Título: BC deve manter sua estratégia gradualista
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 21/07/2008, Opinião, p. A14

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse em depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado que a instituição não vai perseguir o centro da meta de inflação deste ano, definido em 4,5%. Mas deixou claro que fará "o que for necessário, enquanto for necessário", para alcançar esse objetivo em 2009.

É tarde demais para trazer neste ano ao centro da meta uma inflação que, pelas projeções do mercado financeiro, ameaça romper o teto do intervalo de tolerância, definido em 6,5%. A política de juros opera com defasagens. As decisões tomadas agora pelo BC terão o seu principal efeito na inflação daqui a nove meses. O que pode ser feito, como disse Meirelles, é buscar a menor inflação possível ainda este ano, seja com os efeitos residuais da alta dos juros, ou pelos efeitos de expectativa e câmbio.

Os desafios se impõem para 2009, sobretudo diante da descrença de setores do mercado financeiro na capacidade de o BC desinflacionar a economia dentro do período relevante para as decisões de política monetária. Os analistas econômicos prevêem uma inflação de 5% para 2009. Em tese, as altas de juros já feitas em abril e junho, e as que serão feitas pelo Comitê de Política Monetária (Copom) entre a reunião desta semana e os encontros marcados até março de 2009, deveriam ser suficientes para recolocar a inflação no centro da meta, também de 4,5%.

Se os economistas do setor privado não trabalham com essa certeza, é porque falta um pouco de credibilidade à política monetária. Caberia ao BC reafirmar os objetivos da política monetária, deixando claro que não adotará uma postura tolerante com o avanço da inflação.

É sempre possível argumentar que, se o BC optasse por uma convergência mais suave da inflação à meta, a chamada taxa de sacrifício seria menor. Ou seja, seria possível um maior crescimento econômico se, por exemplo, a autoridade monetária perseguisse uma inflação de 4,5% em 2010, em vez de 2009. O problema é que estratégias deflacionárias muito lentas criam dúvidas sobre o real comprometimento do BC em controlar a inflação, afetando negativamente as expectativas e aumentando os custos da política monetária.

Deve-se reconhecer que a inflação mais alta desse ano - dois pontos percentuais acima do centro da meta - significa uma inércia maior para o ano que vem. O trabalho do BC tende a ficar um pouco mais difícil, mas ainda assim é possível fazê-lo com custos relativamente baixos. Nos últimos anos, a política monetária lidou com desafios semelhantes e mostrou-se bem-sucedida. Entre 2004 e 2005, por exemplo, a inflação foi reduzida de 7,6% para 5,69%. De 2005 para 2006, sofreu uma redução ainda mais intensa, de 6,69% para 3,14%.

A autoridade monetária só lançou mão de estratégias mais gradualistas quando a inflação se situava muito acima da meta. Foi o caso de 2003, por exemplo, quando os preços subiam a uma taxa de 12% ao ano, bem acima do centro da meta então definida, de 4%. Na ocasião, o BC anunciou que perseguiria meta ajustada de 8,5%.

Para a reunião do Copom dessa semana, a aposta dominante dos analistas do mercado financeiro é uma alta de 0,5 ponto percentual na taxa Selic, que chegaria a 12,75% ao ano. Um número reduzido de analistas espera que o ritmo de aperto monetário seja intensificado, com uma alta de 0,75 ponto percentual.

Em que se pese os riscos à credibilidade da política monetária, o mais adequado, neste momento, é o BC manter sua estratégia gradualista, que no tempo certo terá o efeito no controle da inflação, fazendo-a convergir ao centro da meta em 2009. A política monetária se defronta permanentemente com balanços de riscos. Hoje, o mais grave deles é uma desaceleração mais pronunciada da economia e queda da inflação abaixo do desejado, depois que os juros futuros subiram fortemente e o governo tomou medidas de contenção fiscal e creditícia. Há o risco de deterioração adicional das expectativas de inflação, mas é bom ponderar que projeções para o período entre 2010 e 2013 permanecem ancoradas na meta.

Isso não quer dizer que o BC não deva reafirmar, por sua comunicação institucional, que seu objetivo é colocar a inflação na meta em 2009, mostrando que os movimentos feitos até gora na taxa de juros são mais do que suficientes para alcançá-lo.