Título: Arrocho não assombra
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 02/03/2011, Política, p. 4

» Denise Rothenburg

De nada adiantou que os ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, tenham se desdobrado para cortar os R$ 50 bilhões dos gastos públicos. Os políticos já se mobilizam no sentido de retomar pelo menos parte das despesas. É que técnicos e parlamentares acostumados a mexer com Orçamento trataram a tesourada apenas como o fechamento de uma comporta que pode ser aberta adiante.

¿Mexo há 16 anos com Orçamento. Todo início de governo é a mesma coisa: vem o anúncio dos cortes e, depois, lá para outubro, equilibra e libera¿, diz o deputado João Leão (PP-BA). ¿É preciso cortar para chamar e conversar. Aí, depois, libera¿, completa o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP).

O raciocínio dos parlamentares é simples: despesa prevista que acabou e não volta mais só mesmo aquela que foi vetada pela presidente Dilma Rousseff em 10 de fevereiro, quando foi sancionado o Orçamento de 2011. Ali, o corte foi de R$ 1,8 bilhão e atingiu várias obras e serviços. Só na área de Ciência e Tecnologia foram R$ 711 milhões. Devanir Ribeiro (PT-SP) conta que perdeu algumas emendas, como R$ 400 mil para investimentos em tecnologia em São Carlos.

Mas, quanto aos cortes de R$ 50 bilhões anunciados, não só ele como outros políticos consideram que há salvação. ¿Se o decreto sair apenas com os limites de empenho para cada ministério, significa que foi apenas um contingenciamento. E, nesse caso, se houver uma melhora das contas públicas e do cenário internacional, esses valores poderão ser liberados no futuro¿, comenta o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), que aguarda a edição do decreto para saber o que o Distrito Federal perderá em termos de projetos.

Sem rebeldia A ausência de preocupação dos políticos no quesito orçamento tem ainda outro fator: Metade dos deputados não se reelegeu. Isso significa que metade das emendas não têm mais quem brigue por elas dentro do Congresso. E as emendas de bancada ¿ aquelas de valores mais altos ¿ raramente emplacam. Por isso, ninguém se rebelou contra o governo ou fez greve no painel de votações.

O ceticismo, entretanto, não é o mesmo dos líderes do governo. Ontem, todos cobraram cautela à base no que se refere à possibilidade de liberação desses recursos. ¿Os cortes são necessários e é preciso compreensão por parte da base¿, afirmou o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP).

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), vai na mesma batida: ¿Não se trata de insatisfação, mas de certo desconforto. Os cortes são necessários porque temos de manter a estabilidade econômica. Nós, do Congresso, temos que dar nossa cota de sacrifício¿, afirmou. Os deputados esperam ainda hoje a edição do decreto com os limites de gastos de cada ministério. Aí vai começar a guerra para aprovar as emendas que não sucumbiram ao veto de R$ 1,8 bilhão. ¿Esse valor, sim. Só Dilma pode trazer de volta. Quanto aos demais, basta esperar e logo, logo, está equilibrado¿, acredita João Leão.

Descrédito ministerial » Os cortes propostos pelo Executivo estão em descrédito até em ministérios atingidos pela ¿tesoura¿. No Ministério das Cidades, a expectativa é que o corte fique diluído e não afete o Minha Casa, Minha Vida. No Turismo, o contingenciamento afetará despesas com a máquina. Segundo a pasta, será priorizada a preparação dos destinos turísticos para receber a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016.