Título: Mundo online e a morte dos partidos
Autor: Lloyd , John
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2008, Opinião, p. A11
Quando Gordon Brown era ministro das Finanças, por ocasião da conferência do Partido Trabalhista do Reino Unido em setembro de 2000, líderes sindicais que controlavam o "voto de liderança" optaram pela restauração de um vínculo entre pensões e remuneração média. Brown então retrucou: "Eu não cederei à proposta apresentada hoje pelos líderes sindicais... (pois) estou ouvindo toda a comunidade". Ele, agora, é o primeiro-ministro, e ouvir toda a comunidade, ou a parte dela, em nome da qual a mídia noticiosa e as pesquisas de opinião alegam falar, é uma tarefa mais árdua do que fazer uma conferência do Partido Trabalhista, por mais grave que esta possa ser.
Suas palavras foram uma reafirmação de prudência. Mas também vieram de alguém que, tendo galgado os degraus do movimento trabalhista, teve de distanciar-se dele. Ao tornar-se um partido de "toda a comunidade", o Novo Trabalhismo realizou um feito notável: convenceu o país, e com ele o Partido Conservador, de oposição, de que políticas progressistas liberais, doméstica e externa, poderiam ser aliadas à economia pró-mercado e ao patriotismo. Na década de 90, estas eram, todas, questões em aberto nas mentes do crescente centro britânico. O preço inevitável desse triunfo foi o descarte da retórica e das práticas do que havia sido denominado "este nosso grande movimento". Tendo feito isso, e tendo toda a comunidade e sua mídia decidido que ele é o problema, o primeiro-ministro está nu, ao vento de mudanças políticas.
Em comum com quase todo líder político no mundo ocidental, Brown é julgado em primeiro lugar pela mídia, pois é ela, e não os partidos, que foi elevada pelos próprios políticos à posição de árbitro de desempenho. Desempenho significa tanto a eficácia percebida de políticas, como a capacidade de representar o papel de primeiro-ministro diante das câmeras de TV - uma capacidade que inclui o truque, até agora exclusivo ao primeiro-ministro, de expor uma narrativa coerente e inspiradora a "toda a comunidade" à qual ele alega dar ouvidos. Todos os grandes políticos são julgados nessas duas frentes.
O pilar no qual eles tinham se apoiado em tempos difíceis, em cuja construção entraram duas matérias-primas - partido político e movimento de massas -, está se esvaziando. O mesmo vale para todo o ativismo político tradicional, mesmo em nível de votação. O cientista político Peter Mair, cujo melancólico trabalho é plotar esse declínio, revela que o número de filiados a partidos na Europa Ocidental declinou em todos os 16 países, com exceção de três, no período 1980-2000 (e provavelmente caiu bem mais em todos os países desde então). O comparecimento às urnas caiu de 85% para 75%, dos anos 50 aos 90, e então caíram mais. Em alguns períodos muito mais.
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A mesma tendência é patente em todo o mundo democrático. Os partidos na Europa Central e Oriental, beneficiários do colapso do comunismo, têm poucos membros e procuram dominar os órgãos de mídia para se comunicar. A democracia de partidos na Rússia é um jogo orquestrado por uma elite, projetado através de órgãos de mídia servis ou colaboradores - a grande exceção, ironicamente, é o Partido Comunista russo. Quanto à maior democracia do mundo, seus partidos, segundo o autor Amit Varma, são "criaturas feudais" que oferecem apenas identidades de casta ou regional - um fato que Manmohan Singh, o primeiro-ministro indiano, tanto deplorou que chegou a indagar, num discurso em novembro passado, se um sistema de partido único poderia ser melhor para o país.
A política americana, com sua maior capacidade de revitalização, reconheceu o fato e adaptou-se a uma era na qual os políticos vendem seu peixe através da mídia, levantando dinheiro para comprar tempo na mídia cada vez mais por meio da internet. Naturalmente, isso põe muita influência nas mãos da mídia na época de eleições, que, como Clive Crook observou nesta página ("Guerra de imagens", artigo publicado no Valor de 04/08), significa uma obsessão com "pesquisas, gafes e viradas". Mas também indica um caminho para escapar do impasse partidário.
Assim como urbanização e industrialização produziram os partidos de massas, a participação em massa na internet começa a esboçar uma nova ordem democrática - uma ordem que pouco depende de partidos. Em um discurso perante a Royal Society of Arts, em março do ano passado, George Osborne, "ministro das Finanças" do governo paralelo, elogiou uma recente e enorme marcha em Los Angeles que reuniu 500 mil pessoas para protestar contra o tratamento de imigrantes ilegais, observando "ter sido organizada por meio de sites de relacionamento social na internet, em lugar dos sindicatos ou grupos lobistas... à medida que as pessoas se desengajam cada vez mais dos modelos tradicionais de participação política, essas novas tecnologias e redes sociais nos dão - àqueles que atuam na política e no governo - uma oportunidade para ouvir e nos conectarmos a novas platéias".
Os políticos precisam ter platéias: a prática democrática assim exige. À medida que aquelas audiências mobilizadas por partidos envelhecem e minguam, novas surgem na internet. Os cupins da indiferença e do desdém, de corrupção e manipulação, de interesses especiais e descrédito pessoal, vão minando os partidos. Não podemos acreditar que os capazes e ambiciosos também definhem. Enquanto os discursos enormes e a seriedade ética do primeiro-ministro nos fazem recordar William Gladstone, e são herança de uma tradição de comícios, panfletos fabianos e organização partidária, David Miliband, o mais ousado oponente de Brown, e apenas ele, entre seus pares... escreve um blog.