Título: Falta de investidores coloca em risco a recuperação da BRA
Autor: Campassi, Roberta
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2008, Empresas, p. B1

A BRA, companhia aérea que parou de voar em novembro do ano passado, tenta dar as últimas cartadas para manter seu plano de recuperação judicial e evitar a falência. Ontem à tarde, os advogados e a administração da companhia reuniram-se para estudar alternativas que se apresentam cada vez mais limitadas.

A BRA enfrenta duas grandes dificuldades desde que entrou em recuperação no dia 30 de novembro de 2007. A primeira é atrair um investidor disposto a colocar a companhia aérea novamente em operação, conforme prevê o plano de recuperação. A outra é conciliar os interesses e ações dos atuais acionistas e credores. Dessa sincronia depende a votação do plano. Ele foi apresentado pela BRA em fevereiro deste ano e, até agora, após quatro assembléias de credores já realizadas, ele ainda não foi aprovado nem rejeitado.

A BRA vem buscando um investidor de forma ativa desde março e mirou no setor de transportes, mas não na aviação, segundo pessoas ligadas à companhia. Seriam necessários cerca de R$ 50 milhões para colocá-la novamente em operação.

Entretanto, nenhuma das conversas com potenciais investidores avançou. Dois dos motivos do desinteresse são a crise que o setor aéreo mundial enfrenta devido à alta dos preços do petróleo e o aumento da concorrência entre companhias aéreas dentro do Brasil, com a criação da Azul Linhas Aéreas, do empresário americano David Neeleman. O outro motivo que afasta investidores da BRA é a própria situação da companhia e a incerteza em relação à sua capacidade de se recuperar. As dívidas somam aproximadamente R$ 250 milhões, sendo que a maior parte dos credores é de instituições financeiras. A falta de harmonia entre os interesses de credores, acionistas e eventuais investidores também se tornou uma barreira.

A Union National, instituição financeira credora de aproximadamente R$ 34 milhões da BRA, estudou investir na companhia e desistiu. "Depois de fazer todas as contas, achamos que era um risco muito grande", afirma Mauricio Kattan, diretor da empresa.

O próprio David Neeleman chegou a analisar a possibilidade de investir na BRA no fim do ano passado, mas optou por criar do zero sua companhia aérea brasileira.

Nas últimas semanas, segundo o Valor apurou, a BRA vinha tentando negociar com seus credores financeiros para que eles transformassem suas dívidas em participação acionária e assumissem a companhia. O maior credor isolado e que em vários pontos da recuperação tem o maior poder de decisão é o ABN Santander, que cobra cerca de R$ 86 milhões da BRA. O banco teria analisado a opção de investir na empresa desde que encontrasse profissionais gabaritados para geri-la, o que não ocorreu. Uma alternativa aberta pelo ABN era vender seus créditos para outro credor interessado no negócio por apenas 10% do valor.

Até ontem, entretanto, não havia nenhum outro interessado em discutir o negócio. "Posso garantir que estamos fazendo de tudo para tentar salvar a companhia", afirma Danilo Amaral, vice-presidente da BRA. Segundo o Valor apurou, a companhia estuda entrar com um pedido de auto-falência, caso não haja novos desdobramentos até o fim desta semana.

Um outro ponto importante que emperra o plano de recuperação da BRA é a realização de um aporte dos seus atuais acionistas, os irmãos Walter e Humberto Folegatti e a Brazilian Air Partners (BAP), união de sete fundos de participação - o brasileiro Gávea, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, e os estrangeiros Darby, Millenium, HBK, Development Capital, Goldman Sachs e Bank of America. Os Folegatti, com cerca de 58% do capital, injetariam R$ 12 milhões e a BAP, com os 42% restantes, R$ 9 milhões.

O dinheiro serviria para quitar as dívidas trabalhistas (cerca de R$ 10 milhões) e fiscais (cerca de R$ 12 milhões). Sem esses débitos, um novo investidor teria mais segurança em assumir o negócio.

Na última assembléia de credores, ocorrida no dia 3 deste mês, os irmãos Folegatti ofereciam aportar três imóveis de sua propriedade com valor aproximado de R$ 20 milhões. A BAP, por sua vez, aportaria R$ 15 milhões, segundo declaração do vice-presidente da BRA, transcrita na ata da reunião.

Até agora, entretanto, nenhum dos aportes foi realizado. Nos bastidores, comenta-se que há resistência dos dois lados. Para a BAP, especialmente, o caso da BRA seria uma "página virada".

Sem os recursos dos acionistas e sem a perspectiva de um novo investidor, os credores até hoje não aprovaram o plano de recuperação judicial. Também não o rejeitaram, pois isso levaria a companhia à falência imediatamente. A BRA também não conseguiu transferir o contrato de compra de 20 aeronaves do modelo 195 da Embraer à Union, como previsto. A instituição financeira desistiu de adquirir os aviões e arrendá-los à BRA quando esta voltasse a operar.