Título: CVM tentará diálogo com a PF para troca de dados
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Fonte: Valor Econômico, 28/07/2008, EU & S.A., p. D3

Maria Helena, presidente da autarquia: mercado deve repensar a governança A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) buscará diálogo com a Polícia Federal (PF) para estabelecer uma relação de trabalho conjunto, quando houver espaço para tal. "Seria bom se pudéssemos evoluir na mesma direção do convênio que temos com o Ministério Público", afirmou Maria Helena Santana, presidente da autarquia, após evento da BM&F Bovespa em comemoração à listagem de cem empresas no Novo Mercado.

A entrevista coletiva de Maria Helena foi marcada por uma grande quantidade de questões relacionadas às últimas ações da PF, que, em diferentes medidas, apresentaram vínculo com o mercado de capitais - seja por envolver executivos e empresários de empresas abertas , seja por conter discussões sobre uso de informação privilegiada e lavagem de dinheiro.

Para a presidente do órgão regulador, a CVM poderia até mesmo contribuir, quando possível, com as investigações conduzidas pela PF, por causa da experiência específica em mercado de capitais. Além disso, ter conhecimento de algumas informações ajudaria a autarquia a se preparar com medidas preventivas quando fossem deflagradas as operações policiais.

Recentemente, por exemplo, a PF prendeu três executivos da companhia Agrenco, que listou ações na Bovespa em outubro do ano passado. As investigações da chamada Operação Influenza tiveram início antes da abertura de capital da companhia, e as gravações obtidas pela polícia contam com discussões a respeito da difícil situação financeira da empresa e de como isso poderia prejudicar a oferta de ações. Em entrevista ao Valor, o delegado responsável pelo caso, Airton Takada, afirmou ter consciência de que as questões afetariam os investidores.

Há poucas semanas, outra operação da PF, a Satiagraha, levou à prisão do fundador do Banco Opportunity, Daniel Dantas, e diversos executivos da instituição, além do investidor Naji Nahas. A empresa de Eike Batista, a mineradora MMX, também foi afetada por investigações da PF.

Por conta desse cenário, o discurso de Maria Helena no evento comemorativo da BM&F Bovespa destoou dos demais. No lugar de só destacar os avanços do Novo Mercado e da governança corporativa no Brasil, como fizeram os palestrantes que a antecederam, a presidente da autarquia chamou atenção para esses "recentes episódios" e enfatizou como eles são "traumáticos" para o país e como os danos de imagem podem ser profundos. "O debate público atual corre o risco de colocar toda empresa como suspeita, o investidor como ingênuo e os demais agentes do mercado como coniventes." Para ela, a busca de culpados a qualquer preço pode gerar regras de má qualidade.

Em seu primeiro posicionamento público depois de tais acontecimentos, Maria Helena manteve a aposta forte na auto-regulação. Mas também enfatizou a importância de uma avaliação profunda dos investidores antes de decidirem suas aplicações. "Nada substitui a diligência do investidor."

Ainda assim, chamou todos os agentes envolvidos com o mercado de capitais brasileiros, além da própria CVM, a repensar a importância de uma atuação forte. Praticamente todos os grandes agentes foram citados: representantes de companhias (Abrasca), de relações com investidores (Ibri), de bancos (Anbid), de auditores (Ibracon) e a própria BM&F Bovespa.

Dessa forma, convocou os participantes de mercado a repensar o cenário e avaliar possibilidades de mudanças, para garantir a evolução do ambiente de governança. Para ela, a entressafra do mercado de capitais e a experiência acumulada com o forte movimento dos últimos anos fazem desse momento uma boa oportunidade para aprimorar essas regras de governança. A presidente da CVM e uma das criadoras do Novo Mercado vê inclusive espaço para discussão do aprimoramento das normas do segmento especial. (GV e DF)