Título: Gravação traz autocrítica de Protógenes
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2008, Brasil, p. A6

O delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz: agradecimentos aos superiores e admissão de falhas na investigação Depois de uma reunião fora da agenda oficial entre o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo decidiu divulgar um pequeno trecho - cerca de cinco minutos - da tensa reunião na qual foi decidido o afastamento do delegado Protógenes Queiroz, comandante da Operação Satiagraha. A intenção do Executivo era afastar as suspeitas de que Protógenes tivesse sido "degolado" das investigações, segundo expressão cunhada por um auxiliar.

No áudio divulgado pela Polícia Federal, Protógenes afirma que, após retornar do seu curso na Academia, não gostaria de seguir presidindo o inquérito. Mas sugere continuar na investigação com outras funções. "Ficaria num trabalho de inteligência, coletando dados". É interrompido por um dos superiores - tudo indica que seja o diretor de combate ao crime organizado, Roberto Troncon Filho. "Se eventualmente, nesse período, você conseguir concluir o seu trabalho antes de você ir para a Academia, sem nenhum problema. Se não conseguir, se requer mais tempo, mais análise, aí a gente passa para um dos colegas".

Protógenes também reconhece aquilo que é um das maiores críticas contra ele: o vazamento da operação para a imprensa. "O Queiroz falhou porque o doutor Troncon (o diretor de Combate ao Crime Organizado) me depositou (confiança) e eu firmei um compromisso com ele. Mas falhou ao meu controle", afirma Protógenes, referindo-se a si próprio em terceira pessoa. O ex-presidente do inquérito agradece o apoio dado por seus superiores e acredita não "haver óbices" para concluir o seu inquérito até hoje, antes de iniciar as aulas no curso de aperfeiçoamento da PF. "Só faltava eu falar com o Humberto (Humberto Braz), mas o Humberto se apresentou (entregou-se na quarta à Polícia Federal)", afirma Protógenes, no trecho editado divulgado pela PF.

Alegando necessidade do sigilo das investigações, a íntegra da conversa - que aconteceu na tarde de terça, em São Paulo e durou aproximadamente três horas - entre os delegados que conduziram a Satiagraha e a cúpula da PF não foi revelada. Mas fontes da cúpula da polícia confirmam o clima de "lavagem de roupa suja". Pessoas presentes à reunião na PF confirmam que o clima de hostilidade mútuo, crescente nos momentos anteriores à operação e insustentáveis após a eclosão das prisões, tornou difícil a convivência entre os delegados.

A decisão de divulgar partes da conversa, omitindo os momentos mais tensos foi selada no encontro da manhã de ontem, no Planalto. O presidente Lula e o ministro Tarso Genro conversaram pelo menos seis vezes por telefone ao longo da quarta. Lula mostrou estar profundamente incomodado com a versão dominante na imprensa, de que o governo tirara Protógenes do inquérito pelas pressões exercidas pelos investigados na Operação Satiagraha.

Na manhã de ontem, Genro ligou para o diretor-interino da Polícia Federal, Romero Menezes, convocando-o para uma reunião com o presidente. No encontro, Genro deixou claro a Lula que Protógenes havia deixado a presidência do inquérito para dedicar-se ao seu curso e que prometera concluir seu relatório até hoje. "Nós dissemos ao presidente que havia informações distorcidas na imprensa. Algumas pessoas de boa-fé estavam repassando informações erradas e outras, de má-fé, agiram por interesse próprio", declarou Genro.

O ministro da Justiça acentua que todos os presentes na reunião na PF, em São Paulo, sabiam que a conversa estava sendo gravada. Tanto ele quanto Romero estavam dispostos a divulgar os trechos da conversa para a imprensa. Só aguardavam o aval do presidente. Lula teria defendido a divulgação do áudio, para que "essas coisas sejam esclarecidas para a sociedade", porque o conteúdo do áudio "não é o que está saindo nos jornais".

Romero Menezes está substituindo o diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, que tirou 15 dias de férias em plena crise. "Ele já tinha essas férias marcadas e eu disse que não havia nenhum motivo para que elas fossem transferidas, pois tudo estava sob controle", afirmou Genro. Coube então a Menezes ouvir as palavras de estímulo do presidente ontem, dizendo "que a Polícia Federal estava fazendo um grande trabalho". Na segunda, Genro fora duramente criticado pelo uso de algemas na prisão dos envolvidos. "Por que humilhar assim as pessoas?" questionou o presidente.

Ontem, Lula foi mais solidário, mas alertou Menezes sobre os cuidados necessários em uma operação deste porte. "Vocês estão mexendo com grandes interesses que estão sendo contrariados. E quando isso acontece, ninguém sabe exatamente o que pode acontecer", alertou o presidente, segundo relato do ministro ao Valor.