Título: Julgamento rápido ajudaria lisura do pleito
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/07/2008, Opinião, p. A12

A Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) divulgou uma lista dos candidatos a prefeito e vice-prefeitos - candidatos "ficha-suja" que, pelos critérios da associação, são os que respondem a processo judicial instaurado por denúncia do Ministério Público (MP). Também provocado pela associação o Supremo Tribunal Federal (STF) deverá decidir, em 6 de agosto, se são elegíveis os candidatos que tenham condenação de primeira instância. A AMB quer uma liminar para que os juízes eleitorais possam decidir, caso a caso, se concedem registro para candidatos com ações ainda tramitando na Justiça.

É louvável a preocupação da AMB com a lisura das eleições e a rapidez com que tomou providências que considerou saneadoras. Mas a "ficha suja" tem aceitação duvidosa no mundo jurídico. O próprio presidente do STF, Gilmar Mendes, considerou que a lista de candidatos com pendências jurídicas é um "populismo de índole judicial". E ministros do STF chegaram a comparar a tentativa da AMB de impedir a candidatura de pessoas que ainda podem ser inocentadas pela Justiça a uma lei do governo Médici, o presidente mais duro da ditadura militar, que impedia políticos de se candidatarem se respondessem a processo judicial instaurado por denúncia do Ministério Público - mesmo critério usado pela associação para fazer a lista dos "fichas-sujas". As críticas à iniciativa da AMB procedem, em alguns casos - e a simples possibilidade de a lista atingir inocentes já é uma razão para temê-la. O fato de a Constituição prever que ninguém pode ser declarado culpado até sentença transitada em julgado - isto é, sem mais possibilidades de recursos - é para preservar reputações. E o fato de a lei eleitoral preservar as candidaturas daqueles que não foram condenados em última instância é para evitar "fabricação" de processos por adversários políticos que, com esse expediente e a simpatia de juízes locais, podem retirar candidatos do páreo. A lei prevê que não podem se candidatar aqueles que tiveram suas contas reprovadas por tribunais de contas quando ocupavam mandatos eletivos; e os com suspensão de direitos políticos por sentenças definitivas e por ausência de quitação eleitoral.

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) aprovou um projeto que amplia os casos de inelegibilidade, ao incluir aqueles que tenham pelo menos uma condenação em primeira instância. O projeto do Senado, que apensa um total de 20, aceitou artigo da proposta do senador Pedro Simon (PMDB-RS). Simon sugere que sejam inelegíveis candidatos condenados ainda com possibilidades de recursos, mas obriga a Justiça a julgar os recursos antes das eleições. Ou seja, a sentença tem que transitar em julgado antes do pleito, se o candidato tiver pendências na Justiça.

Julgar os processos é uma solução que a AMB parece não ter previsto, na sua estratégia de contribuir para a limpeza do pleito. A celeridade dos julgamentos, todavia, é a solução mais saneadora: se o processo for julgado em última instância rapidamente, não existirão mais os políticos que, com a ajuda de bons advogados e da profusão de recursos que a lei permite, continuem sendo elegíveis mesmo respondendo a dezenas de processos. E não existirão, de outro lado, aqueles processados injustamente e que terão seus direitos políticos suspensos sem que tenham cometido crimes - o que inevitavelmente ocorrerá se os sentenciados em primeira instância forem simplesmente considerados inelegíveis.

A AMB, aliás, cumpriria um excelente serviço se apontasse ao Legislativo e à sociedade caminhos legais para evitar a impunidade que decorre da morosidade judicial. Sugestões vindas de parte tão categorizada seriam certamente uma grande contribuição à democracia brasileira, que até hoje não resolveu o impasse entre dar garantias de defesa aos acusados e não deixar que os crimes fiquem sem punição. Da mesma forma, os partidos políticos poderiam dar uma grande contribuição ao pleito se filtrassem seus próprios candidatos. Em alguns casos, os partidos, independentemente dos processos que os candidatos respondem, sabem de quem eles se tratam.