Título: Geradoras e fundos apostam em PCH
Autor: Capela , Maurício
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2008, Empresas, p. B1

Os números da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre o potencial de geração de energia a partir de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no Brasil falam por si. Há o equivalente a uma usina do rio Madeira, algo como 3,7 mil megawatts (MW), em gestação no país. É uma capacidade que se for tirada do papel deverá exigir investimentos de pelo menos R$ 15 bilhões, já que cada MW instalado custa ao redor de R$ 4 milhões. Só para se ter uma idéia do significado disso, erguer os 3,2 mil MW da usina de Jirau, a segunda do Madeira que foi leiloada em maio de 2008, serão aplicados recursos perto dos R$ 8 bilhões. Por definição, uma PCH tem potência instalada de até 30 MW e alaga uma área de no máximo 3 quilômetros quadrados.

Com desconto na tarifa de transmissão, direito a incentivos fiscais e complexidade menor nos processos de licenciamento ambiental, investir em PCH entrou no radar de praticamente todo o grande grupo de energia no Brasil. É o caso, por exemplo, da Tractebel, Energias do Brasil, AES Tietê, CPFL Energia e outros. Mas não foram só eles. De uns tempos para cá, os fundos de investimento também esticaram os olhos em direção a esse segmento.

Um bom exemplo da ação desses fundos é a Ersa, controlada pelo Pátria Investimentos, a gestora de recursos americana Eton Park, um fundo de participação gerido pelo Bradesco e pelo banco estatal alemão DEG. Criada em 2006, a Ersa tem plano de investir R$ 700 milhões em 12 PCHs em Minas Gerais, o que totalizaria uma capacidade de 167 MW. A primeira pequena usina já está em construção em Antônio Dias (MG). Capaz de gerar 10 MW, o empreendimento entrará em operação em 2010.

Outro fundo de investimento que aposta no negócio é o Tarpon Investment. Em sociedade com as mineiras Winbros Empreendimentos e a Poente Energia, criou há alguns meses a Omega Energia Renovável. Com o objetivo inicial de gerar 240 MW até 2012, a Omega considera um portfólio total de 1,1 mil MW, já que admite trabalhar em parcerias. "Vamos buscar concessões, projetos novos e PCHs já em operação", informa Wilson Brumer, sócio-diretor da Winbros e presidente da Omega. A empresa surgiu com participações em 59 projetos de PCH no Paraná, Minas Gerais, no Centro-Oeste e Norte. Somente sua parte vai demandar investimento de US$ 620 milhões.

O interesse é crescente porque, com o atual aperto entre oferta e demanda no Brasil, tirar uma PCH do papel é relativamente rápido. Demora entre um ano e dois anos para ficar pronta. "A PCH encontra muito espaço no mercado livre de energia, que hoje pratica preços mais elevados e contratos mais longos que o regulado", afirma Hugo de Souza, diretor-executivo da Enernova, braço da holding Energias do Brasil, do grupo português EDP, para o negócio de geração a partir de fontes renováveis.

Segundo Souza, a Enernova planeja acrescentar 600 MW em PCHs entre 2008 e 2012, o que resultaria em um investimento de R$ 2,4 bilhões. Hoje, a companhia possui 13 pequenas centrais, que totalizam 160 MW de capacidade.

"Neste ano, investiremos cerca de R$ 40 milhões na modernização e ampliação de capacidade. Esperamos que o montante maior comece a sair do papel a partir do ano que vem", diz Souza. O recurso de 2008 servirá para modernizar uma PCH de 30 MW e para ampliar outra de 18 MW para 22 MW.

Outro grupo que mira fortemente o setor de PCHs é a AES Tietê. Controlada pela holding Brasiliana, que tem como acionistas o BNDES (49,99%) e a americana AES (50,01%), a companhia planeja investir R$ 260 milhões para erguer 5 pequenas centrais no Brasil. Serão duas em São Paulo, que somam 8 MW, e mais três no Rio de Janeiro, que totalizam 52 MW.

Segundo Britaldo Pedrosa Soares, diretor-presidente da Brasiliana, a idéia é ampliar a presença do grupo em PCHs. "Estamos estudando 6 pequenas centrais, que totalizam 70 MW, nos Estados de São Paulo e Minas Gerais, o que daria um investimento próximo de R$ 300 milhões", conta o executivo. A Tietê possui um parque de 10 grandes hidrelétricas, com capacidade instalada de 2,15 mil MW.

Apesar das boas perspectivas para o negócio de PCHs, há quem fique com a pulga atrás da orelha quanto ao potencial a ser tirado do papel. Dos cerca de 3,7 mil MW em gestação, 1,4 mil MW estão em construção e outros 2,3 mil MW ainda na fase de outorga na Aneel.

Manoel Torres, presidente da Tractebel, a maior geradora privada do país, acredita que nem todas as PCHs que estão em outorga sairão do papel. "A obtenção de licenças é mais fácil que um grande empreendimento, mas também tem suas questões", afirma Torres. "De fato, o licenciamento de uma PCH é difícil, mas acredito que esse potencial virará realidade", diz o executivo da Energias do Brasil.

Mesmo assim a Tractebel mostra interesse nesse segmento. Controlada da franco-belga Suez, fez seu primeiro movimento em PCH neste mês. Por quase R$ 314 milhões, ela arrematou duas usinas no Estado do Mato Grosso, que totalizam 50,3 MW. Em funcionamento desde 2007, as PCHs negociaram a energia com o Proinfa (programa de incentivo do governo a fontes alternativas de energia) até 2027. "Foi uma aquisição de oportunidade, mas estamos estudando esse segmento", admite Torres.