Título: Decisão da Receita sobre software provoca polêmica
Autor: Watanabe , Marta
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2008, Brasil, p. A3
Embora favorável às empresas, uma resposta a consulta da Receita Federal tem gerado uma reação surpreendente do setor que teoricamente seria beneficiado. A solução de divergência nº 27 diz que os valores remetidos ao exterior para pagamento pela compra ou pela licença de comercialização de software de prateleira não pagam Imposto de Renda na fonte. A manifestação da Receita seria benéfica às empresas, já que elas teriam uma redução de 15% nessas remessas. A Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), porém, está orientando seus associados a ignorar a resposta do fisco.
O diretor-jurídico da Abes, Manoel Antonio dos Santos, diz que a resposta da Receita Federal vai contra as normas vigentes sobre o assunto. "Nós somos a favor de uma redução de carga tributária, mas nesse caso orientamos todos, sejam usuários de software ou distribuidores que vão comercializar o programa, a recolher o Imposto de Renda no momento de fechamento de câmbio dessas remessas. Quem não fizer isso corre o risco de ser autuado pela Receita no futuro."
Publicada no início de junho, a solução de divergência foi emitida pela Coordenação-Geral do Sistema de Tributação, órgão que uniformiza a resposta da Receita às empresas quando há diferença de entendimento entre as superintendências sobre um determinado assunto que é objeto de consulta por contribuintes. Para Santos, a resposta da Receita vai contra a legislação vigente e a portaria do Ministério da Fazenda nº 181, de 1989. A resposta da Receita também diz que a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) não é devida nas mesmas remessas, mas o item não causou polêmica porque a desoneração já consta de lei de 2007.
Santos explica que a portaria sobre o assunto determina, na verdade, o pagamento do IR sobre as remessas relacionadas a compra e venda de cópias únicas. Segundo ele, a confusão existe porque alguns acreditam que o software de prateleira é um programa de cópias múltiplas e, por isso, teria um tratamento diferenciado. "É uma interpretação errônea, porque quando uma empresa importa um programa que será usado em 2 mil computadores, ela terá, na verdade, 2 mil cópias únicas", diz.
Para Santos, a solução de divergência é uma orientação para a fiscalização da Receita. Mas isso não impede que, no futuro, a própria Receita autue as empresas exigindo o IR na fonte, mesmo que elas tenham usado como fundamento jurídico a resposta do fisco. "Isso pode ser questionado com base na hierarquia das normas", alega.
Santos lembra caso semelhante, quando o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta usou um decreto para reduzir de 5% para 2% o Imposto sobre Serviços (ISS) sobre software. Marta Suplicy, prefeita eleita na gestão seguinte, questionou judicialmente o decreto e o derrubou, sob argumento de que a redução deveria ter sido feita por lei. "Quem se apoiou na redução feita por meio de decreto precisou recolher a diferença." Com o questionamento de Marta, o ISS voltou a 5% e só foi reduzido mais tarde, durante mandato da própria petista . Por meio de lei.