Título: Governo decide com setor privado se briga por etanol
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 31/07/2008, Brasil, p. A6

A decisão do Brasil de abrir uma disputa contra os Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) por causa das barreiras ao etanol depende agora de quem vai pagar a conta dos advogados. Esse tipo de contencioso custa até US$ 3 milhões. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que a disputa "está encaminhada", mas vai ouvir de novo o setor privado, que até então não queria o contencioso.

Só que a situação mudou. Sem acordo na Rodada Doha, que poderia abrir uma solução para o etanol, o setor privado acha que a alternativa é mesmo contestar a tarifa secundária de US$ 0,54 por galão aplicado na importação do biocombustível.

No Brasil, normalmente é o setor que pede a disputa que banca a fatura. Foi o caso dos produtores de algodão numa briga contra os EUA. Mas os produtores de etanol acham que o governo deve abrir também o bolso desta vez. Afinal, não se trata de interesse unicamente de um segmento. O biocombustível está no centro da política externa do país e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o maior propagador do produto.

O setor privado alimentava esperanças de um entendimento bilateral, que se esvaiu esta semana, e sabe que uma disputa tem custo mais que econômico. Demora no mínimo 16 meses e a decisão não é retroativa. Ou seja, pode eventualmente provocar mudanças nos programas do país condenado. Mas isso demora e são necessárias novas queixas na OMC para as decisões serem respeitadas.

Basta ver a briga do Brasil contra os EUA no caso do algodão. Está há anos na OMC. Washington mudou algumas coisas em programas que afetam produtores brasileiros. Mas não tudo. Um comitê de arbitragem da OMC deve decidir o valor da retaliação que Brasília poderá aplicar contra produtos americanos. Mas será uma vitória moral, sem impacto para os produtores de algodão que pagarem a conta da briga. Será difícil o Brasil aplicar sanções contra importações americanas, porque isso pode prejudicar setores da economia brasileira.

É por isso que a alteração de regras do Órgão de Solução de Controvérsias é uma das discussões abertas na OMC. Em vez de sofrer retaliação, o perdedor deveria oferecer compensações, reduzindo a tarifa ao ganhador por um certo período, por exemplo.

A abertura de contencioso no caso do etanol na OMC será útil como pressão sobre os EUA. Em outra disputa, junto com o Canadá, o Brasil já pressiona também contra subsídios ao etanol americano. Indagada sobre como reagia à ameaça brasileira de mais um contencioso, a representante comercial americana, Susan Schwab, preferiu fazer o gesto de um beijo ao repórter. E partiu. (AM)