Título: CGU apura irregularidades
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 27/02/2011, Política, p. 8

Controladoria-Geral da União detecta problemas com convênios firmados pelo Ministério do Trabalho e Emprego e determina ampliação da fiscalização nas entidades que prestaram serviços

A Controladoria-Geral da União (CGU) já identificou irregularidades no acompanhamento de diversos convênios pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e atestou a fragilidade da pasta na fiscalização dos cursos de qualificação profissional. Os principais problemas se referem à alimentação de dados no Sistema de Gestão do Programa das Ações de Emprego (Sigae), usado pelo MTE para averiguar a evolução dos cursos de capacitação.

O ministério transfere à organizações sem fins lucrativos a responsabilidade pela aplicação dos cursos. No instrumento mais importante de que dispõe para fiscalizar o andamento dos convênios, o Sigae, falta inserção de dados e sobram ¿inconsistências nas informações sobre frequência dos alunos¿, segundo a CGU. Os dados que chegam ao sistema são informados pelas próprias entidades contratadas pelo MTE, por meio de um site acessado pelos coordenadores dos cursos.

Além das deficiências do Sigae, a CGU identificou falhas na seleção das organizações e no acompanhamento e monitoramento dos cursos de qualificação. ¿Nas chamadas públicas, são escolhidas as mesmas entidades que apresentaram desvios no acompanhamento realizado em outras ações ou que não comprovaram capacidade técnica para realização dos cursos¿, sustenta o órgão de fiscalização.

Os problemas detectados pela CGU se aplicam à realidade da Federação Interestadual dos Mototaxistas e Motoboys Autônomos (Fenamoto) e de outras seis organizações sem fins lucrativos cujos convênios firmados com o MTE são permeados por irregularidades, como o Correio vem denunciando há duas semanas. Na nota enviada pela CGU à reportagem, não há especificação sobre nenhuma entidade em que se constataram falhas.

No caso da Fenamoto, a lista de pessoas capacitadas que chegou ao Sigae ¿ e que foi chancelada pelo MTE ¿ tem nomes duplicados e de motoboys que nem são habilitados na categoria A, exigida para se guiar motocicletas. Já as outras seis entidades foram favorecidas pelo MTE e selecionadas de forma direcionada, conforme ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) em setembro do ano passado.

A CGU informou que o convênio entre MTE e Fenamoto ¿ no valor de R$ 1,5 milhão ¿ será fiscalizado, dentro de uma proposta de fiscalização que inclui 43 convênios celebrados no ano passado, e cujas execuções se estendem por este ano. Técnicos do órgão farão visitas in loco às salas de aula. Além de averiguar a execução física e financeira, os técnicos vão verificar o cumprimento das metas de inserção no mercado de trabalho e se o curso gerou os benefícios sociais previstos.

Meta Pelo menos 30% dos capacitados devem ser incluídos no mercado, como prevê o contrato assinado com o MTE. As entidades vêm apresentando dificuldades para cumprir essa meta, como constatou a CGU. Acabam prestando informações não confirmadas em sistemas oficiais. Como o Correio identificou no caso da Fenamoto, outros convênios falham na aquisição de lanches, material didático e fornecimento de transporte aos alunos, segundo a CGU.

¿São constatadas diversas inconsistências e irregularidades nos projetos de capacitação profissional, tanto no atual Programa Nacional de Qualificação quanto no seu antecessor, o Planfor, que vem da década de 90¿, informa o órgão. Governos estaduais, centrais sindicais e organizações não governamentais (Ongs) apresentam ¿mais ou menos os mesmos problemas¿ na execução dos convênios.

O MTE instaurou ¿inúmeras¿ tomadas de contas especiais, por recomendação da CGU, para averiguar irregularidades nos cursos de capacitação, segundo o órgão de fiscalização. ¿As tomadas de contas visam à quantificação precisa dos valores que terão de ser ressarcidos aos cofres da União e à individualização dos responsáveis. Muitas já foram julgadas pelo TCU, inclusive com condenações e multas pesadas.¿ Entre os responsabilizados, estão dirigentes das entidades selecionadas, ex-secretários estaduais e ex-dirigentes do MTE.

Audiências Para o secretário de Políticas Públicas de Emprego do MTE, Carlo Roberto Simi, os cursos do chamado Plano Setorial de Qualificação (Planseq) não são desenvolvidos ¿ao acaso¿. Ele diz que o sistema de chamadas públicas, para a seleção das entidades responsáveis pela qualificação, foi desenvolvido na gestão do ministro Carlos Lupi. ¿Audiências públicas são feitas a partir de uma demanda apresentada ao ministério, em função do mercado de trabalho e das circunstâncias.¿ Carlo Simi sustenta que o ministério faz o monitoramento da inserção de 30% dos qualificados no mercado.

Os problemas já mostrados

O Correio vem publicando uma série de reportagens sobre os convênios do Ministério do Trabalho para qualificação profissional. Veja as irregularidades e problemas já detectados:

» A Fenamoto não está credenciada ao Detran do Distrito Federal e não pode dar o curso cobrado por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Nenhum certificado foi expedido até agora.

» O presidente da entidade, Robson Alves Paulino, além da proximidade política com o ministro Carlos Lupi, tinha trânsito com parlamentares de diferentes partidos. Conseguiu a aprovação de emendas no valor de R$ 3,5 milhões. O dinheiro não foi liberado.

» São inúmeros os indícios de irregularidades na aplicação do curso: nomes duplicados na lista de capacitados, quantidade inferior à prevista em contrato e inclusão de pessoas que nem têm CNH na categoria A.

» Outras seis entidades teriam sido favorecidas pelo Ministério do Trabalho na seleção para os cursos de capacitação. O edital foi mudado no último dia antes do fim do prazo de apresentação de projetos. Mesmo assim, o ministério continuou a financiar essas organizações.

» Mesmo com cursos já integralmente pagos pelo ministério, os postos do Sistema Nacional de Emprego (Sine) no DF não matriculam novos alunos há pelo menos dois meses.