Título: Juro mais alto fortalece aposta em PIB de 3% a 3,5% no ano que vem
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 06/08/2008, Brasil, p. A5

Com a expectativa de um ciclo mais forte de alta de juros, começa a se consolidar a aposta de bancos e consultorias num crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) entre 3% e 3,5% no ano que vem, uma queda considerável em relação aos quase 5% esperados para este ano. A política monetária rigorosa deve provocar uma desaceleração mais intensa do crédito em 2009, um processo ainda incipiente, e afetar o mercado de trabalho, fazendo o emprego e a renda crescerem a um ritmo mais fraco. A intenção do Banco Central (BC) de trazer a inflação para o centro da meta (4,5%) no ano que vem pode exigir que os juros fiquem mais altos por mais tempo, dizem analistas.

Depois de o Comitê de Política Monetária (Copom) intensificar o ritmo de alta da taxa Selic no mês passado, de 0,5 para 0,75 ponto percentual, o Banco Real revisou de 3,8% para 3,5% a sua previsão de crescimento para 2009, mantendo a estimativa de 4,7% para este ano. Segundo o economista Cristiano Souza, do Real, a decisão do Banco Central (BC) o levou a rever para cima a trajetória dos juros neste ano e no próximo. Ele acredita que a Selic vai encerrar 2008 em 14,75% e 2009 em 12,75%, nos dois casos 0,5 ponto acima de sua projeção anterior. Hoje, a taxa está em 13%.

"Não haverá um tombo da atividade no ano que vem, mas, para a inflação voltar para a trajetória das metas, será necessário que o PIB avance a um ritmo inferior ao do crescimento potencial por alguns trimestres", diz Souza, que estima entre 4% e 4,5% o PIB potencial - aquele que não causa pressões inflacionárias. Ele acredita que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficará em 4,5% em 2009, depois de atingir 6,3% neste ano.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, que apostava num PIB de 4,2% em 2009, revisou a sua previsão para 3,5%. Vale não considera, porém, que o menor crescimento será uma "desaceleração brusca" da economia. "A razão disso é que acreditamos que o ajuste que o BC tentará fazer será o mais rápido possível." A alta da Selic será mais veloz para que depois os juros possam cair mais rapidamente, acredita ele, que prevê juros de 14,75% no fim deste ano e de 12,75% no fim de 2009.

Para Vale, a tarefa do BC de derrubar a inflação será mais "fácil" por causa da expectativa de que os preços de commodities se acomodarão num nível mais baixo. "Elas têm um cenário um pouco mais benigno no ano que vem com um crescimento mundial mais fraco, principalmente dos emergentes ." Vale ressalva que esse diagnóstico pressupõe que não haverá nenhum problema climático mais complicado. A MB vê um IPCA de 7% neste ano e de 5,1% em 2009.

Com juros mais altos, ele espera uma desaceleração do crédito a partir do segundo semestre deste ano. Nos 12 meses até junho, os empréstimos e financiamentos para a pessoa física tiveram crescimento de 32,4%, um número ainda muito elevado. O economista-chefe do Itaú, Tomás Málaga, acredita que esse ritmo deva cair para a casa de 15% a 20% em 2009.

Além do crédito, o mercado de trabalho também deve ter um desempenho menor. A MB projeta que a massa de rendimentos avance 4,6% acima da inflação em 2008 e 3,5% em 2009. Com perspectivas menos positivas para a renda e o crédito, o consumo das famílias deve passar de uma expansão na casa de 6,5% neste ano para algo abaixo de 5% no ano que vem.

Há quem trace um cenário mais cauteloso para a política monetária do que Souza e Vale, como a economista Giovanna Rocca, do Unibanco. Ela vê a Selic em 14,75% no fim deste ano e em 15,25% no fim do ano que vem. Com isso, o crescimento deve ficar em 3% em 2009, estima Giovanna. Ela prevê um IPCA de 6,2% neste ano e de 4,8% no ano que vem. "Como a inflação deve continuar acima do centro da meta, não haverá espaço para cortes da Selic em 2009." Giovanna diz que o investimento tende a sofrer uma desaceleração considerável, por se tratar do "componente mais cíclico" da demanda. Depois de três anos de alta superior a dois dígitos, o investimento crescerá algo entre 6% a 8% em 2009, prevêem os analistas.

Málaga, do Itaú, acredita que o crescimento do PIB deverá ficar entre 3% e 3,5% no ano que vem, embora tenha como previsão oficial uma alta de 3,12%. Para ele, a estratégia do BC de intensificar a alta dos juros pode ser interessante. Segundo Málaga, se o BC conseguir controlar as expectativas de inflação - que apontam um IPCA de 6,54% em 2008 e de 5% em 2009 -, é possível que os juros não tenham que atingir os 15% estimados por ele para dezembro.

A economista Lygia Cesar, da MCM Consultores, tem uma previsão mais otimista para o crescimento em 2009, de 3,9% - o mesmo percentual apontado pela média dos economistas ouvidos pelo BC. Ela diz que a desaceleração em relação aos 4,8% deste ano será relativamente suave, embora considere que 3,9% seja um "teto" para o crescimento no ano que vem. A perda de fôlego do crédito, um mercado de trabalho menos favorável e uma economia global que cresce menos vão levar a uma expansão mais branda, avalia Lygia.

Para este ano, os bancos mantêm estimativas de crescimento próximas a 5% por causa da defasagem entre a alta dos juros, iniciada em abril, e o seu impacto sobre a atividade econômica.