Título: Kadafi agora faz chantagem
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2011, Economia, p. 16

Os mercados internacionais ainda avaliam com preocupação os riscos de corte permanente no fornecimento de petróleo líbio à Europa e de danos à retomada econômica global gerados pela alta recente de preços da commodity. Em meio a questionamentos sobre a oferta real disponível para compensar a queda da produção líbia, o preço do barril de petróleo brent, negociado em Londres e referência na Europa, fechou em leve alta, a US$ 112,14. Em Nova York, o barril fechou também próximo da estabilidade, a US$ 97,88.

Diante da crescente revolta popular e sob forte pressão internacional, o ditador da Líbia, Muamar Kadafi, poderia interromper a produção ¿por razões de segurança¿. O alerta dado pelo ex-embaixador da missão líbia na Organização das Nações Unidas (ONU), Ibrahim Debbashi, logo depois foi desmentido pelo governo de Trípoli. A Líbia exporta petróleo a partir de uma série de portos, a maior parte já em mãos de rebeldes.

Tempo ruim Apesar das atenuantes, os embarques de petróleo da Líbia, 12º maior exportador mundial, já foram quase todos interrompidos em razão de cortes da produção, da falta de funcionários nos portos e de receios de segurança. Segundo fontes locais, os protestos contra Kadafi e o tempo ruim no Mar Mediterrâneo levaram navios a evitar se dirigir para a Líbia. O país produz 1,6 milhão de barris de petróleo de alta qualidade, quase 2% da produção mundial. Deste total, 30% a 75% foram interrompidos em decorrência dos distúrbios no país.

A possibilidade de o país parar de exportar 1,49 milhão de barris por dia de petróleo já deixou o preço da commodity no mercado internacional em patamares históricos na semana. A maioria dos barris exportados (85%) vai para a Europa, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE).

A produção sofreu redução de pelo menos 500 mil barris diários, chegando a ser totalmente suspensa em alguns momentos. ¿A curto prazo, no entanto, o mercado pode combater esta crise¿, estimou o diretor da Divisão de Indústria e Mercados de Petróleo da AIE, David Fyfe. A Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep) já avisou que vai aumentar sua produção em 5 milhões de barris diários, se achar necessário.

Choque Diante desse quadro, o Bank of America Merrill Lynch aposta na possibilidade de uma longa interrupção no fornecimento líbio. Outro receio do banco é que o contágio das revoltas populares na Arábia Saudita e na Argélia poderia agravar ainda mais a situação e levar a um novo choque de petróleo. Para especialistas do Barclays, as indústrias de petróleo, que atualmente trabalham na Líbia, podem deixar os portos do país. O banco francês BNP Paribas estima que o preço do petróleo deve se estabilizar em torno dos US$ 112 por barril brent, em 2011. Esse nível preocupa a AIE.

Analistas continuam avaliando a possibilidade de a alta dos preços do petróleo, provocada pela situação explosiva na Líbia, ameaçar o crescimento econômico mundial, ainda convalescente.

Nas últimas semanas, o preço do barril disparou em consequência das tensões políticas no Oriente Médio. Após ter-se aproximado da marca simbólica dos US$ 100 no dia 31 de janeiro pela primeira vez em dois anos, o brent alcançou os US$ 120 na quinta-feira, nível que não era registrado desde agosto de 2008.

Contudo, para o Fundo Monetário Internacional (FMI), o impacto desse cenário atual não deve ser tão drástico. O organismo avalia que o aumento dos preços do petróleo por causa dos protestos políticos no Oriente Médio e no Norte da África deve ser temporário. Entretanto, se os preços continuarem subindo devido a mais interrupções de oferta, ¿os efeitos negativos sobre o crescimento global podem se tornar apreciáveis¿, afirmou um porta-voz do fundo.

Compensação saudita A Arábia Saudita aumentou a produção de petróleo para 9 milhões de barris por dia, crescimento de mais de 700 mil barris. Segundo uma fonte local, o país promete usar sua larga capacidade ociosa de produção para compensar cortes da Líbia. A produção saudita em janeiro foi estimada em 8,3 milhões de barris diários. O maior produtor da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) tem sido pressionado a aumentar a oferta diante da disparada dos preços.