Título: Regras instáveis afastam as mineradoras de parte da AL
Autor: Souza, Marcos de Moura
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2008, Internacional, p. A11

Dona de uma região que pode conter uma das maiores reservas de ouro da América Latina, a Venezuela deu um susto em investidores canadenses há três meses, ao anunciar que estava proibindo duas mineradoras do Canadá, a Crystallex e a Gold Reserve, de explorarem a área na reserva floresta de Imataca. A decisão derrubou as ações da Crystallex, que perderam dois terços do seu valor nas semanas seguintes, e acabou custando a cabeça do CEO da companhia. Mas então, no fim de junho, mudança de planos: as duas companhias informaram que Caracas estava prestes a rever a decisão. O papel da Crystallex dobrou de valor.

Idas e vindas regulatórias como essas passaram a fazer parte da rotina das empresas de mineração na Venezuela e a desencorajar investidores, justamente num momento em que os preços internacionais das commodities metálicas estão nas alturas e quando o país poderia amplificar sua capacidade de atrair de recursos.

A Venezuela não está sozinha. O Equador também está deixando de atrair capital para o setor de mineração. O país tem um potencial importante como produtor de cobre, mas está redefinindo completamente suas leis de mineração, em meio ao processo em curso de elaboração de uma nova Constituição. "Isso tem um custo. Os projetos que estavam lá e as possibilidades de investimentos estão sendo adiados ", disse ao Valor Juan Carlos Guajardo, diretor-executivo do Centro de Estudos do Cobre e Mineração (Cesco), entidade sediada em Santiago, no Chile.

"Na América Latina, quando falamos de mineração, existem hoje pelo menos dois grupos de países: os que estão promovendo o setor e incentivando investimentos e os que estão redefinindo o papel do Estado na exploração", avalia Guajardo. No primeiro grupo, estariam países líderes em produção de commodities metálicas na região, entre os quais Brasil, México, Peru e Chile. No segundo grupo, Guajardo inclui Equador, Venezuela, Bolívia e em menor medida, a Argentina.

Estimativas preliminares da Cesco sobre novos investimentos previstos em mineração na região para os próximos anos indicam uma preferência do capital em países com marcos regulatórios mais bem definidos, diz Guajardo.

O Chile, por exemplo, - que produz 5,5 milhões de toneladas de cobre por ano -, espera receber nos próximos cinco ou seis anos algo em torno de US$ 20 bilhões em investimentos privados e públicos. "Isso equivale a todo investimento estrangeiro no setor entre 1934 e 2007", diz ele. Para o Brasil, as estimativas são de investimentos de US$ 22 bilhões; enquanto no Peru (rico em prata, ouro cobre e zinco) e México (prata e cobre) a expectativa é de US$ 10 bilhões e US$ 6,5 bilhões, respectivamente.

Ontem, o diretor das operações da sul-africana Gold Fields, Juan Luis Kruger, disse que a empresa estuda dobrar as dimensões de sua exploração de ouro e cobre na mina de Cerro Corona no Peru - um empreendimento de US$ 450 milhões. A ampliação do projeto começaria logo no fim do ano, quando a mina deverá atingir sua plena capacidade de produção.

A Cesco não tem números sobre investimentos em mineração na Venezuela, no Equador ou na Bolívia, mas Guajardo estima que nos dois primeiros os valores esperados são pouco representativos. No caso específico da Venezuela, o analista Germano Mendes de Paula - especialista na indústria do minério de ferro e siderurgia - lembra que o retrospecto de estatizações provoca um contexto de turbulências, que deixam os investidores cautelosos. Na Bolívia - onde mudanças de regras tiveram o mesmo efeito sobre entre investidores -, o principal projeto é o da mina de Mutún, uma das maiores de minério de ferro do mundo. A indiana Jindal Steel assinou em 2007 acordo de exploração que prevê investimentos de US$ 2,1 bilhões. Embora o contrato seja vultoso, a Bolívia segue atrás dos vizinhos em matéria de atração de recursos para explorar suas potencialidades minerais, diz Guajardo.