Título: Áreas de meio ambiente e energia voltam a divergir
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 09/07/2008, Brasi, p. A6

As áreas ambiental e energética do governo podem entrar novamente em rota de colisão. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, defendeu ontem que as futuras hidrelétricas ajudem a bancar a manutenção de unidades de conservação. Ele disse que as duas usinas do rio Madeira já deverão fazer parte dessa experiência. Minc chegou a mencionar, como hipótese, um adicional tarifário de R$ 0,30 por megawatt-hora (MWh). Mas não deixou claro se a cobrança pode incidir sobre os consumidores finais ou será feita dos empreendedores responsáveis pela construção de Santo Antônio e Jirau.

Poucas horas depois, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, reagiu com estranheza às declarações de Minc. "Eu não sei em que ele está se baseando para fazer essa proposta", disse Lobão, após participar de uma audiência pública na Câmara dos Deputados. As empresas que ganharam o leilão das usinas do Madeira vêem com apreensão a cobrança de um adicional tarifário. "Isso não estava no edital de licitação", protestou um executivo do consórcio que arrematou a concessão de Santo Antônio.

Minc reuniu-se ontem, no fim da tarde, com a direção da Eletrobrás e da Itaipu Binacional para discutir o assunto. Técnicos do Ministério de Minas e Energia informaram que foi ventilado, em conversas com o Meio Ambiente, a criação de mecanismos de compensação para as futuras usinas ajudarem na preservação das florestas. A idéia baseia-se em programas já existentes em hidrelétricas como Tucuruí, que ao longo do contrato de concessão paga uma espécie de indenização financeira à tribo paracanã, e Itaipu, que faz pagamentos regulares para contribuir com a preservação de um parque nacional em sua área de influência. Esses técnicos, no entanto, demonstraram surpresa com a proposta de Minc e frisaram que a compensação adicional não pode encarecer as tarifas para o consumidor nem corroer a taxa de retorno dos investidores privados, mas ser fruto de "negociação" da área ambiental com o concessionário.

A preocupação das empresas é com a possibilidade de a cobrança prejudicar a rentabilidade do investimento das usinas, que tiveram grande deságio nos leilões. Em Santo Antônio, o grupo liderado por Furnas e Odebrecht venceu a disputa ao oferecer tarifa de R$ 78,90 por MWh, com deságio de 35% em relação ao preço máximo. Para Jirau, o grupo capitaneado pela Suez ganhou com um lance de R$ 71,40/MWh, deságio de 21%.

Minc, que se disse contra a energia nuclear, também afirmou que o Ibama fará exigências novas no licenciamento da usina de Angra 3. Ele repetiu que não criará obstáculos à nova usina, por ter sido fruto de uma decisão tomada pelo governo, apesar da oposição do Ministério de Minas e Energia, mas elencou algumas condições.

"Eu posso dizer que vamos acrescentar vários pontos nessa licença ambiental. Queremos um prazo para se resolver o problema dos rejeitos. Angra 3 vai ter de tomar conta de alguns parques ao redor de sua construção", disse. "Instituiremos a obrigatoriedade de monitoramento externo independente para os níveis de radiação. Teremos sensores em terra, mar e ar e quem operará isso será uma universidade ou uma fundação independente, como na Espanha."

Lobão, apesar de considerar as exigências "razoáveis", voltou a manifestar a expectativa de que o Ibama autorize a retomada das obras de Angra 3 até 1º de setembro. O órgão ambiental confirmou que deve conceder a licença prévia (que atesta a viabilidade ambiental do empreendimento) em 10 a 15 dias, mas ressaltou que não há prazo para a licença de instalação (que autoriza as obras). Para essa segunda etapa, a Eletronuclear deverá formular programas de mitigação dos impactos ambientais. Para cumprir a promessa de Lobão, toda a formulação dos programas e a análise da autarquia precisarão sair em menos de dois meses. Lobão voltou a defender a criação de uma nova estatal para administrar as reservas petrolíferas da camada pré-sal. "Não estou baixando um decreto. O que estou propondo é uma alternativa."