendidos na sede do Opportunity Fund, durante a Operação Chacal, em que a PF descobriu um esquema de espionagem que teria sido articulado por Dantas contra ministros e personagens importantes do governo Lula. Relatora do processo, Ellen Gracie negou o pedido da CPMI por entender que as alegações da comissão eram muito genéricas, mantendo o sigilo do material.

Como a comissão continuou insistindo em obter as informações do disco a ministra do Supremo, em despacho de 4 de novembro de 2005, deu prazo de dez dias para que a CPMI indicasse a relação entre o Opportunity, as agências de Valério e a necessidade de acesso ao disco. No despacho, ela atesta que houve repasses das empresas de Dantas para Valério. Por outro lado, a ministra questionou o vínculo entre o "mensalão", que envolvia as teles, e os documentos apreendidos pela Operação Chacal, que envolviam o Opportunity, controlador das teles.

A CPMI, porém, não conseguiu responder aos questionamentos da ministra no prazo, deixando o pedido caducar. O último despacho de Ellen Gracie nesse sentido é de 17 de fevereiro de 2006. Antonio Fernando, no dia 30 de março, denunciou os 40 do mensalão, mas deixou Dantas fora da lista. O caso dele foi remetido para a 1ª instância, no desmembramento do mensalão, e lá os procuradores da República iniciaram nova investigação. Dessa vez, não havia o instituto do foro privilegiado que remetesse o caso para o STF. O acesso ao disco rígido dos computadores do Opportunity só foi obtido no ano passado.

Funaro chegou a ser apontado por Antonio Fernando como organizador de uma estrutura criminosa para lavagem de dinheiro. Dono da Garanhuns Empreendimentos, empresa que aparece no relatório da CPMI como destinada a "branqueamento de capitais", ele é acusado de ser um intermediário no "mensalão": recebia dinheiro do Partido Liberal (PL) e da SMP&B. Os parlamentares suspeitavam que Funaro atuava para Nahas no mercado financeiro. Mas, sem provas concretas, Antonio Fernando optou também por não inclui-lo na lista dos 40 do "mensalão". (JB)