Título: Dantas falou com Braz sobre a investigação
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2008, Brasil, p. A5

Escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal revelam que o investidor Daniel Dantas estava ciente das investigações da Polícia Federal que deflagaram a Operação Satiagraha e que manteve conversas telefônicas a respeito do assunto com Humberto José da Rocha Braz, o ex-presidente do conselho da Brasil Telecom, acusado de ter subornado um delegado para obter informações sobre as investigações sigilosas. Foram novas informações sobre o suborno que levaram Dantas de volta à prisão.

Em 5 de maio último, às 17h56, Dantas é flagrado conversando com Humberto Braz sobre a investigação: "E quem tá (sic) responsável é esse Protógenes mesmo?", pergunta o banqueiro.

Uma escuta estabelece a ligação entre Dantas e Nahas e também mostra que Humberto Braz intermediava contatos entre os dois. No dia 13 de maio, Dantas e Nahas fazem um contato telefônico. O banqueiro apenas diz ao investidor que ele será procurado por alguém. No dia seguinte, Humberto Braz sai do prédio onde fica o escritório de Nahas. Para a PF, essa ligação é um sinal de que os dois grupos estavam se organizando contra a atuação policial.

Após a ação de suborno, a PF identifica uma ligação mais aliviada de sua irmã Verônica com uma amiga, em 30 de junho. A amiga, de nome Bia, diz que irá rezar por Verônica, pois está com medo de lhe acontecer alguma coisa, e essa responde: "Não! Não. Já tá tudo ok. Tá tudo numa boa! Pode ficar tranqüila. Já tô (sic) aqui, já tive ontem contigo, já vou hoje na missa da dona Ruth... Vida normal!" Oito dias depois, estourava a operação e Verônica ia presa.

O detalhamento das escutas feitas pela PF, que constam da íntegra da decisão do juiz Fausto de Sanctis à qual o Valor teve acesso, revelam que as investigações identificaram duas movimentações supostamente criminosas. Primeiro, a tentativa do grupo de Dantas de camuflar negócios usando participações minoritárias em empresas e sociedades ocultas. A segunda envolveria o investidor Nahas com informações privilegiadas e doleiros que operariam para ele. As conversas mostram que um grupo se servia das atividades de outro.

Em conversa com a irmã Verônica no dia 3 de junho, Dantas, já sabendo estar sob investigação, fala da necessidade de manobras societárias para camuflar os negócios do grupo. "O problema é o seguinte: eles tão (sic) desenvolvendo uma tese que o Banco Opportunity, o Opportunity Fund, tudo isso é um... ? alter ego ? ", diz Dantas. Verônica não entende, e o irmão explica. A tese do "alter ego" foi suscitada pela PF para indicar que Dantas buscava camuflar os seus negócios em participações minoritárias, mas com forte poder decisório no rumo das empresas. O grupo Opportunity seria composto de diversas empresas financeiras e não-financeiras, nacionais e "offshores" (com sede em paraísos fiscais), cita o relatório da PF. Algumas das empresas seriam usadas em delitos contra o sistema financeiro, como fraudes em contratos de mútuo e o uso de informações privilegiadas no mercado.

Na gravação, Verônica fala em rearranjar sócios e empresas do grupo, tirando Dorio Ferman e Itamar Benigno do controle de uma empresa de investimentos. Ela e Daniel assumiriam o controle da Opportunity Invest II Ltda. Daniel, em linguagem cifrada, pede um "prato pronto" para o próximo dia. No dia seguinte, ocorre uma alteração societária.

Segundo avalia a PF, a manobra foi realizada para evitar a apuração de ganhos de capital do grupo, evitando pagamento de impostos e camuflando, como empréstimo, um contrato de mútuo, "à margem da lei". De acordo com as investigações Dantas seria sócio da Opportunity Asset Management Ltda, embora a participação ocorra de forma indireta, por meio de outra empresa, a Santa Luzia Comércio e Participações, que tem Verônica como outra única sócia. "Percebe-se que o controle de Daniel Dantas sobre o grupo Opportunity se exerce de forma indireta, através de empresas de participações ou por interpostas pessoas, como a irmã Verônica, e o sócio Dorio Ferman", completa a PF, apoiando-se em relatório do Banco Central.

O controle empresarial do complexo societário por Daniel Dantas seria responsável pelo enriquecimento do grupo, que teria administrado R$ 3 bilhões, "resultantes de investimentos em fundos e 'offshores' estabelecidos em paraísos fiscais".

Ao falar de Naji Nahas, a Polícia Federal mostra-se impressionada com a habilidade do investidor no mercado financeiro. As gravações entre Nahas e doleiros revelariam, segundo a PF, que o investidor teria importantes informações privilegiadas. Em 5 de novembro de 2007, Nahas fala com um doleiro que a Cesp seria privatizada e monta operação para ganhar R$ 80 milhões, segundo a PF. O investidor diz na gravação que a privatização fora informada a ele pelo próprio "Serra" (governador de São Paulo, José Serra).

Em 8 de abril, Nahas pede a Miguel Jurno Neto, que seria doleiro e operador de Nahas na bolsa, para comprar ações da Petrobras. Em 14 de abril, o diretor da Agência Nacional do Petróleo, Haroldo Lima, causa rebuliço no mercado ao revelar a descoberta de um novo campo, antecipando-se à divulgação oficial, o que confirmaria, segundo a PF, o "acerto" de Nahas. Em outra gravação, Nahas conversa com Celso Pitta e em seguida, pede a um doleiro para dar R$ 70 mil ao ex-prefeito, pois ele estaria "enchendo o saco". Ambos chamam Pitta de "maluquinho".