Título: Mais inflação e menos crescimento rondam Uribe
Autor: Souza , Marcos de Moura
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2008, Especial, p. A16

Assim como as demais economias latino-americanas, a Colômbia está às voltas com a disparada da inflação. O índice de preços ao consumidor (IPC) anualizado em junho chegou a 7,18% - o mais alto desde o mesmo mês em 2002. O governo do presidente Álvaro Uribe tem defendido o que chama de "acordos voluntários" com o empresariado, com o objetivo de segurar os preços por algum tempo. Essa iniciativa, que já foi aplicada algumas vezes, parece menos factível agora porque as pressões de custos são maiores, disse ao Valor o ministro da Fazenda colombiano, Oscar Iván Zuluaga.

A receita, então, é favorecer o aumento da oferta de alimentos e reduzir tarifas. Com a alta da inflação, a economia colombiana vem perdendo fôlego. Depois de ter crescido 6,8% e 7,5% em 2006 e 2007, o ritmo deste ano pode chegar - numa estimativa otimista - aos 5%. Para Zuluaga, apesar desses e outros problemas, a Colômbia exibe uma característica indispensável para os negócios: confiança e estabilidade jurídica. "O país se comporta como se já fosse grau de investimento", diz. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Para tentar conter a inflação, o governo da Colômbia aventou a possibilidade de um acordo com empresários para controle de preços. Essa idéia foi descartada?

Oscar Iván Zuluaga: O que se sugeriu vai mais na linha de acordos voluntários que garantam, por exemplo, que não haja problemas de especulação, mas em nenhum momento (se falou) em controle de preços. Na Colômbia não estamos de acordo com o controle de preços. Logo, qualquer coisa que se faça será na linha de acordos voluntários, como ocorreu em outras épocas.

Valor: Sob quais condições esses acordos voluntários seriam feitos?

Zuluaga: Por exemplo, houve um momento em que as centrais de abastecimento e algumas cadeias ofereceram preços estáveis por um período de tempo por causa de uma temporada de fim de ano. Em novembro e dezembro do ano passado, o ministro da Agricultura articulou um acordo entre centrais de abastecimento, cadeias de armazéns, mas foi um acordo mais de tipo voluntário. Hoje é mais difícil porque temos pressão de custos e dificuldades por causa do aumento dos preços. Mas digamos que o que se busca é evitar sobretudo problemas de especulação.

Valor: Essa proposta de acordos voluntários está sendo negociada com os empresários?

Zuluaga: Não, isso não é motivo de negociação. É uma idéia constantemente defendida pelo Ministério da Agricultura e que o presidente [Álvaro Uribe] sugeriu muito para evitarmos os processos de especulação.

Valor: O governo concentra suas ações contra inflação na política de juros?

Zuluaga: O que se quer é aumentar a oferta. A melhor forma para controlar a inflação de alimentos é aumentar a produção e reduzir custos, por exemplo, cortando tarifas para insumos, para fertilizantes. Essa é a melhor forma para controlar a inflação.

Valor: O ministério trabalha com qual expectativa de inflação até o fim do ano?

Zuluaga: É difícil. Hoje estamos com mais de 7%. Se conseguirmos este ano uma inflação entre 6% e 6,5% seria aceitável para a Colômbia. A meta de inflação está hoje entre 3,5% e 4,5%. Claramente estamos muito acima dessa patamar.

Valor: Depois de um período de crescimento acelerado, há indicadores (como o da construção de casas) que sugerem que a economia não deve seguir no mesmo ritmo. O ministério já projeta para os próximos anos um crescimento menos acelerado?

Zuluaga: Acreditamos que [estaremos num ritmo] mais próximo ao nosso potencial. Estamos estimando este ano um crescimento de 5% e o crescimento potencial da economia colombiana é de cerca de 6%. Avaliamos que uma meta de longo prazo de um crescimento de 5,5% o 6% seria boa para o país.

Valor: Sobre investimento externo direto (IED), a Colômbia passou a ser vista como um país muito mais atraente após a melhora no quadro de segurança interna. Mas o fato de dois vizinhos, o Brasil e o Peru, terem passado recentemente a ser classificados como grau de investimento poderá drenar parte dos recursos que poderiam vir para a Colômbia?

Zuluaga: Creio que a Colômbia também vai nessa direção. Mas o país já se comporta como se já fosse grau de investimento. O país oferece muita confiança. Não acredito que Peru e Brasil desloquem investimentos da Colômbia. Nós três estamos em um bom momento econômico, cada um tem um potencial significativo e isso se vê pelos fluxos de IED na Colômbia.

Valor: As empresas no país, nacionais e estrangeiras, continuam sendo alvo de extorsão, de cobrança de "pedágio", por parte dos grupos armados no país?

Zuluaga: Acredito que cada vez menos. Houve um avanço muito grande. Há quatro anos, havia mil seqüestros por ano; hoje não chegam a 80. É dramática a redução de todos os indicadores e acredito que ocorra o mesmo com as extorsões e todo esse tipo de atuação, que cada vez mais são menores. Obviamente temos de tomar algumas precauções, mas cada vez mais a Colômbia é um país mais seguro e há muito mais tranqüilidade.

Valor: Sobre a relação com os EUA, algumas economias que têm tratados de livre comércio com o país estão sentindo de modo mais acentuado a desaceleração americana. Se o tratado com a Colômbia já estivesse em vigor, o país poderia também estar mais vulnerável. Há alguma vantagem de não ter um TLC, neste momento ao menos?

Zuluaga: Não, não creio, porque os EUA são o principal sócio comercial da Colômbia independente de haver hoje uma queda na economia. As exportações colombianas para os EUA têm aumentado. Para nós, o TLC é prioritário porque permitirá à Colômbia consolidar um mercado e gerar possibilidade de atrair muito investimento. Hoje, com a debilidade do dólar associada ao ciclo econômico da Colômbia, há uma oportunidade para atrair investimento americano ao país.

Valor: Uma pesquisa recente apontou que a economia é o segundo assunto que mais preocupa os colombianos, perdendo só para a questão da segurança. O senhor crê que presidente Uribe teria uma aprovação tão alta se a avaliação fosse baseada apenas no desempenho da economia?

Zuluaga: A pesquisa anterior mostrava que cerca de 80% da popularidade do presidente se explicava pelo bom momento econômico. O que acontece é que estamos num momento em que a economia colombiana se desacelerou, o ambiente externo é mais difícil, há problemas de inflação e há setores afetados pela valorização do peso. Isso obviamente causa inquietações entre os colombianos.

Valor: Quais seriam os setores da economia brasileira que poderiam ter mais chances de sucesso ao investir na Colômbia?

Zuluaga: Há muito [espaço] para infra-estrutura, mineração, siderurgia, equipamentos e bens de capital e, obviamente, a área dos biocombustíveis, que com toda a experiência do Brasil, me parece que é também um campo de investimento muito grande para presença de capital brasileiro na Colômbia.