Título: Lula vai vetar projeto sobre inviolabilidade de escritórios
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 29/07/2008, Legislação & Tributos, p. E2

O governo vai vetar - ainda não definiu se parcialmente ou integralmente - o Projeto de Lei nº 36, de 2006, que impede buscas e apreensões em escritórios de advocacia mesmo com autorização judicial. Durante uma reunião da coordenação política realizado na manhã de ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a expressar que os limites do sigilo na relação entre advogado e cliente devem ser preservados. Mas ressalvou: "Não faz nenhum sentido você privilegiar alguns setores da sociedade", afirmou o presidente.

Na avaliação, quase unânime dos integrantes da coordenação, o projeto, aprovado em votação simbólica no Congresso Nacional, não acrescenta nada na relação de sigilo já assegurada entre o advogado e seu cliente. "Inclui, sim, elementos que podem dificultar algumas investigações necessárias em certos casos", declarou um ministro que participou da reunião de ontem.

Lula tem até o dia 11 de agosto para definir o tamanho do veto ao projeto. O ministro da Justiça, Tarso Genro, expôs durante o encontro as resistências que o texto congressual vem enfrentando em vários setores jurídicos. "Ao analisar essa questão, precisamos levar em conta três aspectos: o primeiro, é respeitar as prerrogativas dos advogados; observar se essas prerrogativas não estão favorecendo a impunidade e assegurar o sigilo dos dados do cliente", disse Genro.

Na tarde de ontem, o ministro da Justiça participou de uma ampla reunião com representantes de diversos setores da atividade jurídica, todos contrários à lei e favoráveis ao veto total. O grupo entregou ao ministro um documento, subscrito por nove entidades, englobando juízes, procuradores, delegados da Polícia Federal, dentre outros, alertando que a lei, caso seja sancionada, impedirá que os advogados sejam investigados. "Tornará substancialmente mais fácil para os criminosos fazer uso de escritórios de advocacia para esconder provas do cometimento de seus ilícitos, tornando-os imunes à ação da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário".

De acordo com juristas, a própria Constituição Federal já estabelece restrições à concessão de mandados de busca e apreensão, o que tornaria a lei desnecessária e inconstitucional. Mais do que se ater à questão legal, procuradores e juízes demonstraram preocupação com a imagem que ela passaria à opinião pública caso não venha a ser vetada. "A prevalecer o pretendido no projeto, não poderiam ser decretadas a busca e a apreensão em escritório de advogado mesmo se surgissem indícios veementes de que o local estaria sendo utilizado para ocultar arma, revólver ou faca, por exemplo".

As entidades, reunidas ontem no Ministério da Justiça, reconhecem que um novo debate sobre o tema pode ser travado posteriormente, desde que o texto atual seja vetado na íntegra. O ministro Tarso Genro ainda deve conversar sobre o caso com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, e o deputado Michel Temer (PMDB-SP), autor do projeto.

Uma fonte ouvida pelo Valor lembrou que não são raros os casos de advogados que se envolvem com seus clientes para a práticas de delitos. "Fernandinho Beira-Mar tinha três escritórios de advocacia trabalhando para ele, cometendo crimes. Quando um advogado for investigado criminalmente, o juiz pode tomar atitudes contra ele sim", defendeu uma autoridade do primeiro escalão.

Além da questão do projeto de lei relativo aos escritórios, a coordenação política tratou ontem também da questão dos grampos e escutas telefônicas clandestinas, outro debate surgido após a deflagração da Operação Satiagraha. Um projeto de lei regulando o uso de escutas telefônicas está em tramitação no Congresso. Lula pediu aos ministros da Justiça, Tarso Genro e da coordenação política, José Múcio Monteiro, para que procurem os presidente da Câmara dos Deputados e do Senado, para pedir que o texto entre na pauta do Congresso logo após as eleições municipais.