Título: Após trauma, empresas do Brasil voltam à Colômbia
Autor: Moura , Marcos
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2008, Internacional, p. A11

Onze anos após ter tido dois de seus engenheiros seqüestrados pelas Forças Revolucionárias da Colômbia (Farc), a construtora mineira Andrade Gutierrez está recuperada do trauma e pronta para voltar a operar no país. Mais segura, com um ambiente mais propício aos negócios e com uma economia em melhor forma do que há uma década, a Colômbia tem chamado a atenção de um número crescente de empresas brasileiras. Mas não apenas pelas mudanças internas. A disposição do governo brasileiro de financiar obras e serviços no país, realizados por companhias brasileiras, ajuda também a reforçar o interesse pela terceira maior economia e segundo país mais populoso da América do Sul.

"O seqüestro foi um fator para sairmos da Colômbia", diz o vice-presidente para Relações Institucionais da empresa, Flávio Machado Filho. "Mas hoje, tendo em vista a situação do país, nos interessa em voltar a atuar aqui e estamos prospectando obras de infra-estrutura ferroviária, aeroportuária, metroviária, em Bogotá, particularmente, e de hidroelétricas." Os dois engenheiros estiveram por sete meses nas mãos da guerrilha e seguem no quadro da empresa - um deles hoje trabalha na Venezuela; o outro, no Ceará.

A Odebrecht, que também viveu no passado o drama de ter um funcionário seqüestrado na Colômbia, aposta agora num grande contrato para a construção da ferrovia do Carare. Em parceria com a Camargo Corrêa, a construtora baiana participa da licitação da obra com o impulso de um financiamento de US$ 650 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O banco desembolsou US$ 3,2 bilhões nos últimos dez anos na América do Sul e tem disposição de financiar diversos empreendimentos na Colômbia, como o metrô de Bogotá (ainda em fase estudo), hidrelétricas, linhas de transmissão e equipamentos para o setor de biocombustíveis.

"Já construímos ferrovias, estradas e hidrelétricas aqui, mas depois o país diminuiu o pacote de obras que nos interessava. Agora, o país está retomando seu ritmo e as condições de segurança estão bem melhores", diz o diretor de crédito à exportação da empresa, Antônio Almeida, que assim como Machado Filho integrou a missão empresarial que acompanhou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de semana a Bogotá. No sábado, 420 empresários e executivos de empresas, do Brasil e da Colômbia, participaram de um seminário de negócios na capital colombiana com a presença de Lula e do presidente colombiano, Álvaro Uribe.

Ao mesmo tempo em que conseguiu reduzir os indicadores de violência - os seqüestros, os homicídios e atos de sabotagem e atentados despencaram - o atual governo, ao longo dos últimos seis anos, centrou sua política econômica no equilíbrio das contas públicas, na redução da inflação e no crescimento econômico.

Apesar de um salto inflacionário este ano e de uma perspectiva de ligeira desaceleração da economia, o país, segundo empresários e diplomatas, oferece condições atraentes para investimentos e comércio. Exemplos são dois instrumentos pró-negócios criados pelo governo Uribe: o primeiro, a possibilidade de uma única empresa gozar do status de zona franca se gerar um determinado número de empregos e investir determinada quantia. O segundo, os chamados contratos de estabilidade jurídica, pelos quais o governo se compromete em manter as condições existentes no momento do investimento se manterão de 3 a 20 anos.

No encontro com empresários, Uribe falou das "barreiras de infra-estrutura" que o país tenta transpor dizendo que "necessitamos da presença do Brasil" para as obras.

O investimento estrangeiro direto na Colômbia superou os US$ 6 bilhões em 2007. Somente os investimentos de empresas brasileiras no país somaram US$ 500 milhões. Entre as grandes companhias brasileiras na Colômbia estão Votorantim e Gerdau (que juntas controlam 62% da produção siderúrgica colombiana); Petrobras, Camargo Corrêa, Vale, Natura e Marcopolo.

Algumas estão mais expostas a atentados e atos de grupos armados por atuarem ou pretenderem atuar em regiões do interior do país, onde ainda há riscos de ações de grupos guerrilheiros. É o caso da Petrobras, que entre outros, opera o poço de Guando, no departamento de Tolima (região onde as Farc nasceram nos anos 60 e onde ainda exercem influência). O Exército mantém um destacamento dentro das instalações da Petrobras para garantir a segurança. A empresa nunca foi atacada. É o caso também da OAS que disputa uma licitação para a construção de um túnel entre os departamentos Quindio e Tolima.

"Pelo o que já senti viajando pelo país, há um clima muito grande de segurança", disse Jorge de Oliveira Ribeiro Filho, gerente geral da diretoria internacional da construtora. Segundo ele, não seria nenhum impeditivo para a empresa eventuais gastos com segurança na obra. A empresa não conta com recursos do BNDES, mas está animada com a possibilidade de obtê-los em novas disputas no país.