Título: Juros sobem menos que a Selic
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 21/07/2008, Finanças, p. C1
Na quarta-feira, o Comitê de Política Monetária do Banco Central divulga a nova meta para a Selic. Desde o início do aperto monetário, em abril, o BC elevou o juro em um ponto percentual. Os bancos se tornaram mais seletivos na concessão de empréstimo, mas as altas da taxa ainda não foram repassadas integralmente para o juro do crédito bancário.
No fim de março, ou seja, antes da primeira elevação da Selic, a taxa de juros média para as pessoas físicas estava em 47,8% ao ano. No fim de maio, depois da alta de 0,5 ponto percentual e dias antes de uma nova elevação de 0,5 ponto já esperada pelos bancos, a taxa havia caído para 47,4% ao ano (último dado disponível).
Isso aconteceu porque, com medo da concorrência e ainda avaliando as conseqüências e as expectativas de inflação, os bancos optaram medidas que aumentam a seletividade, ao invés de subir os juros. Por isso, passaram a reduzir os prazos, elevar as notas de corte do sistema de avaliação do crédito (credit scoring) e, em linhas como veículos, exigir um maior valor de entrada.
Num primeiro momento, portanto, os bancos preferiram reduzir os spreads (margem de ganho que representa a diferença entre o custo de captação para os bancos e o juro cobrado do cliente). A queda, entre o fim de março e fim de maio foi de 1,8 ponto percentual. Essa foi a forma de manter mercado.
Para Nicola Tingas, economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos, o prazo ainda é curto para avaliar o comportamento dos bancos, mas de fato, a demanda por empréstimos cresceu muito nos últimos anos e o crédito passou a ter "vida própria".
Luiz Montenegro, presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef), afirma que no caso dos veículos, os repasses são mais lentos por ser uma modalidade de prazo mais extensos. "O crédito de longo prazo acompanha a tendência econômica do pais, mas os juros não aumentam na mesma proporção, tempo e velocidade da Selic".
Para ele, se houver um aumento de 50 pontos base na próxima reunião do Copom, para 12,75% ao ano, não vai haver impacto significativo para o cliente. "O consumidor que cotar operação hoje, e voltar na próxima semana, não vai notar a diferença".
Renato Oliva, vice-presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), entidade que representa os bancos médios, disse que a postura das instituições nesses casos é sempre mais "conservadora e pensativa", até para não prejudicar os seu relacionamento com o cliente.
Segundo ele, os aumentos foram localizados em alguns produtos e linhas, sendo uma "decisão individual de banco para banco". Este foi o caso do cheque especial, por exemplo, cujo juro subiu 7,3 pontos percentuais nesses dois meses. "Os bancos postergam a alta até o momento em que existe uma maioria indo na mesma direção".
Esse momento, disse ele, deve acontecer dentro de dois ou três meses e, quando vier, irá refletir estará refletindo não só o aumento do custo financeiro, como também "um maior agravamento da inadimplência".
Ele pondera, no entanto, que esse prazo de dois a três meses pode ser precipitado caso o Banco Central acelere a alta para 0,75 ponto percentual. Esse novo patamar, aliás, já é esperado por alguns analistas, como o diretor do departamento de pesquisas do Bradesco, Octavio de Barros.
Barros lembra que o presidente do BC, Henrique Meirelles, afirmou à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, que está pronto para agir "vigorosamente" para trazer a inflação para o centro da meta (4,5%), em 2009. Meirelles voltou a afirmar que está comprometido em "fazer o que for necessário, enquanto for necessário", e disse que o BC não vê vantagem em continuar com inflação alta.
Para o diretor do Bradesco, as afirmações mais incisivas do presidente do BC vêm na mesma semana em que as expectativas de inflação chegaram a 6,48% para esse ano e a 5% para o ano que vem, ambas acima da meta para esses anos. "A decisão em relação à taxa de juros será anunciada dia 23 de julho e esperamos aumento de 0,75 pontos percentuais".
A visão, no entanto, não é compartilhada pela maioria dos banqueiros e analistas, que esperam por uma alta de 0,5 ponto. "Esta seria uma mensagem do BC de que a preocupação com 2009 aumentou. Isso pode ser interpretado pelo mercado como uma coisa perigosa", avalia Oliva.
Mas o fato de a alta não ter sido repassada integralmente não ocorreu por mera bondade dos bancos. Com os custos pressionados desde o fim do ano passado, os bancos realizaram um forte ajuste das taxas em janeiro, de quase cinco pontos percentuais. Essas pressões ocorreram por conta da crise americana e da criação do compulsório para depósitos interfinanceiros das empresas de leasing.
Além disso, aos poucos, os bancos vão ajustando os preços de seus produtos. Pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) aponta que em junho houve elevações em todas as taxas bancárias (os dados oficiais do BC devem ser divulgados na terça-feira).