Título: Desafiador, Kadafi zomba de renúncia
Autor: Fleck, Isabel
Fonte: Correio Braziliense, 01/03/2011, Mundo, p. 26

Enquanto os opositores do governo da Líbia se aproximam cada vez mais de Trípoli, o presidente Muamar Kadafi permanece confiante. ¿Todo o meu povo me ama. Eles morreriam para me proteger¿, afirmou o líder, ontem, durante entrevista às emissoras ABC (Estados Unidos) e BBC (Reino Unido). Os rebeldes tomaram o controle do leste do país e agora planejam uma estratégia para chegar à capital. O ditador negou as acusações de utilizar a força contra a população e riu da possibilidade de deixar o governo. Encurralado, Kadafi deu os primeiros sinais de diálogo e pediu que o chefe da inteligência líbia no exterior, Abuzed Dorda, comece as negociações com os principais líderes tribais do país.

Mais uma vez, o líder da Líbia culpou a rede terrorista Al-Qaeda de financiar a revolta popular e de drogar os mais jovens, para que lutassem contra o governo. Também se disse ¿traído¿ por líder de outros países que exigem sua saída do governo. ¿Estou surpreso porque temos uma aliança com o Ocidente para lutar contra a Al-Qaeda e, agora que estamos lutando contra esses terroristas, eles nos abandonaram¿, declarou o ditador.

Para o mandatário líbio, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, é um bom homem, mas pode estar recebendo informações erradas. ¿As declarações que eu escutei dele devem ter vindo de outra pessoa¿, disse à repórter norte-americana Christiane Amanpour. ¿Os EUA não são a polícia internacional do mundo¿, completou. Em entrevista coletiva na Casa Branca, a embaixadora americana na Organização das Nações Unidas (ONU), Susan Rice, disse que as declarações do líder demonstraram que ele soa ¿alienado¿ e ¿desligado da realidade¿.

Para tentar contornar a crise, Kadafi tenta estabelecer um diálogo com os chefes das tribos que controlam o leste do país. De acordo com a rede de TV Al-Jazeera, Abuzed Dorda foi designado pelo ditador para iniciar as negociações com a oposição. Por sua vez, o jornal líbio Quryna publicou que o mandatário anunciou mudanças no governo: demitiu o chefe de seu serviço de informação, Abdullah Al-Senoussi, e nomeou seu guarda-costas, Mansur Al-Qahsi, para o cargo.

Resistência O filho de Kadafi, Saif Al-Islam, apareceu em um vídeo, divulgado ontem pela internet, durante uma manifestação de aliados do governo, em Trípoli, e pediu que o povo lute pelo regime. Com um casaco camuflado e uma arma na mão esquerda, ele afirmou que a população ¿terá todo o apoio, as facilidades e o armamento¿ para combater os opositores. Ontem, um avião da Força Área bombardeou um depósito de armas na região de Benghazi, que estaria sob o comando dos rebeldes, enquanto uma aeronave militar foi derrubada pelos opositores na cidade de Misrata, a 200m da base das forças de segurança. Os opositores se preparam para chegar mais perto da capital nos próximos dias.

O jovem líbio Adel Wahra está longe de sua terra natal, Trípoli, mas não deixa de entrar em contato com a família. ¿O governo chegou a cortar a energia elétrica e o abastecimento de água em diversas áreas onde estão os opositores. O presidente enviou mais mercenários para as ruas, com o único objetivo de matar¿, disse ao Correio, por e-mail. Para o estudante, o discurso de Kadafi sobre a crise política é falso. ¿Ele fala como se estivesse intoxicado e sob a influência do mal. Tudo o que ele diz é mentira. Não passa de rumores para uma tentativa de incentivar uma guerra entre as tribos da Líbia. Mas, desta vez, os líbios estão unidos e todos querem que ele saia¿, assegurou.

Irã alerta contra manifestações O Irã fez ontem uma advertência aos oposicionistas que pretendem se manifestar hoje em favor da libertação de seus líderes, submetidos a uma espécie de prisão domiciliar. ¿Quem violar a lei deverá responder por seus atos¿, declarou o procurador-geral iraniano, Gholam Hossein Mohseni Ejeie. Os sites de oposição convocaram novas manifestações, em resposta ao tratamento dispensado a Mehdi Karrubi e a Mir Hossein Mussavi. Os dois líderes da oposição reformista estão em residência vigiada depois de terem convocado uma manifestação proibida em 14 de fevereiro.

De acordo com o site Sahamnews.org, as forças de segurança iranianas detiveram Karrubi e o levaram para um local desconhecido. O portal revela que o ex-chefe do Parlamento reformista (2000-2004) e sua mulher, Fatemeh Karrubi, foram levados na noite de quinta-feira a um lugar não identificado. O casal era mantido em prisão domiciliar havia mais de duas semanas, no norte de Teerã. A informação foi repassada por um dos filhos de Karrubi, sob condição de anonimato.

Na Arábia Saudita, um grupo de personalidades islamitas reclamou reformas no reino, um dia depois que 130 intelectuais liberais defenderam a instauração de uma monarquia constitucional.

Em um pedido postado na internet com vários foros no Golfo, 26 personalidades islamitas, entre elas o pregador Salman Al-Auda, afirmam que ¿é preciso uma reforma radical na Arábia Saudita¿. Eles sustentam que ¿as revoluções árabes demonstram que o dirigentes árabes não ouvem os pedidos de reforma, de desenvolvimento e de liberdade de seus povos¿. Também advertem que, caso não o façam, haverá caos.