Título: Governo não quer assumir compromisso de zerar déficit nominal este ano
Autor: Safatle , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 06/08/2008, Brasil, p. A4
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, até perseguirá o objetivo de zerar o déficit nominal se possível ainda este ano, mas não deverá fazer disso um compromisso explícito, uma nova meta do governo. Há uma série de incertezas pela frente que recomendam cautela, a começar pelo ritmo do nível de atividade econômica.
A equipe técnica do Ministério da Fazenda acredita que a economia pode estar entrando em uma leve desaceleração, que só vai ficar mais nítida no último trimestre do ano. Não está claro qual será o impacto disso na arrecadação de impostos e contribuições, que até o momento tem surpreendido pelos sucessivos recordes. O segundo semestre é, sazonalmente, de maior pressão sobre o gasto. Neste mês, por exemplo, o Tesouro Nacional começa a pagar a antecipação do 13º salário para os aposentados do INSS, tornando mais difícil o aumento do superávit primário para além da meta de 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB).
O déficit nominal das contas públicas, que contabiliza as despesas correntes e os gastos com juros da dívida pública, é de 1,94% do PIB em 12 meses até junho, equivalente a R$ 52,7 bilhões. Mantega manifestou a intenção de buscar a eliminação do déficit em debate segunda-feira, em São Paulo, patrocinado pela revista "Carta Capital". O economista e conselheiro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Luiz Gonzaga Belluzzo, que participou do evento, disse que se o governo aumentar o superávit primário de 4,3% para 5% do PIB este ano, seria possível a zeragem do nominal. Ele reconhece que não é uma tarefa fácil.
Acabar com o déficit público em seu conceito mais amplo (o nominal), que no primeiro semestre do ano foi de apenas 0,14% do PIB, seria uma contribuição inegável do governo para a política de controle da inflação. Colocaria sob um mesmo compasso as políticas fiscal e monetária, evitando, assim, que o processo de aumento dos juros se traduza numa interrupção do "boom" de investimentos privados em curso no país, defendeu Belluzzo.
Legítimo keynesiano, Belluzzo disse que hoje há clareza entre os economistas de que essa é a melhor combinação de políticas. "Nos momentos de aceleração do investimento privado, cabe ao Estado poupar", disse ele, ao advogar a eliminação do déficit nominal. Na verdade, "teria sido melhor que já tivesse tido isso", ressalvou. Em 2005 houve intenso debate sobre isso, que não prosperou. Ele adiantou que com mais dois aumentos da taxa Selic, atualmente em 13% ao ano, porém, esse objetivo já se torna mais complicado porque o déficit vai aumentar.
Belluzzo e o ex-ministro Delfim Netto almoçaram com o presidente Lula na semana passada, em mais uma rodada de conversas sobre os rumos da economia.