Título: Mantega assume inflação de 6,54% este ano, acima da meta
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Fonte: Valor Econômico, 05/08/2008, Brasil, p. A5
Mantega: governo pode elevar meta de superávit fiscal para conter inflação A recente desaceleração dos índices inflacionários parece ter trazido alívio ao governo federal. Durante seminário promovido em São Paulo sobre os desafios ao crescimento econômico, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apresentou projeções otimistas para 2009 e respondeu com bom humor a críticas dos economistas, que encaram com reservas as projeções.
No cenário traçado por Mantega, a inflação em 2008 fecha a 6,54% - acima do teto da meta fixada pelo Banco Central, de 6,5% - e volta ao objetivo de 4,5% já no próximo ano. O resultado fica acima da inflação hoje acumulada em 12 meses, de 6,06%, mas por conta da base de dados avaliada, segundo o ministro. "Podemos dizer que a inflação está sob controle", disse. Para manter a inflação sob controle o governo não poupará esforços, podendo elevar a meta de superávit primário, que neste ano já foi elevada em 0,5 ponto percentual, para 4,3%. "Se necessário, usaremos a política fiscal para garantir o cumprimento das metas", afirmou.
Mantega também disse que a política monetária não "abortará" o ciclo de crescimento econômico. "O governo não vai permitir um crescimento do PIB inferior a 4% em 2009. A demanda tem que continuar a crescer, o crédito tem que continuar a crescer, mas a níveis mais baixos do que os vistos até agora", afirmou. Ele estima para 2008 crescimento do PIB de até 5% e, para 2009, de 4,5%.
Antonio Delfim Neto, professor emérito da Faculdade de Economia e Administração da USP e ex-ministro da Fazenda, considerou improvável a redução da inflação para 4,5% em 2009, dado o cenário inflacionário internacional. "Estamos numa atitude extravagante de reduzir a expectativa de inflação sozinhos, enquanto os outros países trabalham em sentido contrário", afirmou. Ele observou que, entre 2004 e 2006, o aumento do preço externo das commodities foi compensado pela valorização do real frente ao dólar. Mas não houve mais simetria a partir de 2007, com a forte alta das commodities. A desvalorização do real no próximo ano com a queda da taxa Selic atuará como fator de pressão inflacionária, observou Delfim Neto.
O ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira apontou como outro fator de preocupação o IGP-M, que segundo o relatório Focus deve encerrar o ano em 12%. O índice é utilizado como referência para o reajuste de preços administrados. Outro ponto criticado foi a elevação da taxa de juros. A valorização do real, disse Bresser, pode comprometer as reservas internacionais e gerar, em dois ou três anos, uma crise na balança de pagamentos. Para Bresser, o governo deveria ter baixado a taxa Selic para 1% ou 2% de juros reais nos últimos anos, mas manteve a taxa acima de 7%.
Mantega respondeu que o ajuste monetário foi fundamental para "corrigir exageros", como o crescimento da demanda agregada. O governo previa para o PIB de 2007 crescimento de 4,7% a 4,8% e ficou em 5,4%. E descartou a possibilidade de crise. "A deterioração do saldo de transações correntes não será grande porque as reservas internacionais ainda são grandes. Embora não goste desse quadro, acredito que ele será passageiro", disse Mantega, ressaltando que a taxa básica de juros será reduzida tão logo a inflação seja controlada.
Yoshiaki Nakano, diretor da Escola de Economia de São Paulo (EESP-FGV), também criticou a política monetária e ponderou que os juros mais altos estimularão os bancos a elevarem a oferta de crédito - um dos principais fatores responsáveis pelo crescimento da demanda doméstica no primeiro semestre. "O crescimento sustentado se dá com abertura da economia e aumento das exportações. O Brasil precisa elevar a exportação e isso não pode ser feito com o câmbio atual", disse. Nakano também defendeu uma taxa de investimento de 25% do PIB, média de outros emergentes, para garantir o crescimento sustentado, mas ponderou que é difícil elevar o nível de investimento com a taxa de juros atual. "Com essa parceria infernal de câmbio e juros teremos um surto de crescimento que vai durar mais do que no passado, mas não haverá um ciclo sustentado", avaliou.
Mantega disse que a valorização do real teria chegado a um ponto de inflexão, havendo pouca possibilidade de forte valorização. "Ele [o real] deve reagir e caminhar para um nível mais desejável. Acho que estamos esbarrando no limite."