Título: Blackstone , Brian
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2008, Internacional, p. A8
Recessões normalmente não se parecem com esta, pelo menos no que diz respeito à produtividade.
Nas seis recessões dos Estados Unidos desde 1970, a produtividade do trabalhador, ou a produção por hora, cresceu meros 0,8%, em média. Mas, desde o fim do ano passado, mesmo com a fraqueza econômica, estima-se que a produtividade tenha crescido uma média anualizada de 2,5%.
Isso desafia o comportamento normal da produtividade de "subir em tempo bom e cair em tempo ruim", diz Rajeev Dhawan, diretor do Centro de Previsões Econômicas da Universidade do Estado da Geórgia.
A trajetória da produtividade não é apenas um debate acadêmico. Que ela continue alta mesmo em tempos difíceis é algo de grandes implicações para o crescimento econômico, a inflação, o nível de emprego e, no fim das contas, os padrões de vida. Por exemplo, um forte crescimento da produtividade permite que o Federal Reserve (o banco central americano) mantenha as taxas de juros mais baixas, por contrabalançar pressões inflacionárias de commodities. Isso, por sua vez, pode ajudar a dar um estímulo à economia.
Mas "é uma espécie de faca de dois gumes", diz Chris Varvares, da Macroeconomic Advisers, já que os ganhos de eficiência podem implicar que as empresas conseguem produzir com menos trabalhadores, o que exacerba o desemprego no curto prazo.
Alguns economistas dizem que o crescimento saudável da produtividade atual reflete uma mudança na economia de setores internos menos produtivos, como a construção civil, para indústrias exportadores, que tendem a ser bastante eficientes. Essa transição foi ajudada pela fraqueza do dólar, que tornou as exportações americanas mais competitivas.
"É uma história de composição", diz Dale Jorgenson, um especialista em produtividade da Universidade Harvard. A produtividade, explica, é "lânguida" na construção, de modo que o declínio do setor em relação ao total da economia nos últimos trimestres "vai certamente ser positivo para a produtividade" na média.
Qualquer que seja sua causa, o Fed tomou nota do forte crescimento. "Acho que é muito impressionante que mesmo durante todo esse tumulto (...) a produtividade trabalhista dos EUA tenha continuado a crescer mais rápido que em quase qualquer outro país industrial, e isso só mostra como esta economia é forte", disse o presidente do Fed, Ben Bernanke, num recente depoimento no Congresso do país.
No mínimo, o forte desempenho recente da produtividade silenciou os que achavam que os ganhos anteriores eram amplificados por uma fraca tendência subjacente. No ano passado, segundo minutas de uma reunião, diretores do Fed disseram que parte do declínio na produtividade subjacente "não podia ser descartado - algo que poderia ter implicações para os custos das empresas e as pressões de preço".
"Havia algum nervosismo quanto à questão de se [a tendência de produtividade] foi realmente aumentada", diz Martin Baily, que foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos do ex-presidente Bill Clinton e agora está no Brookings Institution. O mais recente período "sugere que talvez estejamos nos saindo muito bem", com a tendência subjacente de um crescimento entre 2% e 2,5% por ano. Isso pode ajudar a compensar um declínio que a maioria dos economistas espera no crescimento da força de trabalho anual, à medida que os "baby boomers" (a geração do pós-Segunda Guerra) se aposente, deixando o "limite de velocidade" máximo do crescimento econômico - antes de provocar inflação - provavelmente perto de 3%.
Ainda assim, alguns especialistas advertem para os perigos de se abstrair demais dos ganhos recentes. Afinal, a produtividade permaneceu surpreendentemente forte durante a recessão de 2001 e o período posterior, o que na época levou alguns a se perguntar se a economia havia entrado numa segunda fase de crescimento da produtividade - uma espécie de nova Nova Economia.
A crença geral é de que a primeira Nova Economia, no fim dos anos 90, se concentrou na produção de equipamento de tecnologia da informação. A segunda fase, no começo desta década, representava a aplicação da TI a outros setores, particularmente o varejo - o que os economistas chamavam de efeito Wal-Mart.
O crescimento da produtividade desacelerou de 2005 a 2007, expandindo-se apenas 1,5% por ano, em média. Isso sugeriu que os ganhos mais fáceis já haviam sido obtidos quando houve os benefícios da TI. Dados de produtividade do segundo trimestre que serão divulgados pelo governo americano na sexta-feira vão incluir revisões para anos anteriores.
O crescimento da produtividade nas exportações está bem acima da média da economia em geral. Num estudo do ano passado, um grupo de economistas constatou que as fábricas envolvidas em produção de exportações tinham produtividade da mão-de-obra significativamente maior, cerca de 26%, do que as que não estavam. A mesma situação valia para serviços.
"Quando as exportações estão relativamente fortes, isso implica que as empresas mais produtivas em manufatura e serviços estão crescendo, e isso vai aumentar o crescimento agregado da produtividade", diz um dos autores do estudo, Andrew Bernard, que leciona na Faculdade Dartmouth.
Baily diz que esse é o "lado positivo" da queda do dólar americano, que estimulou as exportações. As exportações líquidas contribuíram para o crescimento do produto interno bruto em oito dos últimos dez trimestres, inclusive com uma enorme contribuição de 2,42 pontos porcentuais no último trimestre. A construção civil teve um efeito negativo em dez trimestres consecutivos.
Por si só, a mudança para menor participação da construção no PIB pode adicionar apenas frações de ponto porcentual à produtividade. O mesmo vale para a realocação para exportações. Mas a combinação, acumulada ao longo de anos, pode ter um efeito significativo no potencial da economia de crescer sem uma aceleração da inflação.
"Esta é uma área na qual uns poucos pontos básicos de crescimento fazem uma verdadeira diferença", diz Baily.
Diferentemente dos anos 70, a recente alta dos preços de combustíveis não deve coibir a produtividade. Num recente estudo para o Fed regional de Atlanta, Dhawan, da Universidade da Geórgia, e um par de economistas do Fed de Atlanta constataram que, antes de 1982, os preços mais altos do petróleo afetaram negativamente a produtividade. "Esse contágio desapareceu desde então", escreveram.
E pode até ir no sentido oposto. Apesar da disparada nos preços das matérias-primas, as empresas americanas estão tendo pouca capacidade de repassar aumentos de custos para os consumidores. Isso pode deixá-las sem muitas alternativas a não ser arrancar mais produtividade para evitar um grande impacto em seus lucros.